domingo, 11 de dezembro de 2016

Poemas ocasionais, de Fernando Miguel Bernardes

            Está em distribuição o livro poemas ocasionais, de Fernando Miguel Bernardes, numa edição de Mar da Palavra (coimbra, mardapalavra@gmail.com ), editora de que Vitalino José Santos é o grande dinamizador.
            Natural de Gândara dos Olivais (Leiria), onde nasceu a 14 de Dezembro de 1929, formou-se o autor como engenheiro geógrafo, mas será, sem dúvida, a poesia que o imortalizará, uma vez que poemas seus foram musicados e gravados por Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Manuel Freire, José Jorge Letria, José Carlos Ary dos Santos. Um poeta, pois, da resistência.
            Tive ocasião de apresentar, a 27-05-2009, na Biblioteca Municipal das Galveias (Lisboa), o seu livro «O Fio das Harpas»; prefaciei «Notas de viagens – Ritmos e Mitos» (Coimbra, 2015); e tive igualmente o gosto de fazer o prefácio para estes «poemas ocasionais»:
            O meu texto – que me seja perdoada a insolência – começa assim
            “Dizem-se «ocasionais». De ocasião. Como suspiro d’alma que se dá, de quando em vez, perante o inusitado, ao ler uma frase sentida, ou, mesmo, diante do rumo ziguezagueante de uma Humanidade ora, cada vez mais, a desmerecer inicial maiúscula.
            Voz a ecoar pelas quebradas. Um rio. Já o imperador romano Marco Aurélio escrevia ser a vida qual rio torrentoso: mal acabas de ver a folhinha flutuante, ei-la que já lá vai e, em seu lugar, outra vem, em jeito de abalada.”
            É que, se não errei, assim se poderia compendiar a mensagem que Fernando Miguel Bernardes nos quer transmitir. Como quem não quer a coisa, lá vai lançando a sua certeira seta contra os «montes maninhos», «as verduras transgénicas», «frutas maduras de intervenções polémicas» (p. 61). Poderíamos alargar-nos em dissertações técnicas sobre a manipulação dos alimentos, mas… estes dois versos «frutas maduras de intervenções polémicas» carecem, acaso, de mais explicação?
            «Eleito a falsas promessas, este no comando agora – ai, ai, Coriolano!... – eis, por fim, tudo às avessas, os cidadãos ao engano!» (p. 81). Que mais é preciso dizer para verberar quem promete mundos e fundos para ser eleito e, depois, faz exactamente o contrário do prometido?
            E se nos sentássemos ao relento com um sem-abrigo – se é que tínhamos coragem para conversar com ele.. – que lhe ouviríamos dizer? E Fernando Miguel Bernardes, em singela pincelada diz tudo:

                        «Tu tens uma cama quente
                        a mim o que me ajuda
                        é um trago de aguardente!». (p. 14).

            Não resisto a transcrever, pela sublime acutilância que os dois tercetos do poema «parasitas» encerram, retrato fiel de como, na escolha certa das palavras, se desnuda um estado d’alma, se brada forte um grito de revolta:

                        vérmina – disse o doutor
                        ao ser pelo doente
                        consultado
 
                        vermes – disse o eleitor
                        ao ser pelos que elegeu
                        parasitado      (p. 90).

            Um livro para meditar!
                                                           José d’Encarnação

Publicado em cyberjornal,  edição de 10-12-2016:

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