Melhor
do que a ninguém, caberá a João Vasco, que superiormente incarnou o Rei Lear –
fazer a história desse meio século em prol do Teatro entre nós; mas, pouco a
pouco, vão dando a conhecer-se parcelas desse património.
Assim,
inaugurou-se, no passado dia 30, no Espaço-Memória, mais uma exposição retrospectiva.
Neste caso, deu-se relevo à documentação relativa à representação do Rei Lear, peça de William Shakespeare que
Carlos Avilez levou à cena na 2ª metade de 1990, com João Vasco no protagonista,
numa tradução de Ricardo Alberty, insuperável cenografia de José Manuel
Castanheira, figurinos do cascalense José António Tenente (então a dar os primeiros
passos na sua hoje brilhante carreira de estilista), e música original de
Carlos Zíngaro.
Ecos sobre a peça em 1990
Tinha-se
por hábito, então, no Jornal da Costa do
Sol publicar sempre uma nota crítica dos espectáculos. Aliás, era também
essa uma forma de continuarmos a manifestar o nosso inteiro apoio a uma iniciativa
cultural que, mal compreendida por muitos, costumava ser mais vilipendiada do que
aplaudida. Gostava, confesso, de ainda ter oportunidade de reunir em volume
essas apreciações: primeiro, porque correm o risco de se perderem; depois,
porque constituem, na verdade, ecos vivos de uma actividade ímpar na sociedade
de então. Coincidiu, porém, essa representação com um período conturbado da história
do jornal (eu vira-me forçado a pedir a demissão de director) e, sobre a peça Rei Lear, não se fez qualquer apreciação
crítica. Na página 7 da edição de 20 de Setembro de 1990, como que em título a
legendar foto, apenas se escreve:
- Uma peça a não perder
- Um fabuloso cenário surpreendente
- Uma extraordinária criação de João Vasco, bem secundado por toda a Companhia
Na
edição de 11 de Outubro (p. 7), noticia-se que, nos dias 17 e 18 seguintes, o
Teatro Experimental de Cascais irá levar a Bayonne «a peça que tanto sucesso
tem alcançado», noticiando-se que, «no dia 7, perante numeroso público, o «Rei
Lear» foi mais uma vez um êxito, tendo os artistas sido aplaudidos durante
longo tempo e de pé pela assistência, que assim tributou uma justa ovação aos artistas,
com especial destaque para João Vasco que, magistralmente, desempenha a figura
do rei».
Foi,
nesse dia 7, descerrada, no átrio do teatro, a placa de homenagem a Manuela de
Azevedo, também ela incondicional entusiasta da actividade do Teatro
Experimental de Cascais. E, a 13 de Novembro, no âmbito das comemorações dos 25
anos (a companhia estreara-se a 11 de Novembro de 1965, no Teatro Gil Vicente,
com a peça «Esopaida»), recebeu o Teatro Experimental de Cascais a medalha de
mérito municipal, distinção com que João Vasco foi agraciado também.
A exposição
Meio
século é, de facto, muita vida, muito palco, muita experiência! E, sobretudo,
muito saber transmitido, pois pelo Teatro Experimental de Cascais – seria
escusado dizê-lo – passaram centenas de actores, que, sob orientação de Carlos Avilez
e de João Vasco, ali deram os primeiros passos de mais ou menos promissora carreira.
Para
além das pessoas e da experiência, há, ainda, a documentação. Pensa-se, amiúde,
em museu, como lugar privilegiado de exposição. Museu é, porém, palavra técnica,
que, hoje, de tão usada, pode ter perdido o significado original; e, por outro
lado, um museu no verdadeiro sentido da palavra exige condições estruturantes e
de equipamento nem sempre fáceis de conseguir e, sobretudo, de financeiramente
manter.
Optou,
pois, o Teatro Experimental de Cascais por ir mostrando aos poucos este seu
invulgar espólio. E a mostra ora inaugurada merece, de facto, demorada visita.
Atente-se, de modo especial, na maqueta do cenário, que foi, na altura, uma
enorme pedrada no charco. Nós, os espectadores, sentávamo-nos em bancadas de
madeira, ao redor, no alto; as cenas passavam-se em baixo, na lama... Recordo
que assistiu à estreia o Ministro da Educação, Roberto Carneiro, com a sua já então
numerosa prole. E foi nessa noite de estreia do Rei Lear que, em conversa, nasceu o promissor projecto da Escola Profissional
de Teatro de Cascais!…
Muitos
motivos, portanto, para – numa das próximas tardes (das 15 às 19 h.) de sábado
ou domingo – dar uma saltada ao Espaço-Memória, que fica em frente da praça de
táxis do Jumbo, em Cascais. Ficará maravilhadamente surpreendido!
José d’Encarnação
Publicado em Cyberjornal¸02-08-2016:
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