E desde
pequenino que se apercebera que a tábua só ficaria bem se todos os pregos
fossem martelados a preceito e actuassem em conjunto, consoante a sua função.
E, no lago
vizinho, rico de pescarias, via os homens, rostos curtidos pelo Sol e pelas
aragens. Obedeciam, a remar, a uma voz de comando. Lançavam à uma as redes e,
de gestos concertados, horas depois as puxavam para bordo.
Passava
minutos longos a observar os carreiros das formigas. Uma admiração como podiam
carregar tanto, como se cumprimentavam. Sentia-as elos de uma comunidade
imensa, misteriosa, organizada…
E as abelhas…
Durante
quarenta dias, anos mais tarde, ficou sozinho, a pensar.
E decidiu,
túnica ao vento, ir por aí – nas margens do lago, nos caminhos íngremes, nas aldeias
pobres, nas casas dos ricos, nos templos antigos…
A proclamar.
Tive fome e
destes-me de comer – abençoados sois!
Gostava tanto
que me ouvissem – e tu paraste à minha beira, sem olhar para sóis nem para
luas, a beber as minhas palavras, a acalentar meus sonhos.
Ajudaste-me a
pôr bem no alto a candeia – para que a todos alumiasse, que a candeia não se
quer escondida.
Havia, naquela
corrente, um elo que estava fraco – e tu retemperaste-o num fogo!
Eram farrapos
que a pele a custo escondiam – e tu cortaste o manto e com ele me abriguei…
Ensinaste-me a
perceber que as mil orquídeas silvestres sobrevivem se, em conjunto, toda uma
cadeia lhes proporcionar húmus saudável.
Era uma vez…
O
Profeta está no topo da colina. Voz a encorajar muitas mãos, a cimentar muitas
vontades. A Comunidade desabrocha! Assim como os lírios do campo…
José d’Encarnação
Publicado
em Renascimento (Mangualde), nº 827, 01-08-2022,
p. 12.
Que lindo texto! Tanto de místico, como de poético! Simples, profundo e belo!
ResponderEliminarBonita meditação!... A. Correia
ResponderEliminarMaravilhoso. Grata pela partilha
EliminarFátima Camilo
Excelente texto, obrigada pela partilha!
ResponderEliminarUm abraço!
Não sei o que hei-de escrever... O texto é belo, um poema "escondido" nas vestes da prosa, ou uma prosa poética como tanto se diz, ou até aquela "escrita criativa" que pretendem ensinar por aí, mas que (salvo melhor opinião) não se ensina. É dom natural depurado pelos anos a lidar com as palavras. Agora...penso que por detrás desta narrativa bíblica, o autor pretende apelar à simplicidade de vida, ao desprendimento, à partilha e à força construtiva da união...será?
ResponderEliminarMuito bonito! Texto poético, exalando sensibilidade e espiritualidade!
ResponderEliminarGostei muito!