sábado, 25 de junho de 2011

Andarilhanças 6

Cerimónia do 10 de Junho
Há males que vêm por bem. Escorraçadas do Largo Camões pela ganância economicista, as comemorações do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades acabaram por ganhar, este ano, novo brilho. Tudo se passou no largo fronteiro aos Paços do Concelho, que se viu cercado de bandas vindas dos quatro cantos da vila, na presença de representantes das entidades locais que houveram por bem comparecer. As duas coroas de flores – da Câmara e da Sociedade Propaganda de Cascais – foram, em pequena romagem, depositadas aos pés da estátua do Épico, enquanto os clarins dos bombeiros tocavam a sentido. De regresso ao largo, procedeu-se ao içar das bandeiras, enquanto se entoava o hino nacional; um actor, vestido à Camões, disse as primeiras oitavas d’Os Lusíadas; o Presidente da Câmara passou revista à corporação de bombeiros perfilada e… bateram-se palmas. Ao Épico, a Portugal, à nossa vontade de, em cerimónia singela mas digna, mostrarmos que… ainda temos orgulho em ser Portugueses!

Paredão: arte, arranjos…
Engalanou-se o paredão para bem receber os veraneantes.
Além de se ter logrado terminar a tempo o arranjo das plataformas e das guardas que a fúria do mar destruíra, houve a 4ª edição da Artemar, concurso internacional de escultura que chama a atenção para a necessidade de preservarmos o mar, pois que as peças a concurso devem ser «construídas a partir de resíduos retirados do mar ou que representem este elemento natural» – mais um pretexto, portanto, para deleite e consciencialização. E, este ano, expuseram-se também painéis com a reprodução das peças mais significativas das três edições anteriores. Boa ideia!

Parques de estacionamento
No momento em que redijo esta nota, ainda não sei se já se paga o estacionamento no parque que serve, principalmente, o Parque Marechal Carmona e a Casa das Histórias Paula Rego. Não sei, por isso, se foi atendida a minhas sugestão de, praticando-se tarifas ‘sociais’ (digamos assim), esse parque poder ser considerado de ‘serviço público’, tendo em conta os equipamentos de cultura e lazer que serve.
Sei, porém, não porque a ESUC me haja respondido mas porque fui lá, que o parque frente ao Parque Palmela tem, na verdade, tarifas aceitáveis, contabilizáveis ao minuto. Congratulo-me.

Placa ALCOITÃO do ACP
Estiveram paradas durante anos as obras de reconstrução de uma casa saloia, à entrada de Alcoitão vindo de Manique. Marcava essa casa, em meados do século passado, a entrada no núcleo urbano da aldeia e ostentava, por isso, a placa azulejada ali manda colocar por iniciativa do Automóvel Clube de Portugal, com a indicação do topónimo: ALCOITÃO.
Sempre que passava por ali, tremia: «Será que vão ter a sensibilidade de a manter como documento histórico»?
Mantiveram. Como também não alteraram cognitivamente a traça original do casal.
Parabéns!

«Cai Água»
Publica o Núcleo de Amigos de S. Pedro do Estoril (NASPE) o seu boletim, a que deram o significado nome de Cai Água, que era o nome primitivo da povoação.
Tenho presente o nº 25, de Julho, que abre com uma bonita imagem do «anfiteatro» da Pedra do Sal ao pôr-do-sol e a propósito da qual a presidente do NASPE preconiza a reconstituição do moinho e da azenha que foram, afinal, o ex-líbris do sítio e lhe deram o nome – da água que deles corria sobre a falésia, para o mar…
Destaque ainda para duas sugestões: prende-se a primeira com a proposta de ser dado à Escola EB 1 de S. Pedro o nome da Profª Hortênsia Correia, benemérita que, há 51 anos, «com recurso à venda de património familiar, decidiu custear a construção de mais uma sala de aula»; refere-se a segunda a um apelo à cidadania: para além de se procurar evitar deitar lixo para a via pública (e há uma imagem impressionante nesse boletim), é muito fácil fazer um telefonema (que é gratuito – 800 203 186) para a EMAC, quando se verificar que, nesse aspecto, algo não está a correr bem.

