Constituiu para mim bem agradável surpresa.
Andava envolvido na pesquisa de saber a partir de que época da Humanidade aparecera o pinheiro. Sabendo disso, Guilherme Cardoso encontrou num escrito de José Leite de Vasconcelos – vol. II da Etnografia Portugueza (Tentame de Sistematização), Imprensa Nacional de Lisboa, 1936, p. 68 – uns parágrafos que vinham ao encontro dessa investigação, pois se referia à antiguidade do pinheiro na Península Ibérica e anotava, até, os diferentes nomes por que se designava a maravalha (carumba, chamiço, gravalha…) por esse Portugal além.
Vai daí, ao correr da pena, aproveitava o ilustre etnólogo para se referir a outra árvore que, pela sua majestade, o maravilhara: a alfarrobeira, que «medra principalmente no Sul do Algarve» (p. 69), E, para ilustrar o apontamento, dá, na fig. 16, o exemplo: «entrada de uma quinta, sítio de S. Romão (S. Brás de Alportel, Algarve), onde se vê uma alfarrobeira», desenho de 1907 (!), que mui gostosamente ora aqui se reproduz.Nem de propósito! Investigava eu o pinhão e cai-me na mesa vetusta alfarrobeira que eu ia jurar ainda hoje existir por i, na minha terra!...
Aqui fica, pois, o desafio ao leitor: tem ideia de onde é que esta árvore está ou estava? Se sim, cá ficamos à espera da sua colaboração preciosa, para a história de São Romão e de S. Brás!
[Publicado em Notícias de S. Braz, S. Brás de Alportel, nº 183, 20-01-2012, p. 15].
quarta-feira, 28 de março de 2012
segunda-feira, 26 de março de 2012
A revista municipal que falta
Por diversas vezes tenho chamado a atenção dos responsáveis para o que, em meu entender, constitui uma falha na política cultural da Câmara Municipal de Cascais: a não-existência de uma revista de carácter cultural e científico. Permita-se-me, pois, que explicite agora o meu pensamento, historiando um pouco o que se passou até ao momento.
O boletim do museu
Por iniciativa de Maria Alice Beaumont, uma conservadora de largos horizontes, publicou-se, em 1971, o Boletim nº 2 do Museu-Biblioteca do Conde de Castro Guimarães, dando continuidade a um projecto que a clarividência de Branquinho da Fonseca iniciara em 1943. Aí se fez, desde logo, não apenas o ponto da situação em relação ao acervo do museu e da sua história como também em relação a estudos singulares a que, entretanto, se havia lançado mão, do ponto de vista da Arqueologia, por exemplo.
A publicação não teve seguimento.
Arquivo de Cascais
Sob a presidência de Carlos Rosa, sendo vereador da Cultura António de Sousa Lara, surgiu, em 1980, Arquivo de Cascais, como «Boletim Cultural do Município». Na apresentação, escreveu o presidente:
«É o nosso Município extraordinariamente rico em valores de ordem histórica e cultural cuja pesquisa e divulgação justificariam, por si só, a criação de uma publicação deste tipo».
E foca Carlos Rosa um aspecto que, à altura, poderia ser considerado pioneiro, pois que se refere a «uma outra riqueza não menos importante» do concelho: «uma população que, além de muito numerosa, apresenta característica de profunda heterogeneidade, a qual traduz, só por si, fenómenos sociais oriundas de diversos meios, desde o rural, ainda predominante em algumas zonas do Concelho, até ao densamente povoado, como o da sua faixa litoral».
E acrescenta que esse é um «conjunto de factores que importa, enquanto for tempo, recolher e conservar para as gerações futuras, no sentido de que a história de uma comunidade e a consideração dos seus valores específicos não poderão deixar de interessar não só aos actuais munícipes […] como aos futuros, a quem deve ser deixada a possibilidade de riem a ter elementos sobre as origens do meio em que se movimentarem».
Sábias palavras estas!
E o Arquivo de Cascais prosseguiu sua caminhada. O 2º volume (1981) foi integralmente constituído por «Personagens da Nossa Terra», o volume II de Cascais Menino, de Pedro Falcão. O nº 12 (1996) teve coordenação de Ricardo António Alves, chefe de Divisão do Património Histórico-cultural, sendo o vereador José Jorge Letria o responsável pela edição e que aí escreve, sob o título «História local, Memória viva»:
«Uma significativa parcela da memória deste concelho, enquanto comunidade e espaço plural onde a vida e a História se cumprem, encontra-se registada nos 12 números do ARQUIVO DE CASCAIS, que regularmente dá voz a investigadores desta terra que escrevem acerca dela, dos seus costumes, das suas tradições, do seu património edificado e das suas figuras históricas mais relevantes».
E conclui:
«O ARQUIVO DE CASCAIS é uma memória viva e dinâmica e honra e estimula quem a conhece e divulga. Por isso o publicamos, conscientes da sua importância e valor da herança de História local que ele deixará para o próximo milénio».
Mas… ficou-se por aqui. Diz-se que um desentendimento – que levou à saída de Ricardo Alves para a Câmara de Sintra, donde viera – provocou a suspensão da publicação, que viria a ser retomada já no tempo do presidente António Capucho (nº 13, 2005), sob responsabilidade da vereadora Ana Clara Justino, com textos do maior interesse, tendo-se salientado o seu papel como veículo de «estudos especializados sobre temas de História Local e Regional». E, mais uma vez, ficou-se por aqui.
Boca do Inferno
Homem, porém, mais ligado às Letras e às Artes do que à investigação histórica e às problemáticas do Património, José Jorge Letria acabaria por criar uma outra revista, Boca do Inferno, «de Cultura e Pensamento», cujo 1º número sai em 1996.
Haviam-se criado as «Conversas de Cascais», os Cursos Internacionais de Verão (cujas actas, em vários volumes, foram sendo publicadas) e o vereador considerou que, em Cascais, «a literatura, o debate de ideias, a cultura e as reflexões que ela suscita e reclama têm tido um papel relevante». E Boca do Inferno nasce para isso: «Um espaço aberto e plural para a literatura, o pensamento filosófico, a investigação histórica e confrontação de distintas visões da vida e do destino do Homem». Ou seja: era uma revista local, mas a sua dimensão não devia ficar «condicionada pela estreiteza das visões regionalistas ou bairristas». Em suma: perdeu-se pelas literaturas… E o carácter local acabaria por dissolver-se, como pode ver-se nos sumários das revistas seguintes. O último número publicado (9, Março 2004) só tem um texto directamente relacionado com Cascais: «Cascais e os primórdios do Cinema em Portugal», de José de Matos-Cruz.
