terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Mais uma injecçãozinha, vá lá!

             Achei piada. O ecrã estava dividido em quatro. Na parte de cima à esquerda, a foto de um instantâneo do jogo mudava de vez em quando. Por baixo, um vídeo, sempre o mesmo, a mostrar o treinador de uma das equipas a andar, nervoso, de um lado para o outro; dava uma impressão de realidade (mas já fora e repetia-se, repetia-se...) Em cima, à direita, a locutora ia relatando o embate (não tinha o canal direitos de transmissão directa). Por baixo, o painel de comentadores, que iam reagindo às jogadas.
            O que mais me chamou a atenção foi esse truque de mostrarem sempre a mesma sequência dos passos do treinador para o adjunto e do adjunto para o banco, irrequieto. E lembrou-me, de imediato, «the best video you will ever see», que me haviam enviado não há muito e já tinha 22 milhões de visualizações e 427 506 partilhas: chama-se «Shrimp: the disgusting truth» (camarão: a verdade repugnante) e foi distribuído pela gary-tv.com, um canal que pugna pela defesa da vida animal. Vê-se ali o senhor num suposto laboratório do Vietname (um dos 5 maiores exportadores de camarões!…) a dar sucessivas injecções, três em cada camarão que lhe passam. Injecta-lhes uma mistura de glicose, gelatina e CMC (carboxymethyl cellulose), tudo para os tornar mais… apetecíveis!...
            Recebi, há tempos, um outro vídeo, em que se mostrava, também num país do Extremo Oriente, como se fazia couve lombarda a partir de substâncias químicas, exactamente com o mesmo aspecto e o mesmo gosto das cultivadas no campo…
            Recordo as brilhantes lições do Prof. Jorge Paiva – já lá vão trinta anos! – a contar-nos das manipulações genéticas dos cereais e como, por detrás do milho híbrido (se não erro o exemplo), estava todo um processo que lhe alterava por completo as propriedades.
            Todos nos apercebemos da diferença entre a laranja que colhemos no nosso quintal e a que compramos no supermercado: esta última, dois dias depois, já não se pode comer. E o pão? Minha avó cozia pão uma vez por semana, para nós e para os vizinhos, e chegava aos oito dias com a mesma frescura e qualidade. Hoje? Compras num dia e dois dias depois tem bolor!...
            Por isso – e, claro, por outros factores mais que se acumulam –, a senhora de 41 anos começa, de repente, a ter formigueiros nos pés, depois nas mãos, depois no peito e vai de urgência para o hospital com todos os músculos sem força alguma e fica paralisada por completo, perante a estupefacção de todos. Ou o amigo, que nós víamos a vender saúde e começa, de um momento para o outro, a sentir-se cansado, cansado, sem motivo aparente e… já está a fazer químio e aguarda transplante de medula…
            É triste falar disto em vésperas de Natal; importa, porém, que também a pausa da quadra natalícia se aproveite – com serenidade e tempo – para uma reflexão sobre nós, os nossos e aquilo que nos rodeia. A recuperar forças para o testemunho que precisamos de dar!
                                                                          José d’Encarnação
 
Publicado em Renascimento [Mangualde], nº 698, 15-12-2016, p. 16.
 
 

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