Saltita
de ramo em ramo. Da buganvília para a romãzeira. Da romãzeira para o chão.
Depois, para a buganvília de novo. Debica um ramo aqui, limpa o bico acolá.
Sacode as asas, numa alegria de viver, e despede-se num voo despreocupado.
Tenho-o visto, à hora do almoço, nos dias de sol deste Outono.
Fico
sempre com a intenção de saber mais sobre fuinhos. Quando era moço, cheguei a
apanhar alguns que, descuidadamente, se deixavam seduzir pela formiga d’asa que
eu punha nas ratoeiras. Uma plumagem verdinha amarelada e macia – que era uma
pena tirar!...
Fotografias de felosa-musical disponíveis na Internet, com identificação dos respectivos autores |
Lembrei-me
de José Manuel Durão, que fez o livro Aves
da Ribeira dos Mochos (Cascais, Julho de 2010). Passou horas a fio, anos fora, a observar a passarada do Rio dos
Mochos. Estudou-lhes os hábitos. Ouvia-lhes o cantar, registou em fotos as
imagens. Lá vi o fuinho, não o meu, mas decerto um parente próximo, que não
moro assim tão longe do rio. Afinal, chama-se felosa-musical, «phylloscopus
trochilus», de seu nome científico, e é de arribação, como eu suspeitara, porque
só o vejo aqui pelo Outono, como as felosas brancas e os piscos. Está de
passagem para África.
Os parques
E deste parque
urbano da Ribeira dos Mochos parti para o do Marechal Carmona.
Gostava
mesmo que houvesse diariamente a tal «hora feliz» para o estacionamento
gratuito. Um serviço público que até poderia reconciliar o munícipe com a generalizada
imagem desagradável que ele tem da Cascais Próxima, avarenta proprietária do
espaço público.
E
perguntava-me o Tiago, que se desloca em cadeira de rodas, porque não há lugar
reservado a deficientes mais perto da entrada deste parque.
Passei
de novo, há dias, pelas Penhas do Marmeleiro – o coração sangrou.
A contemplação
Tal não aconteceu,
porém, no Convento dos Capuchos e seu parque envolvente, em plena Serra de Sintra.
A
contemplação, o silêncio, a comunhão com a Natureza e o seu Criador. A meditar
como seria o quotidiano daqueles monges, nas suas oito minúsculas celas
individuais, forradas a cortiça, encafuadas pelas penedias.
Fundado
por D. Álvaro de Castro, em 1560, o Convento de Santa Cruz da Serra de Sintra
albergou frades capuchos até 1834, ano em que foram extintas as ordens
religiosas em Portugal.
Nele
havia de tudo para a comunidade: a igreja; a cozinha; o refeitório, com laje de
pedra para mesa oferecida pelo cardeal-rei D. Henrique); a «casa das águas»,
com instalações sanitárias, cisterna em forma de casa, tina e latrinas; a sala
do capítulo, para as reuniões; as enfermarias, dotadas de celas para os
doentes, botica e braseiro. A cela do noviço destinava-se ao recém-chegado que,
pedida a admissão na comunidade, procurava estudar as regras e verificar se a
elas se ajustava a sua vocação. A da penitência, obscura, acolhia quem, por
qualquer motivo, necessitasse de maior recolhimento.
Parques
de Sintra – Monte da Lua, S. A., que tem a seu cargo a salvaguarda do monumento
e a gestão do espaço, não deixa de sugerir ao visitante um “percurso botânico”,
para identificar espécies da flora derredor e para ver a Casa do Frei Honório,
que, reza a lenda, um dos frades preferira à sua cela; a horta antiga ou a Capela
do Senhor Crucificado, onde se dá largas ao silêncio e à contemplação!...
Sim,
que ali viveu, pois, uma comunidade com as suas regras de oração e de trabalho.
Homens como nós, é certo, mas que haviam descoberto outros encantos – no pipilar
das aves, no cicio da aragem pelas franças das árvores e mesmo no fragor da
trovoada a ecoar pelos fraguedos…
Convento
dos Capuchos, em Sintra: uma visita indispensável a fazer de vez em quando, pois
pérolas destas hão de maravilhar-nos.
Tal
como na muda observação do fuinho que, pontualmente, ao final da manhã, vem aqui
saltitar na minha romãzeira…
José d’Encarnação
Publicado em Costa do Sol – Jornal Regional dos Concelhos de Oeiras e Cascais, nº 119, 02-12-2015, p. 6.
Convento dos Capuchos - Pátio interior |
Convento dos Capuchos - Capela |
Convento dos Capuchos - Cozinha |
Convento dos Capuchos - Refeitório com a laje oferecida pelo Cardeal-rei |
Convento dos Capuchos - Casa das Águas |
Convento dos Capuchos - herbolário |
Luisa Bernardes
ResponderEliminarSempre um prazer ler estas crónicas!!
Joao Paulo Gomes
ResponderEliminarPalavras, para quê ? Até eu, que sou avesso à leitura, não consegui parar de ler! E que venham mais sugestões de leitura ! Um abraço !
Caro José, a última fotografia refere-se ao Herbolário, e não a latrinas, que estariam exclusivamente na Casa das Águas.
ResponderEliminarA música das palavras nascidas do fuinho, o amor a natureza fizeram me voar até essa romãzeiras e como o passarinho saltar de vez em qundo para a buganvília a espreitar o não dito
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