Não nego o interesse de Boca do Inferno. Continuo, no entanto, a considerar que Arquivo de Cascais é um projecto a não perder. Mormente hoje que é possível fazer uma revista on line e apenas imprimir um número reduzido de exemplares, para oferta e/ou permuta.
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 306, 21-03-2012, p. 6].
O boletim do museu
Por iniciativa de Maria Alice Beaumont, uma conservadora de largos horizontes, publicou-se, em 1971, o Boletim nº 2 do Museu-Biblioteca do Conde de Castro Guimarães, dando continuidade a um projecto que a clarividência de Branquinho da Fonseca iniciara em 1943. Aí se fez, desde logo, não apenas o ponto da situação em relação ao acervo do museu e da sua história como também em relação a estudos singulares a que, entretanto, se havia lançado mão, do ponto de vista da Arqueologia, por exemplo.
A publicação não teve seguimento.
Arquivo de Cascais
Sob a presidência de Carlos Rosa, sendo vereador da Cultura António de Sousa Lara, surgiu, em 1980, Arquivo de Cascais, como «Boletim Cultural do Município». Na apresentação, escreveu o presidente:
«É o nosso Município extraordinariamente rico em valores de ordem histórica e cultural cuja pesquisa e divulgação justificariam, por si só, a criação de uma publicação deste tipo».
E foca Carlos Rosa um aspecto que, à altura, poderia ser considerado pioneiro, pois que se refere a «uma outra riqueza não menos importante» do concelho: «uma população que, além de muito numerosa, apresenta característica de profunda heterogeneidade, a qual traduz, só por si, fenómenos sociais oriundas de diversos meios, desde o rural, ainda predominante em algumas zonas do Concelho, até ao densamente povoado, como o da sua faixa litoral».
E acrescenta que esse é um «conjunto de factores que importa, enquanto for tempo, recolher e conservar para as gerações futuras, no sentido de que a história de uma comunidade e a consideração dos seus valores específicos não poderão deixar de interessar não só aos actuais munícipes […] como aos futuros, a quem deve ser deixada a possibilidade de riem a ter elementos sobre as origens do meio em que se movimentarem».
Sábias palavras estas!
E o Arquivo de Cascais prosseguiu sua caminhada. O 2º volume (1981) foi integralmente constituído por «Personagens da Nossa Terra», o volume II de Cascais Menino, de Pedro Falcão. O nº 12 (1996) teve coordenação de Ricardo António Alves, chefe de Divisão do Património Histórico-cultural, sendo o vereador José Jorge Letria o responsável pela edição e que aí escreve, sob o título «História local, Memória viva»:
«Uma significativa parcela da memória deste concelho, enquanto comunidade e espaço plural onde a vida e a História se cumprem, encontra-se registada nos 12 números do ARQUIVO DE CASCAIS, que regularmente dá voz a investigadores desta terra que escrevem acerca dela, dos seus costumes, das suas tradições, do seu património edificado e das suas figuras históricas mais relevantes».
E conclui:
«O ARQUIVO DE CASCAIS é uma memória viva e dinâmica e honra e estimula quem a conhece e divulga. Por isso o publicamos, conscientes da sua importância e valor da herança de História local que ele deixará para o próximo milénio».
Mas… ficou-se por aqui. Diz-se que um desentendimento – que levou à saída de Ricardo Alves para a Câmara de Sintra, donde viera – provocou a suspensão da publicação, que viria a ser retomada já no tempo do presidente António Capucho (nº 13, 2005), sob responsabilidade da vereadora Ana Clara Justino, com textos do maior interesse, tendo-se salientado o seu papel como veículo de «estudos especializados sobre temas de História Local e Regional». E, mais uma vez, ficou-se por aqui.
Boca do Inferno
Homem, porém, mais ligado às Letras e às Artes do que à investigação histórica e às problemáticas do Património, José Jorge Letria acabaria por criar uma outra revista, Boca do Inferno, «de Cultura e Pensamento», cujo 1º número sai em 1996.
Haviam-se criado as «Conversas de Cascais», os Cursos Internacionais de Verão (cujas actas, em vários volumes, foram sendo publicadas) e o vereador considerou que, em Cascais, «a literatura, o debate de ideias, a cultura e as reflexões que ela suscita e reclama têm tido um papel relevante». E Boca do Inferno nasce para isso: «Um espaço aberto e plural para a literatura, o pensamento filosófico, a investigação histórica e confrontação de distintas visões da vida e do destino do Homem». Ou seja: era uma revista local, mas a sua dimensão não devia ficar «condicionada pela estreiteza das visões regionalistas ou bairristas». Em suma: perdeu-se pelas literaturas… E o carácter local acabaria por dissolver-se, como pode ver-se nos sumários das revistas seguintes. O último número publicado (9, Março 2004) só tem um texto directamente relacionado com Cascais: «Cascais e os primórdios do Cinema em Portugal», de José de Matos-Cruz.
Não nego o interesse de Boca do Inferno. Continuo, no entanto, a considerar que Arquivo de Cascais é um projecto a não perder. Mormente hoje que é possível fazer uma revista on line e apenas imprimir um número reduzido de exemplares, para oferta e/ou permuta.
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 306, 21-03-2012, p. 6].
Já não se faz e, se calhar, também não se ensina!
Peço perdão se volto à monografia da fábrica Ernesto L. Matias, Lda., que nos tem ocupado. É que a sua leitura acabou por me sugerir mais uma reflexão, a propósito da frase: «Hoje já não se praticam os actos de convívio que eram uma marca do fundador: convívios, passeios e excursões a vários pontos turísticos do país» (p. 41).
E será, decerto, por isso que o autor, ao apontar pistas de futuro, ousa sugerir:
«[…] É de considerar acções que acentuem mais a aproximação de todos os elementos da empresa, nomeadamente a comemoração de efemérides: dia da fundação da empresa, aniversário do fundador, felicitar o trabalhador no dia do seu aniversário, entre outros» (p. 45).
Iniciativas que, em seu entender, «teriam um papel de entusiasmo, de motivação adicional, o que poderia traduzir-se num maior envolvimento do funcionário com os objectivos gerais de produção da firma e aumentar a própria produtividade de cada trabalhador» (p. 46).
É bom que tal se proclame em alta voz e amplamente se reconheça! Porquê? Porque são muito outras – e por tal motivo candidatas ao mais rotundo fracasso… – as teorias dos que ora nos mandam por essa Europa:
«Excursões, comezainas, gozo de feriados?!... Estão loucos, seus utópicos duma figa! Mais uns diazinhos de férias como recompensa a quem nunca faltou e se empenhou o ano inteiro? Qual quê! Que mordomia essa!? Acabe-se já com isso! Trabalhar, trabalhar, trabalhar!».
