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Narcissus poeticus - a ilustração escolhida por Jorge Paiva
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Basto significativos são sempre os gestos dos nossos
braços. Há votações de braço no ar; há os braços cruzados numa atitude de
expectativa ou de alguma serenidade; há o abraço ‘forte’ ou ‘terno’, como vamos
dizendo nas nossas mensagens de email; e há os braços caídos, de desalento.
Não
gosto dos braços caídos, lânguidos, sem acção – qualquer que seja o motivo que
assim determinou.
O
Professor Jorge Paiva, intrépido defensor, há décadas, da biodiversidade, acaba
de comunicar que, ultrapassada a fasquia dos 90, deixou cair os braços. Já lhe
ripostei, discordando: não pode fazer isso, senão nós próprios, um tudo-nada
mais novos, vamos desanimar também!...
A
sua reacção é, porém, forte que nem muralha romana:
«Após
mais de meio século de atividade cívica pelo Ambiente e pela Natureza, tenho
plena consciência de ter sido um luta improfícua. Proferi cerca de 2500 palestras
de educação ambiental, na sua maioria em escolas. Os alunos ficavam sensibilizados
e despertos para o desastre ambiental do Planeta Terra, a Gaiola que
habitamos».
Chegados
a adultos, estimulados pelo consumismo, «esqueceram tudo o que ouviram. Reflexo
disso são os actuais políticos e governantes (…) que nada fazem para travar ou minimizar
o desastre ambiental corrente».
«Também
eu fui um ‘lírico’», comenta, ao referir-se a Camões. E não deixa de traçar de
seguida o quadro assustador:
«A Gaiola em que vivemos está imunda, plena de
poluição gasosa, líquida e sólida, muito quente, com frequentes incêndios, o
nível médio oceânico a subir, as calotes dos gelos polares e das altas montanhas
a desaparecerem, tempestades com inundações devastadoras, grandes lagos a
secarem e regiões do globo a desertificarem».
E,
por isso, conclui, no habitual postal de Boas Festas:
«O
meu desalento é enorme».
E
garante que, após este 35º postal, não vai escrever mais – não vale a pena!
Apoio,
porém, o seu voto esperançoso pelo ordenamento florestal e pela humanização das
nossas montanhas. Amém!
José
d’Encarnação
Publicado no jornal Renascimento
(Mangualde), nº 874, 20-01-2025, p. 10.