Publicado em Jornal de Cascais, nº 272, 22-06-2011, p. 4.

sábado, 18 de junho de 2011

Andarilhanças 5

Padre José Maria Loureiro
Passou a 29 de Maio o centenário do falecimento do Padre José Maria Loureiro, que foi, durante 46 anos (1865-1911), prior da freguesia da Nossa Senhora da Assunção, de Cascais, e cuja benemerente acção religiosa e cultural muito engrandeceu a vila.
O acólito José João Loureiro, que muito se tem dedicado à história religiosa do concelho, teve ocasião, no dia 28, de salientar os aspectos mais significativos da obra do insigne sacerdote, após a missa solene mandada celebrar, nesse dia, pela Mesa Administrativa da Santa Casa da Misericórdia de Cascais.
Houve, depois, romagem ao cemitério da Guia, onde, em «coval doado pela municipalidade», jazem os seus restos mortais.
Sobre a campa, uma lápide
tem gravado o reconhecimento da Associação de Socorros Mútuos de Nossa Senhora da Assunção (fundada a 1 de Fevereiro de 1870) e da Associação Humanitária Recreativa Cascaense, associações a cuja criação o Padre Loureiro deu também grande apoio.

Eco-cabana
Está agora aberta durante a semana – e não apenas ao fim-de-semana – a eco-cabana sita perto da entrada do Parque Marechal Carmona.
Um hino à biodiversidade; um louvor da cortiça como produto natural de múltiplas aplicações e a reciclar; um convite a que se usufrua, a pé, o Parque Natural Sintra-Cascais, com sugestões de percursos.
Iniciativa de interesse, inaugurada a 17 de Fevereiro de 2009, na sequência de o seu projecto ter vencido o concurso “Prémio Ideias Verdes Água de Luso – Expresso 2007”. Trata-se, no fundo, como se pôde ler na informação veiculada quando abriu, de «um modelo de habitação com reduzida pegada ecológica, modular, construída com materiais reciclados ou recicláveis, e pode ser usada como qualquer edifício convencional; funciona com recurso a energias alternativas e tem gestão própria de consumo eléctrico e de água a partir de um dispositivo electrónico».
Diante da eco-cabana, há mesmo um posto de abastecimento de energia para veículos eléctricos.
Vale a pena, pois, dar lá uma saltada com as crianças, antes dos momentos maiores de distensão no parque anexo.

Jogos tradicionais
E já que se fala do Parque Marechal Carmona, insista-se no facto de haver ali espaços para a prática de jogos tradicionais.
Houve, como se noticiou, nos dias 21 e 22 de Maio, o 4º Encontro Nacional de Jogos Tradicionais, nacionais e internacionais. Ali se jogou à malha, ao burro, à macaca… Mas há tabuleiros para damas e xadrez; terreno para a laranjinha ou a petanca… Nada falta! Ou melhor, falta aliciar elementos da chamada “terceira idade” para irem lá aproveitar.



A Escrita a Postos, de Júlio Conrado
Com organização e prólogo de Floriano Martins, ilustrações de Carola Trimano, foi já o ano passado (2010) editado em S. Paulo (Escrituras Editora, ISBN: 978-85-7531-391-6) o livro A Escrita a Postos, de Júlio Conrado.
Recolhe a novela Era a Revolução (1977); a peça de teatro Corno de Oiro (2009); e uma selecção de ensaios publicados em Ao Sabor da Escrita (2001) e Nos Enredos da Crítica (2006).
Trata-se, como o próprio autor confessa, da «primeira incursão a sério em Terras de Vera Cruz» e muito folgamos com isso, pelo que significa de reforço da sua internacionalização (recorde-se, por exemplo, que Era a Revolução teve tradução francesa) e, além disso, pelas portas que assim se abrem para maior convívio entre os autores portugueses e brasileiros, independentemente de escreverem, ou não, segundo o novo acordo ortográfico!...

Publicado em Jornal de Cascais, nº 271, 15-06-2011, p. 6.

«É meu!»

É bem provável que a globalização em que estamos embrulhados e os distúrbios que ela provocou voltem a exigir um olhar mais atento para a nossa realidade circunvizinha, num retorno às boas tradições que fizeram o saudável quotidiano de nossos avós.
Queiramos ou não, as medidas políticas que tardam (e sempre tardarão!) serão teóricas de mais para que se concretize o apregoado regresso ao campo, fonte, afinal, da nossa verdadeira riqueza e auto-sustento.
Não me admiraria, portanto, que voltasse a figura do pastor que leva ao pasto ovelhas e cabras de vários vizinhos, distinguindo-se os animais por uma marca, ainda que eles saibam melhor que ninguém o caminho do seu aprisco. Não me admiraria que voltassem a funcionar os fornos comunitários, em que se ajuntavam numa fornada os pães tendidos pela Ti Maria e pela Ti Jòquina e pela Ti Getrudes – e cada uma punha sinal para indicar «daqui para ali, os pães são meus!».
O mesmo acontecia, em tempo de Romanos, em relação às fornadas de material cerâmico. Decerto também as de pão, mas nada ficou para no-lo provar, enquanto que de telhas e tijolos há grafitos marcados na massa por secar.