Pois é. Esquecem-se que não estão a lidar com autómatos mas sim com pessoas que sentem, que pensam, que têm uma vida!... Pessoas para quem apreciar um lindo pôr-do-sol repousante em tranquilidade pode ser – é! – eficaz meio de ganhar forças e boa motivação para as tarefas a enfrentar no dia seguinte.
Isso, porém, de «pôr-do-sol», de «tranquilidade» não se ensina já nos compêndios nem nas aulas nem se ouve nos discursos! Seria coisa de… gente efeminada, quando o País é bem latino, mediterrânico, macho, pois então!...
Coitados!
Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 589, 15-03-2012, p. 13.
E será, decerto, por isso que o autor, ao apontar pistas de futuro, ousa sugerir:
«[…] É de considerar acções que acentuem mais a aproximação de todos os elementos da empresa, nomeadamente a comemoração de efemérides: dia da fundação da empresa, aniversário do fundador, felicitar o trabalhador no dia do seu aniversário, entre outros» (p. 45).
Iniciativas que, em seu entender, «teriam um papel de entusiasmo, de motivação adicional, o que poderia traduzir-se num maior envolvimento do funcionário com os objectivos gerais de produção da firma e aumentar a própria produtividade de cada trabalhador» (p. 46).
É bom que tal se proclame em alta voz e amplamente se reconheça! Porquê? Porque são muito outras – e por tal motivo candidatas ao mais rotundo fracasso… – as teorias dos que ora nos mandam por essa Europa:
«Excursões, comezainas, gozo de feriados?!... Estão loucos, seus utópicos duma figa! Mais uns diazinhos de férias como recompensa a quem nunca faltou e se empenhou o ano inteiro? Qual quê! Que mordomia essa!? Acabe-se já com isso! Trabalhar, trabalhar, trabalhar!».
Pois é. Esquecem-se que não estão a lidar com autómatos mas sim com pessoas que sentem, que pensam, que têm uma vida!... Pessoas para quem apreciar um lindo pôr-do-sol repousante em tranquilidade pode ser – é! – eficaz meio de ganhar forças e boa motivação para as tarefas a enfrentar no dia seguinte.
Isso, porém, de «pôr-do-sol», de «tranquilidade» não se ensina já nos compêndios nem nas aulas nem se ouve nos discursos! Seria coisa de… gente efeminada, quando o País é bem latino, mediterrânico, macho, pois então!...
Coitados!
Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 589, 15-03-2012, p. 13.
Igrejas Caeiro (18.08.1917-19.02.2012)
Por ter residido em Caxias, homenageou Jornal de Oeiras, na sua edição de 28 de Fevereiro, Igrejas Caeiro, «uma voz da Liberdade» (p. 5). Pôde ler-se, na entrada desse tocante depoimento de um dos amigos, José Manuel Marreiro, que o acompanhou nos últimos anos:
«Igrejas Caeiro até ao fim da vida demonstrou simpatia para com quem o rodeava, manifestando muitas vezes o que lhe custava já não poder fazer nada e os outros terem que fazer tudo».
Era, de facto, assim Igrejas Caeiro e ainda recordo a ‘festa’ que fez quando nos reencontrámos aqui há dois ou três anos, numa cerimónia. Aquele abraço amigo!
Igrejas Caeiro em Cascais
O meu primeiro «contacto» com Igrejas Caeiro aconteceu no ringue de patinagem de Cascais, num dos primeiros anos da década de 50, quando ali apresentou mais uma das sessões que o notabilizaram: «Os Companheiros da Alegria». Meus pais, que raramente iam a manifestações desse teor, não hesitaram em ir e levar-me, porque este programa de variedades detinha uma audiência extraordinária, graças também à inigualável simpatia de Igrejas Caeiro.
Viria a encontrá-lo já na década de 80, quando, no mandato de Helena Roseta (1983-1986), ficou a seu cargo o pelouro da Cultura. De imediato se criou entre nós uma grande empatia, facilitada, aliás também, pela amizade que ambos nutríamos pela então presidente. E foi Igrejas Caeiro quem, depois de Sousa Lara, continuaria a dar à Cultura maior visibilidade em Cascais, após o 25 de Abril.
Recordarei que foi no seu tempo que se criou e dinamizou a Comissão do Património Histórico-Cultural, a que presidiu, comissão constituída por individualidades (representantes de entidades ou a título particular pela sua competência) a quem na Câmara eram submetidos, para parecer, os projectos que se prendessem com o património cultural do concelho.
Para além do natural apoio ao Teatro Experimental de Cascais (ele que fora um homem do teatro), a Câmara comparticipou, logo em Julho de 1983, no Curso Livre de História, Geografia e Sociologia Locais, promovido, no Hotel Estoril-Sol, pela Sociedade Propaganda de Cascais. Hoje, iniciativas destas são vulgares; na altura, eram… pedradas no charco!
Também se vêem colecções de medalhas; desconhecer-se-á, porém, que foi em 1984 que a Câmara patrocinou uma colecção de seis medalhas de bronze (em estojo) intitulada Costa do Estoril Histórica e Monumental, com representação de seis dos mais característicos monumentos do concelho. E fez-se o primeiro guia de visita histórico-turística à vila de Cascais: Cascais, Guia para uma Visita (1983).
Prosseguiu a publicação da revista Arquivo de Cascais (nº 5, 1984), auspiciosamente iniciada ao tempo do seu antecessor, Sousa Lara; patrocinou-se a exposição «Cascais pelo olhar dos seus pintores», iniciativa do Jornal da Costa do Sol no Hotel Atlântico (Janeiro-Fevereiro de 1985).
No domínio da Arqueologia, diligenciou-se para que a gruta do Poço Velho viesse a ser aberta ao público (as inundações fariam abortar o projecto); apoiaram-se sem hesitação as operações de limpeza da villa romana do Alto do Cidreira, em Setembro de 1985, assim como o projecto de escavação do que viria a ser reconhecido como villa romana de Freiria (data desse mês a 1ª campanha).
Um testemunho e um desafio
Álvaro Ferreira – ajferreira74@gmail.com – teve oportunidade de divulgar ele próprio, no dia 22, um testemunho de que se me afigura interessante agora fazer-me eco.
