Como
vem sendo habitual, a Sociedade Propaganda de Cascais dedicou a sua mensagem de
Natal a um monumento de Cascais: a fonte instalada no Jardim Visconde da Luz,
em pleno coração da vila.
Foi
um dos membros da Sociedade Propaganda de Cascais que a encontrou, desmontada,
num estaleiro, à venda pela importância de 500 escudos. Achou curioso e pensou
na possibilidade de essa fonte vir a ser incorporada numa das praças de
Cascais. Fizeram-se as diligências necessárias que viriam a culminar, em
Novembro de 1984, na integração da fonte onde hoje se encontra.
Tem
a fonte uma legenda em latim: foi erigida em 1623, quando reinava em Portugal
Filipe III de Espanha, II de Portugal.
Pensava-se
em Portugal, nessa década de 20 do século XVII, que as promessas feitas por Filipe
II nas Cortes de Tomar de 1580 ainda poderiam vir a ser cumpridas. Concretamente:
que as duas coroas não estariam nunca unidas; que a língua oficial da zona
portuguesa continuaria a ser o português; que os cargos mais importantes da
nação seriam exercidos por fidalgos da nobreza de Portugal. Por isso também,
como me escreveu Aurélio Bentes Bravo, erudito portalegrense a quem tive a
honra de consultar, «a construção da fonte em honra de Filipe III, naquela
época teria sido muito provavelmente pacífica e mesmo aclamada, como o foi
aliás e muito, a anterior visita de Filipe II a Portalegre, em 1581».
Será
só tempos mais tarde que essa esperança se desvanecerá por completo.
Pensara
eu que, imediatamente após a restauração da independência, se teria querido
destruir a fonte. Pode isso ter acontecido, porque toda a documentação relacionada
com a dominação filipina foi naturalmente destruída, como gentilmente me
confirmou o Doutor António Ventura, ele que é um portalegrense de alma e
coração. O certo é que, como me relatou Aurélio Bravo, um documento espanhol de
1801 ainda referia que, entre as fontes de Portalegre, a melhor é «la de la
Plaza de la Magdalena de figura piramidal, con acoplamento en la mitad del que
se distribuyen ocho caños». E virá a ler-se, numa acta camarária de 1886, que a
fonte «estava em deterioração quase completa, necessitando ser substituída»,
adiantando-se uma proposta de venda ao principal industrial da cidade, o inglês
George Robinson, pela quantia de 80$000 réis. O industrial comprou-a e
guardou-a desmontada no quintal do seu solar. «Em 1979, os herdeiros de George
Robinson decidem propor à Câmara de Portalegre a sua compra, que não se
realizou por ter considerado o preço excessivo. Acabaria por ser comprada por
um particular (que parece que se dispunha a levá-la para fora do país) que
depois a vendeu, como se sabe, à Câmara de Cascais, que felizmente obstou a que
tal acontecesse», salientou Aurélio Bravo (informação que muito agradeço).
Uma
fonte portalegrense em Cascais! O cantar das suas bicas (nem todas em
funcionamento) encantará quem porventura se disponha a estar uns momentos junto
dela, em pausa de um apressado caminhar. Surpreendê-lo-á, porventura, o
enigmático letreiro e o desenho de um castelo. Acontece, porém, que esse cantar
e esse letreiro escondem, como se viu, uma história milenar!
José d’Encarnação
Publicado em Costa do Sol Jornal (Cascais), nº 265, 2019-01-23, p. 6.
Sem comentários:
Enviar um comentário