Recordo amiúde a história que Laborinho Lúcio nos
contou, aquando da visita do Curso de Conservador de Museus ao Centro de
Estudos Judiciários, que na altura dirigia, sobre a necessidade de os juízes se
inteirarem dos significados locasis das palavras e expressões.
O
juiz recém-chegado a Vila Real de Trás-os-Montes manifestou a sua perplexidade
por o queixoso ter posto processo por difamação contra um vizinho, por este lhe
ter chamado «minhoto»:
–
Eu não percebo! O nosso escrivão também é minhoto e não se rala nada com isso!
O
Minho é, como se sabe, uma região onde abunda o gado bovino…
–
Está bem, eu ponho no jacó!
Também
esta resposta pode causar surpresa ao recém-chegado a Coimbra. Jacó é o nome
popular dado ao caixote do lixo e ao cesto dos papéis, desde que, em Outubro de
1929, o presidente da Câmara, João dos Santos Jacob, propôs a criação dos
recipientes para o lixo, que o povo logo começou a chamar «jacós».
Mantendo-nos
em Coimbra, igualmente surpreenderá ouvir «depois tens uma cortada à esquerda e
vais por aí». Cortada é travessa, atalho, na nomenclatura da Lusa Atenas;
quiçá, uma boa alternativa ao estrangeirismo «link» dos computadores…
– Amanhã,
dás-me boleia?
Poucos
saberão, porventura, a origem da expressão. Boleia era, nas antigas carruagens,
o pequeno assento ao lado do condutor, amiúde usado para levar quem não tinha
outro transporte e, por isso, ‘apanhava uma boleia». Já no Brasil, o termo é
carona. Poderá ter origem parecida à da boleia em Portugal, porque aí se chama
de carona uma peça do arreio que se coloca por baixo
do lombo do animal. Creio, pois, sem lógica a hipótese de a palavra vir do
castelhano e, este, do latim «caro», que significa carne, como os dicionaristas
sustentam.
Foi numa visita de estudo do Curso de Museologia ao Museu
do Eléctrico, no Porto, que percebi o verdadeiro significado da palavra: no
volante do guarda-freio, 9 é a velocidade máxima que o eléctrico dá!
José d’Encarnação
Publicado em Renascimento [Mangualde], nº 863, 15/4/2024, p. 10.