Depois de se referir aos êxitos o folhetim humorístico "Zéquinha e Lelé" (de 1947 a 1948, com Vasco Santana e Irene Velez, sua mulher, na Emissora Nacional) e o já citado programa itinerante de variedades "Companheiros da Alegria" (de 1951 a 1954, para o Rádio Clube Português), dá Álvaro Ferreira particular realce à «impressionante série de entrevistas "Perfil de um Artista" (de 1954 a 1960, para o Rádio Clube Português), que contemplou 258 personalidades das artes e das letras portuguesas e estrangeiras (num total de 300 edições)». Considera, aliás, que esse será, sem dúvida, o seu «principal legado para a posteridade», pois se trata de um «acervo de inestimável valor histórico e documental», sendo «muito provável até que para algumas figuras da cultura portuguesa do século XX o único registo de voz que exista seja o desses fonogramas».
E acrescenta:
«Os registos (desconheço se todos – é bem possível que alguns tenham sido entretanto destruídos) estão soterrados e esquecidos sob o pó, no arquivo histórico da RDP. Ora o melhor tributo que a rádio pública pode prestar à memória de Igrejas Caeiro (e, bem assim, à dos seus eméritos entrevistados) é a transmissão de todas essas entrevistas».
Cá está uma excelente ideia!
Executivo fez um minuto de silêncio
Conforme se pode ler na minuta da acta da reunião camarária de 20 de Fevereiro, no primeiro ponto antes da ordem do dia, o Senhor Presidente evocou a memória de Igrejas Caeiro e lembrou que «também foi vereador nesta Câmara Municipal», acrescentando-se:
«A sua vida expandiu-se pela rádio, pelo teatro, pela televisão e pelo cinema, com especial destaque antes do 25 de Abril, tendo sido um cidadão empenhado na luta pela democracia»; «terminou propondo que a Câmara Municipal guardasse um minuto de silêncio em sua memória».
Nada mais se diz nessa minuta.
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 305, 14-03-2012, p. 6].
«Igrejas Caeiro até ao fim da vida demonstrou simpatia para com quem o rodeava, manifestando muitas vezes o que lhe custava já não poder fazer nada e os outros terem que fazer tudo».
Era, de facto, assim Igrejas Caeiro e ainda recordo a ‘festa’ que fez quando nos reencontrámos aqui há dois ou três anos, numa cerimónia. Aquele abraço amigo!
Igrejas Caeiro em Cascais
O meu primeiro «contacto» com Igrejas Caeiro aconteceu no ringue de patinagem de Cascais, num dos primeiros anos da década de 50, quando ali apresentou mais uma das sessões que o notabilizaram: «Os Companheiros da Alegria». Meus pais, que raramente iam a manifestações desse teor, não hesitaram em ir e levar-me, porque este programa de variedades detinha uma audiência extraordinária, graças também à inigualável simpatia de Igrejas Caeiro.
Viria a encontrá-lo já na década de 80, quando, no mandato de Helena Roseta (1983-1986), ficou a seu cargo o pelouro da Cultura. De imediato se criou entre nós uma grande empatia, facilitada, aliás também, pela amizade que ambos nutríamos pela então presidente. E foi Igrejas Caeiro quem, depois de Sousa Lara, continuaria a dar à Cultura maior visibilidade em Cascais, após o 25 de Abril.
Recordarei que foi no seu tempo que se criou e dinamizou a Comissão do Património Histórico-Cultural, a que presidiu, comissão constituída por individualidades (representantes de entidades ou a título particular pela sua competência) a quem na Câmara eram submetidos, para parecer, os projectos que se prendessem com o património cultural do concelho.
Para além do natural apoio ao Teatro Experimental de Cascais (ele que fora um homem do teatro), a Câmara comparticipou, logo em Julho de 1983, no Curso Livre de História, Geografia e Sociologia Locais, promovido, no Hotel Estoril-Sol, pela Sociedade Propaganda de Cascais. Hoje, iniciativas destas são vulgares; na altura, eram… pedradas no charco!
Também se vêem colecções de medalhas; desconhecer-se-á, porém, que foi em 1984 que a Câmara patrocinou uma colecção de seis medalhas de bronze (em estojo) intitulada Costa do Estoril Histórica e Monumental, com representação de seis dos mais característicos monumentos do concelho. E fez-se o primeiro guia de visita histórico-turística à vila de Cascais: Cascais, Guia para uma Visita (1983).
Prosseguiu a publicação da revista Arquivo de Cascais (nº 5, 1984), auspiciosamente iniciada ao tempo do seu antecessor, Sousa Lara; patrocinou-se a exposição «Cascais pelo olhar dos seus pintores», iniciativa do Jornal da Costa do Sol no Hotel Atlântico (Janeiro-Fevereiro de 1985).
No domínio da Arqueologia, diligenciou-se para que a gruta do Poço Velho viesse a ser aberta ao público (as inundações fariam abortar o projecto); apoiaram-se sem hesitação as operações de limpeza da villa romana do Alto do Cidreira, em Setembro de 1985, assim como o projecto de escavação do que viria a ser reconhecido como villa romana de Freiria (data desse mês a 1ª campanha).
Um testemunho e um desafio
Álvaro Ferreira – ajferreira74@gmail.com – teve oportunidade de divulgar ele próprio, no dia 22, um testemunho de que se me afigura interessante agora fazer-me eco.
Depois de se referir aos êxitos o folhetim humorístico "Zéquinha e Lelé" (de 1947 a 1948, com Vasco Santana e Irene Velez, sua mulher, na Emissora Nacional) e o já citado programa itinerante de variedades "Companheiros da Alegria" (de 1951 a 1954, para o Rádio Clube Português), dá Álvaro Ferreira particular realce à «impressionante série de entrevistas "Perfil de um Artista" (de 1954 a 1960, para o Rádio Clube Português), que contemplou 258 personalidades das artes e das letras portuguesas e estrangeiras (num total de 300 edições)». Considera, aliás, que esse será, sem dúvida, o seu «principal legado para a posteridade», pois se trata de um «acervo de inestimável valor histórico e documental», sendo «muito provável até que para algumas figuras da cultura portuguesa do século XX o único registo de voz que exista seja o desses fonogramas».
E acrescenta:
«Os registos (desconheço se todos – é bem possível que alguns tenham sido entretanto destruídos) estão soterrados e esquecidos sob o pó, no arquivo histórico da RDP. Ora o melhor tributo que a rádio pública pode prestar à memória de Igrejas Caeiro (e, bem assim, à dos seus eméritos entrevistados) é a transmissão de todas essas entrevistas».
Cá está uma excelente ideia!
