sábado, 28 de novembro de 2015

O sonho: ter uma bicicleta!

            É também neste aspecto que bem se verifica a evolução havida de há uns 60 anos a esta parte. Recordo-me que a maior alegria que poderia dar-se a uma criança quando terminava com êxito o exame da 4ª classe, ou seja, quando concluía a primeira fase dos estudos – a chamada Instrução Primária – era presenteá-la com uma bicicleta!
            Tratava-se, naturalmente, de uma bicicleta pequena, de brincar, para andar na rua junto à casa. Nunca se pusera, por exemplo, a hipótese de ser esse um meio de deslocação para a escola; unicamente, para ir, quando muito, à mercearia do lugar comprar pão ou legumes... Também corridas de bicicletas era só no âmbito das brincadeiras locais.
            Quando fiz 14 anos, fui à Câmara Municipal apresentar-me para tirar a «licença de condução de velocípedes». Tive de provar que sabia conduzir e conhecia minimamente as regras a respeitar na via pública. Já não tenho esse documento, mas, a 27 de Janeiro de 1968, 23 anos feitos, essa licença foi-me renovada, para «velocípedes com motor», porque, entretanto, surgira o meio de transporte logo a seguir em categoria: a Sachs Minor!
             Escrevi «meio de transporte». Na verdade, a bicicleta, nesses anos 50 do século XX, era o meio de transporte habitual das classes trabalhadoras. Meu pai ia de bicicleta para a pedreira e, para os demais trabalhadores, ter bicicleta era também um sonho a realizar.
            Em Portugal, há regiões, como a Bairrada, onde a bicicleta é, ainda hoje, o meio de transporte mais usado por homens e por mulheres; no entanto, o país – salvo no sul – é muito acidentado, de modo que andar de bicicleta exige um esforço anormal, que determinou, por isso, o seu escasso uso quotidiano. E, por conseguinte, nas áreas urbanas, para além daqueles que praticam ciclismo, a bicicleta utiliza-se como forma de passeio turístico, não se poupando as autarquias a disponibilizarem, para o efeito, bicicletas gratuitamente ou a muito baixo custo e a construírem ciclovias, que são, na realidade, muito frequentadas por quem vê na bicicleta um excelente meio de se manter em boa forma física!

                                                                       José d’Encarnação
Publicado em Portugal-Post – Correio luso-hanseático [Hamburgo], nº 58, Novembro de 2015, p. 33 (com tradução em alemão).
Com a devida vénia, junto a licença de condução de velocípedes,
que António de Azevedo Coutinho fez o favor de me enviar, para
se completar o rol. Veja-se, p. f., o comentário dele infra.
 
 

14 comentários:

  1. Anabela Castanheira
    28/11 às 16:54
    Velhos tempos, amigo! Lembro-me tão bem da mercearia aonde ia buscar, com a minha irmã, algumas coisas e, se sobrasse dinheiro para umas pinhas, ficávamos todas contentes (pinhas eram uns rebuçados de caramelo e amendoim num palito embrulhados em papel vegetal).

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  2. Maria Delfina Vasconcelos
    Ahah!! Como nós te conhecemos, Zé!!! Saudades...

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  3. António De Azevedo Coutinho
    28/11 às 18:07

    Conheço bem essa assinatura! a minha carta de condução é de 1969 e foi o mesmo presidente que assinou. Guardo religiosamente na minha secretária e acabo de verificar a coincidência.
    Aqui vai o original.

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    1. Pudera! É a do teu pai, que Deus haja! :) Obrigado por teres juntado a tua carta de velocípedes (simples). Vou, com a tua permissão, incluí-la no texto, para que conste, porque é bem possível que não haja nenhum exemplar deste modelo em arquivo. Aqui fica. Um abraço, grato, meu caro António!

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  4. Joaquim Cardoso
    28/11 às 18:28

    Coisa gira. Também tinha uma "quase" igual porque era de 1969. Não faço a mínima ideia onde estará...

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  5. Gisela Carvalho
    28/11 às 19:28

    Reliquía Prof. Bj GI

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  6. Luisa Bernardes 28/11 às 21:13

    Pois o meu pai, como homem evoluído para o seu tempo, ofereceu-me uma bicicleta Vilar roda24, quando eu passei para a 3ª classe, e passei a fazer as viagens para a escola, entre a Torre e Cascais, sempre na minha linda bicicleta verde. ☺

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  7. Jose Manuel G. Barros 28/11 às 21:32

    Ainda tenho a minha licença da CMC para poder circular dos anos 50.

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    1. Bem hajas, Guia Barros! Afinal, a nossa geração ainda vai guardando umas «coisas» para a História! Abraço!

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  8. Aurora Martins Madaleno 29/11 às 0:04

    Interessante. Gostei de ler o texto sobre os velocípedes e os diversos comentários.

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    1. É um pouco da nossa história comum que assim se partilha, Amiga Aurora!

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  9. Lara Pinto 29/11 às 23:55

    O meu sonho não foi ter uma bicicleta mas sim aprender a andar de bicicleta. Os anos passam e as lembranças ficam. Quando o conheci já andava de carro. Bj

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  10. Artur Santos
    Eu ainda não tinha licença e já tinha partido a cabeça no canteiro da escola (ainda hoje tenho a marca na testa) por correr atrás da motorizada do Zé Julio.

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  11. Olá José
    Sou um colecionador de coleções - tudo especial para mim - nada de especial para a humanidade - fizeste-me ir em demanda da minha carta para velocípedes obtida em Lourenço Marques - não a encontrei ainda mas sei que a tenho - encontrei reunidos umas dezenas de outros cartões da geração de meus pais à dos meus filhos, que acho interessantes até pelo formato que têm. Irei mostrando na minha página de Fbook e a tal de L.Marques há-de aparecer - grato pelas dicas que sem quereres deixas nas tuas crónicas - um abraço…. -

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