Houve um tempo
em que cada município fazia questão em ter a sua Carta Arqueológica. No âmbito
dos planos directores municipais, havia necessidade de se identificarem no
terreno os vestígios arqueológicos dignos de serem devidamente salvaguardados
perante a sugadora vontade de urbanização. Surpreende, pois, a iniciativa de se
elaborar um carta gastronómica, com a mesma intenção, aliás: salvaguardar – perante
a sugadora vontade de ser diferente, de ser (como é que se diz?) gourmet
(ora toma!) – as iguarias tradicionais; afinal, aquelas que melhor se adequam às
características físicas, geológicas e climáticas fr cada região.
Dir-se-á que é
falar exagerado esse da adequação às características regionais. Não é, pese muito
embora aos chefs e às suas estrelas Michelin. Se até aquela
conhecida empresa de hambúrgueres está a adaptar os condimentos ao paladar
regional!...
Muito oportuna,
pois, a publicação, pelo respectivo município, da Carta Gastronómica de
Viseu, neste ano de 2022. Obra de monta e de prestígio, digna de
figurar em lugar de destaque numa sala de visitas e, ainda mais, à mão[JE1]
de semear da dona de casa cozinheira que se preze.
Só um
etnógrafo dos quatro costados – senhor de muito saber e arte! – como é o Dr. Alberto
Correia é que ousaria propor, e obter aprovação camarária para a elaboração de
uma obra deste precioso quilate. Investigou (e muito!), redigiu (com a prosa
tersa que lhe conhecemos) e coordenou a edição, bem secundado pelas invulgarmente
bonitas fotografias de José Alfredo. Aliás, uma colaboração, esta, que muito tem
enriquecido Viseu no quadro das suas publicações de índole cultural.
Sim, que gastronomia
é cultura – e da boa!
Mais de 330
páginas, servidas por rija encadernação de luxo e ilustradas por fotos de
antologia.
Escreve,
primeiro, o etnógrafo, a contar do território viseense, seus recursos e gentes,
as matérias-primas… Ele são as actas da Câmara, os livros de contas do
Seminário, o testemunho das Memórias Paroquiais, o que se comia até ao século
XX, como e quando, os artefactos usados… A História vista através dos comeres!
Depois, o
receituário: das refeições autónomas, dos complementos de refeição, a doçaria
tradicional… O pão quotidiano (aquele de que se fala no Pai Nosso) e o pão cerimonial
e festivo, a fogaça pão de oferenda ritual.
Só visto,
folheado e lido, Amigos – que, contado, ninguém acredita!
José
d’Encarnação
Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 832, 01-11-2022, p. 12.
Cá temos um livro que vou adorar conhecer e folhear. Com vertentes culturais que tanto me fascinam (etnografia, gastronomia, sociologia) e conhecendo bem os sabores e saberes das gentes da região, no presente, quero conhecer melhor as raízes desse apuramento da qualidade dos ingredientes que me fazem crescer água na boca, só de lembrar. Para já agradeço a informação contida neste texto e desejo os maiores êxitos ao autor e ilustrador.
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