Executivo fez um minuto de silêncio
Conforme se pode ler na minuta da acta da reunião camarária de 20 de Fevereiro, no primeiro ponto antes da ordem do dia, o Senhor Presidente evocou a memória de Igrejas Caeiro e lembrou que «também foi vereador nesta Câmara Municipal», acrescentando-se:
«A sua vida expandiu-se pela rádio, pelo teatro, pela televisão e pelo cinema, com especial destaque antes do 25 de Abril, tendo sido um cidadão empenhado na luta pela democracia»; «terminou propondo que a Câmara Municipal guardasse um minuto de silêncio em sua memória».
Nada mais se diz nessa minuta.
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 305, 14-03-2012, p. 6].
terça-feira, 13 de março de 2012
Ter butze
Encantam-me, não há dúvida, as questões de linguagem, porque reconheço nas palavras e nas expressões uma carga cultural imensa. Não se trata da mera questão de se lhes descortinar a etimologia: «vem do grego», «vem do latim», «vem do árabe»... Interessa-me sobretudo verificar como é que elas passam para a linguagem falada e porquê.
Ao largo de Cascais naufragou, a 9 de Novembro de 1939, um vapor holandês que trazia um carregamento de querosene “para conservação das sulipas”. Ao ler a notícia, admirei-me: sulipas? Que poderia ser isso? Era a versão, em gíria, da palavra chulipa, designativa das travessas de madeira das vias-férreas! O aportuguesamento da palavra inglesa sleeper, «dorminhoco», pois que sobre as chulipas ‘dormem’ os carris!...
E nessa ordem de ideias ando às voltas com a palavra butze, cuja grafia correcta desconheço. Sei, porém, que, quando era catraio e jogava ao berlinde, disputávamos quem é que «tinha mais butze», ou seja, quem é que, com a pancada seca do dedo, conseguia atirar o berlinde mais longe. Nunca mais ouvi a palavra nem tenho a menor ideia donde é que possa ter vindo! Será que era ‘butes’ o que queríamos dizer, como se prantássemos pés nos berlindes para eles se porem a andar?...
Publicado no mensário VilAdentro [S. Brás de Alportel], nº 158 (Março 2012) p. 10.
Ao largo de Cascais naufragou, a 9 de Novembro de 1939, um vapor holandês que trazia um carregamento de querosene “para conservação das sulipas”. Ao ler a notícia, admirei-me: sulipas? Que poderia ser isso? Era a versão, em gíria, da palavra chulipa, designativa das travessas de madeira das vias-férreas! O aportuguesamento da palavra inglesa sleeper, «dorminhoco», pois que sobre as chulipas ‘dormem’ os carris!...
E nessa ordem de ideias ando às voltas com a palavra butze, cuja grafia correcta desconheço. Sei, porém, que, quando era catraio e jogava ao berlinde, disputávamos quem é que «tinha mais butze», ou seja, quem é que, com a pancada seca do dedo, conseguia atirar o berlinde mais longe. Nunca mais ouvi a palavra nem tenho a menor ideia donde é que possa ter vindo! Será que era ‘butes’ o que queríamos dizer, como se prantássemos pés nos berlindes para eles se porem a andar?...
Publicado no mensário VilAdentro [S. Brás de Alportel], nº 158 (Março 2012) p. 10.
sexta-feira, 9 de março de 2012
Quinta do Villar - o aproveitamento condigno dum vale singular
Constitui a Ribeira das Vinhas o mais significativo curso de água do concelho de Cascais. Para o seu encanto contribui não o facto de ter sido encanada, no trecho final, de forma a desaguar, quase despercebida, na Praia dos Pescadores, junto ao Palacete Seixas, mas sim a beleza ímpar das suas margens, sobretudo para montante do Bairro S. José.
Cientes dessa maravilha, têm promovido o Grupo Ecológico de Cascais e a Agência Cascais Natura caminhadas ao longo do seu leito, a fim de todos facilmente se aperceberem da biodiversidade vegetal e animal ainda ali existente.
Uma das iniciativas que nunca será de mais elogiar foi a criação do Parque das Penhas do Marmeleiro, a nascente de Murches, que tem página no facebook. Mui agradável equipamento de lazer, de que a população deveria usufruir ainda mais, até para que – com maior frequência das gentes – aos patifes fossem proporcionadas menos oportunidades de dar livre curso às suas pulsões destruidoras. Talvez também assim, com mais assíduos frequentadores, os responsáveis lograssem obter meios para tornarem operacionais os apetrechos da criançada, implantados (mal) em plataforma encharcada.
Por aí a ribeira não é «das Vinhas» mas «do Marmeleiro», por ser esta árvore outrora abundante no vale.
Resulta, de facto, do casamento ente a Ribeira do Pisão e a da Penha Longa, cujas bacias hidrográficas ressumam a plagas mediterrânicas…
As quintas
Esquece-se amiúde que Cascais não é apenas o litoral e que não foi apenas na 2ª metade do século XIX que os nobres descobriram – com os reis – as maravilhas cascalenses. Já muito antes, designadamente junto aos cursos de água, se haviam instalado ilustres famílias, que, a par das delícias do clima, usufruíam da fecundidade da terra, que diligentemente cultivavam: pomares, produtos hortícolas, vinha, olivais… Não se chama «das Vinhas» a ribeira? Sem já falarmos de azenhas e pisões…
Até, pois, ao lugarejo Rio Marmeleiro, tudo eram quintas por aí acima. Bem cuidados socalcos sustinham as terras e o húmus fecundante.
A recuperação da Quinta do Villar
A Quinta das Patinhas – a confinar, agora, pelo sul, com a 3ª circular – era uma delas. Com sua casa «senhorial» à boa maneira das mansões da época, teve como proprietário Armando Penim Villar, cascalense notável inteiramente dedicado à causa pública. Ultrapassou a provecta idade de cem anos e manteve até final sadio espírito de serviço. Deve-lhe muito a Sociedade Propaganda de Cascais assim como a Santa Casa da Misericórdia, de que foi provedor largos anos.
Este seu espírito de serviço soube transmitir ao neto Ricardo, antigo aluno salesiano, que, tendo herdado parte da quinta, resistiu à tentação de propor para ela um plano de urbanização (saborosamente e com jeitinho ali ficava um condomínio de luxo, como os que lhe prantaram no cimo!...) e decidiu meter ombros a obra meritória: ressuscitar a vocação agropecuária do lugar, dedicando-a, de modo particular, à pequenada. Galinhas, coelhos, gansos, patos, perus, ovelhas, burros, cabras… são, para além da abundante e vária passarada que por ali nidifica e vive, os habitantes desta arca de Noé em ponto pequeno. Depois, as árvores (devidamente identificadas) e toda a sorte de produtos hortícolas, cultivados à moda antiga. Há um aeromotor que tira água dum poço, mas também se mostra velhinha nora, que a criançada pode pôr a funcionar, assim como adestrar-se no estranho manejo da picota…
A vista virtual – www.quintadovillar.com – constituirá, sem dúvida, seguro aliciante para uma visita ao vivo! Vale a pena!
