Congratulo-me, obviamente, com a
iniciativa, na medida em que constituiu mais uma forma de chamar a atenção do
Povo para a importância que a Arte acaba por desempenhar na vida, mau grado as
tropelias dos ‘governantes’.
Chamou-me, de modo especial, a atenção a apresentação
da sala 2, «A vida no campo», onde se explica que, após a assinatura, a 9 de
Abril de 1609, da trégua de 12 anos, os arquiduques Alberto e Isabel Clara
Eugénia, com vista a consolidarem a reunificação ,
deliberaram utilizar «a pintura como instrumento de propaganda »:
«Sendo fundamental para a reconstrução
dos Países Baixos a colaboração do
campesinato, os arquiduques consideraram que a representação
da vida nos campos, no seu ambiente natural, era a temática mais apropriada à
pintura».
Estava-se nos primórdios do século
XVII, ou seja, há 400 anos. E pensei com os meus botões: será que os actuais «governantes»
leram? Será que se aperceberam da importância real que tem, na vida do Povo, a
existência de um campesinato forte, bem apoiado, feliz, dotado por perto das infra-estruturas
necessárias a esse bem-estar?
Não, em Portugal não leram; em Portugal,
se o sabem, não o conseguem facultar nem – ao que parece – se preocupam muito
com isso! As reclamações diárias contra o encerramento de serviços públicos, na
perspectiva imediata de que não são rendíveis, antojam-se como evidente prova
em contrário. Desertifica-se o interior; enxameiam-se as cidades de gente por
completo desenraizada; olha-se para o estrangeiro na mira de se alcançar lá o
que por estas bandas se recusa, em nome do feroz código do deve e do haver.
E os quadros fizeram-me lembrar o Powerpoint
que circula pela Internet, a que se deu o nome
de «Tuaregue traduzido». Diz-se que se trata
da entrevista feita por Victor-M. Amela a Moussa Ag Assarid, tuaregue saariano.
Palavra puxa palavra, o jornalista catalão a deixar-se enlevar, admirado, pela
sabedoria de quem passa os dias no silêncio avassalador de uma Natureza original:
«Quando se está sozinho naquele silêncio, até se consegue ouvir o bater do coração », garante o tuaregue. E acrescenta, para realçar
as diferenças: «Vocês têm relógio; nós temos tempo!».
Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 636, 01-04-2014, p. 11.
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