quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Patrimoniices cascalenses 35 - A exploração agrícola do Casal do Clérigo

             Não, não vou contar toda a história que é longa de mais e intrincada. Satisfaço o pedido de Susana Luiz para dizer onde está esse casal saloio em ruínas e o que é. E, como verá Guilhermino Pires, fica muito perto do antigo Instituto Missionário Salesiano, de Carrascal de Manique (hoje, Salesianos de Manique), na freguesia de S. Domingos de Rana, e por isso eu lhe disse que ele o terá conhecido bem no seu apogeu de actividade.
            Casal do Clérigo é sítio ocupado desde mui remotas eras. Aí identificámos uma villa romana, onde se fizeram sondagens com satisfatórios resultados, que tivemos ocasião de dar a conhecer. Por aí passava a «estrada real» para Sintra e foi justamente por isso que, no século XVI, aí esteve um amante de antiguidades, que descobriu, por exemplo, uma inscrição funerária romana. Uma história, repito, que temos contado nas publicações que temos feito sobre os vestígios romanos em Cascais. Veja-se, a título de exemplo, o livro Dos Patrimónios de Cascais, editado pela Associação Cultural de Cascais, apresentado a 26 de Julho na Casa Sommer.
            É em Casal do Clérigo que resiste, sob a proficiente orientação da família do canteiro António Clérigo, uma das poucas serrações de pedra em laboração no concelho de Cascais. Mas a serração fica do lado norte da estrada e o casarão em ruínas, ou melhor, os casarões em ruínas ficam do lado sul. Aí houve florescente exploração agrícola (Fig. 1) pertencente à família Canas, que a vendeu ao empresário Américo Santo, na altura em que se chegou a pensar que nesse local ou nas suas imediações poderia vir a instalar-se o novo hospital de Cascais. Essa hipótese foi gorada devido às diligências efectuadas durante o mandato de António Capucho, altura em que se negociou a localização actual, nos terrenos de Alcabideche e Cabreiro, que eram do Ministério do Exército. Outros planos para o local se goraram também, por isso mesmo, e a ruína foi tomando conta de tudo, na esperança de melhores dias.
            A foto publicada e cuja identificação se pedia (Fig. 2) mostra o exterior (é de pedra, sim, caríssima Neyde, tudo se construía de pedra e não de tijolo naqueles recuados tempos!...) do que foi a vacaria. Ora observe-se a fotografia do interior (Fig. 3), com a comprida manjedoura e o travejamento do telhado que resiste. São fotos que devo à amabilidade do Doutor Guilherme Cardoso, que nunca se cansa de fazer o registo do património em riscos de se perder.
            Que vai acontecer a esse aglomerado de prédios em ruínas?
            O tempo e as políticas o dirão.
            Para já… são ruína de um passado – até aos anos 60/70 – em que no interior do concelho de Cascais se vivia da agropecuária, informação que poderá ser por muitos hoje desconhecida, quando olham apenas para o Cascais litoral, urbano e balnear. Esse é outro Cascais, sofisticado; este, o que vivia da terra, mais… natural!

                                                                        José d’Encarnação

Fig. 1 - O conjunto das edificações em ruína.
Fig. 2 - O exterior da vacaria.
Fig. 3 - O interior da vacaria.

2 comentários:

  1. Que bom ter quem, com sabedoria e sensibilidade, nos vá mantendo a par do património que resiste à passagem do Tempo e à distracção dos poderes. Devia ter sido este Cascais rural a suportar a parte urbana do concelho, mas quem se importa do que foi?
    Um grande abraço e parabéns pelo belo texto.
    Madalena

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  2. Obrigada, Professor
    Mais um novo artigo a incluir no meu arquivo dos seus Comentários, garantindo que, sempre que necessário e desejado, possa verificar se o alerta lançado foi percebido por quem de direito e com responsabilidades administrativas para preservar e/ou fazer preservar este e outros patrimónios que, por si só, nos trazem História e memórias do que foi o que hoje é, um dos Concelhos mais badalados, o de Cascais. Bem haja, Professor! Um obrigada, também, ao Doutor Guilherme Cardoso. Manuela Duarte

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