Post-scriptum: Pode fazer-se também uma curta visita de helicóptero: http://www.youtube.com/watch?v=9lNgyLzrHWY&feature=youtube_gdata
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 304, 07-03-2012, p. 6].
Cientes dessa maravilha, têm promovido o Grupo Ecológico de Cascais e a Agência Cascais Natura caminhadas ao longo do seu leito, a fim de todos facilmente se aperceberem da biodiversidade vegetal e animal ainda ali existente.
Uma das iniciativas que nunca será de mais elogiar foi a criação do Parque das Penhas do Marmeleiro, a nascente de Murches, que tem página no facebook. Mui agradável equipamento de lazer, de que a população deveria usufruir ainda mais, até para que – com maior frequência das gentes – aos patifes fossem proporcionadas menos oportunidades de dar livre curso às suas pulsões destruidoras. Talvez também assim, com mais assíduos frequentadores, os responsáveis lograssem obter meios para tornarem operacionais os apetrechos da criançada, implantados (mal) em plataforma encharcada.
Por aí a ribeira não é «das Vinhas» mas «do Marmeleiro», por ser esta árvore outrora abundante no vale.
Resulta, de facto, do casamento ente a Ribeira do Pisão e a da Penha Longa, cujas bacias hidrográficas ressumam a plagas mediterrânicas…
As quintas
Esquece-se amiúde que Cascais não é apenas o litoral e que não foi apenas na 2ª metade do século XIX que os nobres descobriram – com os reis – as maravilhas cascalenses. Já muito antes, designadamente junto aos cursos de água, se haviam instalado ilustres famílias, que, a par das delícias do clima, usufruíam da fecundidade da terra, que diligentemente cultivavam: pomares, produtos hortícolas, vinha, olivais… Não se chama «das Vinhas» a ribeira? Sem já falarmos de azenhas e pisões…
Até, pois, ao lugarejo Rio Marmeleiro, tudo eram quintas por aí acima. Bem cuidados socalcos sustinham as terras e o húmus fecundante.
A recuperação da Quinta do Villar
A Quinta das Patinhas – a confinar, agora, pelo sul, com a 3ª circular – era uma delas. Com sua casa «senhorial» à boa maneira das mansões da época, teve como proprietário Armando Penim Villar, cascalense notável inteiramente dedicado à causa pública. Ultrapassou a provecta idade de cem anos e manteve até final sadio espírito de serviço. Deve-lhe muito a Sociedade Propaganda de Cascais assim como a Santa Casa da Misericórdia, de que foi provedor largos anos.
Este seu espírito de serviço soube transmitir ao neto Ricardo, antigo aluno salesiano, que, tendo herdado parte da quinta, resistiu à tentação de propor para ela um plano de urbanização (saborosamente e com jeitinho ali ficava um condomínio de luxo, como os que lhe prantaram no cimo!...) e decidiu meter ombros a obra meritória: ressuscitar a vocação agropecuária do lugar, dedicando-a, de modo particular, à pequenada. Galinhas, coelhos, gansos, patos, perus, ovelhas, burros, cabras… são, para além da abundante e vária passarada que por ali nidifica e vive, os habitantes desta arca de Noé em ponto pequeno. Depois, as árvores (devidamente identificadas) e toda a sorte de produtos hortícolas, cultivados à moda antiga. Há um aeromotor que tira água dum poço, mas também se mostra velhinha nora, que a criançada pode pôr a funcionar, assim como adestrar-se no estranho manejo da picota…
A vista virtual – www.quintadovillar.com – constituirá, sem dúvida, seguro aliciante para uma visita ao vivo! Vale a pena!
Post-scriptum: Pode fazer-se também uma curta visita de helicóptero: http://www.youtube.com/watch?v=9lNgyLzrHWY&feature=youtube_gdata
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 304, 07-03-2012, p. 6].
quinta-feira, 1 de março de 2012
Teoria e prática
Escreveu António Tavares no livro Ernesto L. Matias, Lda., a que me referi na edição de 1 de Fevereiro:
«Podemos concluir que a Ernesto L. Matias, Lda. possui uma cultura organizacional estruturante, pese embora não haja uma consciência assumida desse facto» (p. 43).
Explica-se em nota que se pretende explicitar que existe na empresa um «conjunto de valores, práticas, atitudes e métodos de trabalho e de relacionamento que caracterizam intrinsecamente a organização e a aperfeiçoam no ponto de vista orgânico e de funcionamento».
Essa constatação fez-me lembrar três situações da minha vida.
Um dia, nos primórdios da década de 70, Águeda Sena cumprimentou-me porque eu estava a aplicar nas aulas as teorias de Jean Piaget, quando poucos ainda as aplicavam em Portugal. Corri a ver os meus apontamentos de Ciências Pedagógicas, para tentar saber o que, de facto, eu estava a fazer sem disso ter consciência!
A propósito do título do meu livro Cascais – Paisagem com Pessoas dentro, recebi do Brasil uma congratulação:
«Parabéns também pelo título. Vejo que o amigo seguiu a ideia de paisagem/espaço social se preocupando com a representação dos marcos espaciais no cotidiano das pessoas, não é?»
Nunca pensara nisso, confesso! Apenas que, por detrás de uma paisagem, estão pessoas e são elas que, para mim, importam. Expliquei isso ao meu interlocutor, que retorquiu: «És um auto-didata. Sacou as preocupações que os teóricos gastam livros e livros para tentar explicar. Digo tentar porque enrolam muito. Nada como a objetividade dos epigrafistas.»
E, também recentemente, dei conta, num artigo, das diligências para chegar à decifração de inscrições aparentemente indecifráveis. Comentário do responsável pela revista onde está prevista a publicação:
«O texto enviado constitui um conjunto de estratos históricos interessantíssimos a todos os níveis que se encontram num conjunto cuja metodologia de análise quase que poderemos classificar de cripto-epigrafia (a construção conceptual de cripto-história da arte) que recupera o sentido indiciário como um caminho para a fonte total».
Pasmei! Nunca pensara nisso!
Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 588, 01-03-2012, p. 13.
«Podemos concluir que a Ernesto L. Matias, Lda. possui uma cultura organizacional estruturante, pese embora não haja uma consciência assumida desse facto» (p. 43).
Explica-se em nota que se pretende explicitar que existe na empresa um «conjunto de valores, práticas, atitudes e métodos de trabalho e de relacionamento que caracterizam intrinsecamente a organização e a aperfeiçoam no ponto de vista orgânico e de funcionamento».
