–
Donde é?
–
Do Brasil.
–
Isso eu sei, pela pronúncia; mas donde?
Lá
me especificam se de Vitória do Espírito Santo, de Minas, de Curitiba… E
acaba-se sempre por trocar impressões sobre o que visitei, o quanto me seduzem
a paisagem e as gentes.
A
17 de Fevereiro, no programa «Vozes da Lusofonia» da Antena 1, a cantora negra brasileira
Bia Ferreira descreveu as suas impressões, ao desembarcar agora, pela primeira
vez em Portugal:
–
Eu estou noutro país e percebo tudo o que leio!... Maravilha!
Decerto,
essa a impressão também do português que chega ao Brasil, nesta altura já mais
familiarizado com as diferenças de terminologia, porque quotidianamente as
ouve.
Da
primeira ida ao Brasil, em 1989, recorto dois aspectos:
–
Ao jantar, sobrou bastante comida; e logo o dono do restaurante se apressou a
propor-nos que levássemos o resto numa «quentinha». Hoje, é prática corrente em
muitos restaurantes, designadamente aqueles onde costumamos ir; nessa altura, era
novidade.
–
Ficámos alojados num apartamento da Siqueira Campos, uma das perpendiculares à
Avenida Atlântica, em Copacabana, no Rio. Depressa nos integrámos na
vizinhança, de mútuo cumprimento diário. E era um gosto passear no calçadão,
gente de todas as idades, no maior dos à-vontades, em exercício ou
descontraidamente, parando aqui ou além para se refrescar com uma água de coco…
Como se para tudo houvesse o maior tempo…
Numa das outras idas, o destino final foi Pelotas,
no Rio Grande do Sul, junto ao Uruguai. A terra do charque, carne seca ao sol,
nas fazendas chamadas, por isso, charqueadas. De uma, a Charqueada São João, agora
adaptada a receber visitas, verdadeiro museu na grande casa senhorial, trouxe
fotografia, como a legenda mandava.
Rio
Grande do Sul é o território das colónias: a Alemã, a Francesa… vestígios da
intensa imigração no decorrer da II Grande Guerra. Povo hospitaleiro ali, é
mescla das mais diferentes nacionalidades, algo de que já me apercebera ao verificar
a origem dos mais variados apelidos que os brasileiros mantêm. Pelotas, a
capital, será a mais portuguesa das cidades brasileiras, pelas suas tradições
lusas, nomeadamente a doçaria, que é a nossa! Afinal, também Portugal ali tão
perto!
Gente
brava, habituada a tratar do gado, os gaúchos, mas de uma docilidade extrema no
trato. A indispensável cuia do chá-mate ou do chimarrão passa de um para o
outro, sem cerimónias...
Uma
multiculturalidade que não despreza, porém, as mais antigas raízes. Numa das
noites do congresso sobre precisamente a Antiguidade Oriental e a Antiguidade
Clássica, o jantar foi de acepipes à maneira do Médio Oriente, com o
tradicional lava-mãos de água perfumada antes de ir para a mesa.
José
d’Encarnação
Publicado em P&V – Órgão do Agrupamento de Escolas Marinha Grande Poente, Escola Calazans Duarte, Março
de 2019, p. 26.
Belo texto sobre a identidade com um povo, povos, que falam a mesma língua, com vocábulos curiosos que eu desconhecia. E a legenda inscrita em madeira (será?) na Charqueada S. João, é um poema que mereceu foto, muitas certamente, e merece constante reflexão.
ResponderEliminarParabéns por escreveres tão bem, sobre temas que nos dizem tanto. VMH
Cláudia Guerreiro, 4 de Abril de 2019 10:14
ResponderEliminarRelativamente ao Português de Portugal e do Brasil… julgo que nós portugueses temos o péssimo habito de não valorizar o que é genuinamente nosso. “A galinha da vizinha será sempre melhor que a minha"… e é uma pena que se pense assim!