A meia é feita de luz.
O novelo é Lua Cheia
E as meias são pra Jesus!
Vezes sem conta
terei ouvido esta quadra. Creio que minha avó ma cantava e eu adormecia-lhe ao
colo. A cantilena já a não sei; decerto, porém, qualquer música de fado se lhe
ajustaria a preceito.
Dei
comigo, agora, a relembrar serões, à luz do candeeiro a petróleo e eu, neto,
cabia-me pôr os dois braços para a frente e manter esticada a meada da linha.
Primeiro, minha avó descobria-lhe a ponta e depois, em gestos mecânicos,
começava a engrossar o novelo esférico com toda a perícia para nada empecer e
eu balanceava os braços a facilitar a saída. De vez em quando, a linha cruzara-se
mal e eu tinha de habilidosamente passar a mão por baixo ou por cima, para não
quebrar o ritmo e não se enlear tudo. Sendo o embaraço grande, lá minha avó
passava o novelo uma ou duas vezes para desembaraçar.
E
era um gosto eu ver, depois, minha avó e minha mãe também, no contar de histórias,
lume a crepitar, fazendo meia com duas ou três agulhas de barbela e muita
perícia, contando mentalmente as voltas... Peúgos para mim, para meu pai, para
meus tios, quiçá um par mais bonito para oferecer no Natal... Peúgos de linha,
feitos à medida, biqueira apurada a preceito… hoje não há!
José d'Encarnação
Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel] nº 210/211, Julho/Agosto de 2016,
p. 10.
Sem comentários:
Enviar um comentário