Essa constatação fez-me lembrar três situações da minha vida.
Um dia, nos primórdios da década de 70, Águeda Sena cumprimentou-me porque eu estava a aplicar nas aulas as teorias de Jean Piaget, quando poucos ainda as aplicavam em Portugal. Corri a ver os meus apontamentos de Ciências Pedagógicas, para tentar saber o que, de facto, eu estava a fazer sem disso ter consciência!
A propósito do título do meu livro Cascais – Paisagem com Pessoas dentro, recebi do Brasil uma congratulação:
«Parabéns também pelo título. Vejo que o amigo seguiu a ideia de paisagem/espaço social se preocupando com a representação dos marcos espaciais no cotidiano das pessoas, não é?»
Nunca pensara nisso, confesso! Apenas que, por detrás de uma paisagem, estão pessoas e são elas que, para mim, importam. Expliquei isso ao meu interlocutor, que retorquiu: «És um auto-didata. Sacou as preocupações que os teóricos gastam livros e livros para tentar explicar. Digo tentar porque enrolam muito. Nada como a objetividade dos epigrafistas.»
E, também recentemente, dei conta, num artigo, das diligências para chegar à decifração de inscrições aparentemente indecifráveis. Comentário do responsável pela revista onde está prevista a publicação:
«O texto enviado constitui um conjunto de estratos históricos interessantíssimos a todos os níveis que se encontram num conjunto cuja metodologia de análise quase que poderemos classificar de cripto-epigrafia (a construção conceptual de cripto-história da arte) que recupera o sentido indiciário como um caminho para a fonte total».
Pasmei! Nunca pensara nisso!
Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 588, 01-03-2012, p. 13.
Pampilheira oriental – um recanto muito apetecido!
Fantasias
Vai longe o projecto profundamente inovador do Conde de Monte Real, que sonhou para esta área da freguesia de Cascais, nos primórdios dos anos 30 do século passado, um grande bairro residencial para famílias carenciadas (vide p. 21-24 do livro Recantos de Cascais, CMC, 2007). Só doze moradias se fizeram (o chamado Bairro Operário ou Bairro José Luís), de que o 1º renque, por desocupação e degradação, já a EMGHA, Gestão da Habitação Social de Cascais, EM, SA, demoliu.
O mato cresceu por ali durante anos; houve até um excêntrico sonhador que, sobre o leito da Ribeira do Cobre, afluente da Ribeira das Vinhas, construiu, ao lado da casa, bem alta torre quadrangular, aí de uns cinco andares. Dizia que era para, em momentos agradáveis – havia um compartimento em cada andar… – dali poder espraiar as vistas pelo mar…
A urbanização condicionada
A urbanização do bairro – chamava-se a zona ‘Barraca de Pau’ – na década de 60 procurou não criar anticorpos adormecidos, pois – repito – o terreno fora doado exclusivamente com objectivos filantrópicos. Deu-se, porém, «a volta ao texto», privilegiando-se as cooperativas de habitação e aos construtores dispostos a estabelecerem rendas condicionadas e a darem prioridade no arrendamento a funcionários públicos e, como então surgira a 1ª fábrica na freguesia, a empregados da Standard Eléctrica. Os lotes sobrantes, para sul, venderam-se em hasta pública, para moradias singulares, reservando-se o canto sudeste para pequenas indústrias. É por isso que aí se localizam um estaleiro naval, uma fábrica de meias, oficinas do ramo automóvel, o Centro de Distribuição Postal, o centro de inspecção automóvel, alguns equipamentos comerciais e, mais recentemente, a Clínica CUF.
Maldição?
No local da torre excêntrica, nada se construiu. Maldição temida? Seja como for, bruxarias não as houve, que se saiba, mas se por ali não paira alma penada… parece!
É que o urbanizador teve de deixar o terreno livre e aí preparou mui simpático campo de ténis, que, por falta de uso e de responsável, conheceu paulatina degradação, embora fosse sendo usado pela pequenada e pelos jovens do bairro para seu entretenimento de jogos e bicicletas. Até que, em Novembro de 2008, os moradores foram surpreendidos por um aviso, na Rua Mário Clarel: Não estacione, que vamos iniciar construção! Pergunta aqui, pergunta ali… era o Centro Municipal de Cidadania Rodoviária, que, no segredo camarário, para ali fora projectado pelo Departamento de Planeamento Estratégico. O quê? Cidadania Rodoviária? Alvoroço, movimentação, que é isto?!... E onde é que os nossos jovens vão jogar à bola, andar de bicicleta? Por que carga de água, aqui, um Centro Municipal de Cidadania Rodoviária de que nunca se ouvira falar? Interpelado, o próprio Presidente da autarquia, Dr. António Capucho, disse não estar ao corrente. E também Pedro Silva, presidente da Freguesia, desconhecia. Mui amavelmente, porém, a Presidência aceitou de imediato reunir com uma representação dos moradores; ouviram-se razões e decidiu-se que, na verdade, era melhor não. E logo dali saiu a preparação de novo projecto, cujas linhas gerais foram solicitadas aos moradores pela carta 026744, de 15-05-2009, os quais responderam a 30-06-2009. E encarregou-se dele a Agência Cascais Natura.
Dois anos passados, como nada de concreto se visse, o novo Presidente da CMC, Dr. Carlos Carreiras, aceitou reunir com os moradores, a 14 de Junho de 2011, onde foi apresentado o referido projecto elaborado pela Cascais Natura, sob coordenação do Sr. Arq. João Cardoso de Melo. Na sequência da troca de impressões, foram incorporadas no projecto as considerações dos moradores explanadas em memorando, após o que o assunto passou directamente para a CMC, na perspectiva de o implementar, deixando a Cascais Natura de estar envolvida.
E porque o processo estava – aparentemente! – em andamento, ninguém apresentou para o local qualquer outra proposta, no âmbito do Orçamento Participativo.
Da Natura à… cozinha!
Qual não é, porém, o espanto dos moradores quando, neste Carnaval, vêem funcionários da ESUC proceder à vedação de cerca de um terço do terreno em questão e se descobre a intenção de ali vir a ser instalada… uma cozinha!Claro: sucederam-se os e-mails para a Câmara, dado que – supunham os moradores – só podia ser brincadeira de Carnaval, depois do grande empenho de cidadania que tinham demonstrado ao longo deste processo, num concelho que se quer «elevado às pessoas».
Mais uma vez, porém, se concluiu que organismos camarários entraram por vinha vindimada, que isto é nosso e ninguém tem nada com o facto de querermos aqui instalar a Cozinha com Alma!... Ora toma!
