Vêem-se, de
coração bem apertadinho, as imagens de habitações completamente destruídas,
vítimas dessa loucura da guerra ou dessoutra loucura, a da voracidade das
chamas, que o aquecimento global e os homens não se cansam de provocar.
Deplora-se.
Há teimoso nó na garganta. Batemos no peito, «eu, pecador, me confesso». As
loucuras, porém, continuam. Confrange-nos ver reduzido a cinzas, num ápice,
todo o longo anseio de uma vida. Confrange-nos e, por oposição, lembramos nomes
de vivendas, mormente nos subúrbios das cidades: «Até que enfim!», «O Nosso
Lar», «O Nosso Sonho»… – frases que consubstanciam e proclamam o anseio ali
concretizado.
Esse hábito
não se tornou ainda generalizado na nossa S. Brás e, nos ‘montes’ que
paulatinamente vão passando das mãos antigas para os dos estrangeiros
recém-chegados, é provável que venham a ser palavras inglesas as preferidas.
Tem, no
entanto, a nossa terra um outro património a preservar: o das datas que, nomeadamente
nos finais do século XIX e primórdios do XX, foram gravadas nas chaminés, nos
lintéis das portas, amiúde acompanhadas das siglas do nome do primeiro
proprietário. É provável que o levantamento de todas essas informações já tenha
sido feito, inclusive de forma sistemática. Se sim, congratulo-me e faço votos
de que se publique, com breve explicação contextual. Uma documentação deveras
preciosa.
Se não,
permita-se-me que apele à urgência da sua concretização. Poderá ser mesmo uma
tarefa a concitar a colaboração multidisciplinar de docentes e alunos das
nossas escolas.
Muita surpresa se terá: datas
significativas, nomes de canteiros e de gente laboriosa, que, na ânsia de
inovar que tão facilmente nos arrebata, acabariam por irremediavelmente se
perder. E nós não queremos! São, afinal, memórias nossas!
José d’Encarnação
Publicado em Notícias de S. Braz [S. Brás de Alportel], nº 309, 20-08-2022, p. 13.
Muito estimulante, como sempre. Parabéns!
ResponderEliminarEste é o seu mundo Professor 😄
ResponderEliminarUm texto muito oportuno. Como dizia no meu comentário aode 27 de Agosto, infelizmente a tendência é para apagar a memória. E aqueles que labutaram para construir a própria casa (cá) e deixaram as suas "assinaturas" nas particularidades dos lintéis, platibandas, chaminés, morreram sem deixar senão a impressão no afecto que semearam. Lá fora a dor é maior. É o apagar, em minutos, da casa de cada um e colocar em perigo iminente a todos nós.
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