Nenhum inconveniente nisso e até ficamos com a cozinhinha mais à mão, na perspectiva, que se avizinha, de termos de lá ir, de marmita na mão, buscar a sopa de cada dia. Tudo bem! Pampilheira é acolhedora, o sítio é simpático… Não fizera ali o vizinho uma torre de ver o mar?!... Os moradores sentem-se, todavia, frustrados, porque… mais uma vez se praticou a política do facto consumado. E é pena que também a nível local – e em Cascais! – se imitem comportamentos que repudiamos nos governos europeus. Hoje, que a comunicação é tão fácil e que a Internet até funciona…
Os nossos melhores votos para o êxito da Cozinha com Alma, já a funcionar uns duzentos metros mais acima, na Creche da Pampilheira, sem ser em leito de cheia…
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 303, 29-02-2012, p. 6].
Vai longe o projecto profundamente inovador do Conde de Monte Real, que sonhou para esta área da freguesia de Cascais, nos primórdios dos anos 30 do século passado, um grande bairro residencial para famílias carenciadas (vide p. 21-24 do livro Recantos de Cascais, CMC, 2007). Só doze moradias se fizeram (o chamado Bairro Operário ou Bairro José Luís), de que o 1º renque, por desocupação e degradação, já a EMGHA, Gestão da Habitação Social de Cascais, EM, SA, demoliu.
O mato cresceu por ali durante anos; houve até um excêntrico sonhador que, sobre o leito da Ribeira do Cobre, afluente da Ribeira das Vinhas, construiu, ao lado da casa, bem alta torre quadrangular, aí de uns cinco andares. Dizia que era para, em momentos agradáveis – havia um compartimento em cada andar… – dali poder espraiar as vistas pelo mar…
A urbanização condicionada
A urbanização do bairro – chamava-se a zona ‘Barraca de Pau’ – na década de 60 procurou não criar anticorpos adormecidos, pois – repito – o terreno fora doado exclusivamente com objectivos filantrópicos. Deu-se, porém, «a volta ao texto», privilegiando-se as cooperativas de habitação e aos construtores dispostos a estabelecerem rendas condicionadas e a darem prioridade no arrendamento a funcionários públicos e, como então surgira a 1ª fábrica na freguesia, a empregados da Standard Eléctrica. Os lotes sobrantes, para sul, venderam-se em hasta pública, para moradias singulares, reservando-se o canto sudeste para pequenas indústrias. É por isso que aí se localizam um estaleiro naval, uma fábrica de meias, oficinas do ramo automóvel, o Centro de Distribuição Postal, o centro de inspecção automóvel, alguns equipamentos comerciais e, mais recentemente, a Clínica CUF.
Maldição?
No local da torre excêntrica, nada se construiu. Maldição temida? Seja como for, bruxarias não as houve, que se saiba, mas se por ali não paira alma penada… parece!
É que o urbanizador teve de deixar o terreno livre e aí preparou mui simpático campo de ténis, que, por falta de uso e de responsável, conheceu paulatina degradação, embora fosse sendo usado pela pequenada e pelos jovens do bairro para seu entretenimento de jogos e bicicletas. Até que, em Novembro de 2008, os moradores foram surpreendidos por um aviso, na Rua Mário Clarel: Não estacione, que vamos iniciar construção! Pergunta aqui, pergunta ali… era o Centro Municipal de Cidadania Rodoviária, que, no segredo camarário, para ali fora projectado pelo Departamento de Planeamento Estratégico. O quê? Cidadania Rodoviária? Alvoroço, movimentação, que é isto?!... E onde é que os nossos jovens vão jogar à bola, andar de bicicleta? Por que carga de água, aqui, um Centro Municipal de Cidadania Rodoviária de que nunca se ouvira falar? Interpelado, o próprio Presidente da autarquia, Dr. António Capucho, disse não estar ao corrente. E também Pedro Silva, presidente da Freguesia, desconhecia. Mui amavelmente, porém, a Presidência aceitou de imediato reunir com uma representação dos moradores; ouviram-se razões e decidiu-se que, na verdade, era melhor não. E logo dali saiu a preparação de novo projecto, cujas linhas gerais foram solicitadas aos moradores pela carta 026744, de 15-05-2009, os quais responderam a 30-06-2009. E encarregou-se dele a Agência Cascais Natura.
Dois anos passados, como nada de concreto se visse, o novo Presidente da CMC, Dr. Carlos Carreiras, aceitou reunir com os moradores, a 14 de Junho de 2011, onde foi apresentado o referido projecto elaborado pela Cascais Natura, sob coordenação do Sr. Arq. João Cardoso de Melo. Na sequência da troca de impressões, foram incorporadas no projecto as considerações dos moradores explanadas em memorando, após o que o assunto passou directamente para a CMC, na perspectiva de o implementar, deixando a Cascais Natura de estar envolvida.
E porque o processo estava – aparentemente! – em andamento, ninguém apresentou para o local qualquer outra proposta, no âmbito do Orçamento Participativo.
Da Natura à… cozinha!
Qual não é, porém, o espanto dos moradores quando, neste Carnaval, vêem funcionários da ESUC proceder à vedação de cerca de um terço do terreno em questão e se descobre a intenção de ali vir a ser instalada… uma cozinha!Claro: sucederam-se os e-mails para a Câmara, dado que – supunham os moradores – só podia ser brincadeira de Carnaval, depois do grande empenho de cidadania que tinham demonstrado ao longo deste processo, num concelho que se quer «elevado às pessoas».
Mais uma vez, porém, se concluiu que organismos camarários entraram por vinha vindimada, que isto é nosso e ninguém tem nada com o facto de querermos aqui instalar a Cozinha com Alma!... Ora toma!
Nenhum inconveniente nisso e até ficamos com a cozinhinha mais à mão, na perspectiva, que se avizinha, de termos de lá ir, de marmita na mão, buscar a sopa de cada dia. Tudo bem! Pampilheira é acolhedora, o sítio é simpático… Não fizera ali o vizinho uma torre de ver o mar?!... Os moradores sentem-se, todavia, frustrados, porque… mais uma vez se praticou a política do facto consumado. E é pena que também a nível local – e em Cascais! – se imitem comportamentos que repudiamos nos governos europeus. Hoje, que a comunicação é tão fácil e que a Internet até funciona…
Os nossos melhores votos para o êxito da Cozinha com Alma, já a funcionar uns duzentos metros mais acima, na Creche da Pampilheira, sem ser em leito de cheia…
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 303, 29-02-2012, p. 6].
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