Encontramo-los por toda a parte, ainda que só recentemente se tenha consciencializado que a palavra CAMPANI, por exemplo, significava não que aquela telha fosse “de Campano”, o fabricante ou o destinatário dela, mas sim que essa telha, com esse grafito, marcava o começo do lote que fora encomendado por um senhor com esse nome.
Compreende-se a importância histórica que essa informação detém:
1º) Fica-se a saber que, no local donde essa telha proveio, existia um forno cerâmico (pelo menos, um) e, por conseguinte, haveria barreiros bons por perto (informação de teor económico).
2º) A etimologia do nome (neste exemplo, latina) ajudava a saber que gentes habitavam por ali (informação de teor sociocultural).
3º) Se se fabricavam telhas, era porque se necessitava delas para cobrir habitações – e haveria um aglomerado populacional por perto ali (informação de teor urbanístico).

Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 572, 15-06-2011, p. 13.

Centenário de S. Brás de Alportel

Passarão cem anos, em 2014, sobre a elevação de São Brás de Alportel à categoria de concelho. Quis o Executivo Municipal nomear-me para presidir à comissão encarregada de levar a cabo as iniciativas que integrarão essas comemorações. A apresentação foi feita na sessão solene do passado dia 1 de Junho, Dia do Município. Não me foi possível estar presente, mas preparei para aí serem ditas as palavras que se seguem:

Aceitei, com todo o gosto e muito orgulho, tão honroso convite que me foi endereçado pelo Senhor Vice-Presidente, Vítor Guerreiro, em nome do Executivo Municipal, para presidir à Comissão que irá ter a responsabilidade de organizar, em estreita colaboração com todas as forças vivas são-brasenses, as comemorações do centenário do nosso concelho.
Apesar de fisicamente ausente, não há dia nenhum em que eu não tenha notícias de S. Brás e que não sinta o pulsar cada vez mais forte e saudável de um Município que detém já, por mérito próprio, lugar de destaque no panorama dos municípios algarvios e, até, dos municípios portugueses.
Isso se procurará demonstrar! Ainda que nascido apenas há escassos cem anos, S. Brás soube, mormente nas últimas duas décadas, agarrar oportunidades, despertar consciências, acolher hospitaleiramente os que doutras paragens aqui decidiram fixar-se, apelar ao regresso dos são-brasenses que, há décadas, haviam debandado em busca de melhores condições.
Não se hesitou em aceitar o progresso no que ele significa de melhoria da qualidade de vida, mas soube-se também, por outro lado, manter e fazer renascer tradições, memórias, identidades!...
A Calçadinha funciona, pois, como símbolo desse saudável apego a uma História milenar, que não começou, não, apenas há cem anos, numa singularidade que tem muito mais que um século e que a vontade de um punhado de são-brasenses apenas quis realçar e reivindicar quando proclamou a sua independência em relação a Faro.
Tudo isso se procurará, pois, demonstrar nas comemorações. Ao som de acordeões, claro, que nisso somos mestres; mas também na cristalina pureza das nossas fontes aconchegadas; na riqueza enorme da nossa cortiça; no desfiar de lendas e cantilenas; na evocação dos vultos grandes da nossa História, os que por cá viveram e outros que souberam alevantar em franças e araganças e por esse País fora, nas mais honrosas funções e actividades, o nome de S. Brás – que Alportel foi, e é, «porta»! Porta de saída, sim; de passagem obrigatória, também. Queremos, com as comemorações, mostrar que é, sobretudo, porta de entrada para um rincão delicioso, onde – em pleno contacto com a Natureza, no total respeito pelo ambiente e pela biodiversidade – é bem agradável viver!

Publicado no jornal Noticias de S. Braz, nº 175, 20-06-201, p. 175.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Agarra o canteiro a pedra…

O momento mais importante é a boa colocação da pedra que em bruto lhe chegou às mãos. Já sabe o que dela vai sair: um peitoril, uma verga, uma soleira… Por isso, estuda-a bem, para saber por onde há-de começar.

Ajeita-a com um punhado de lascas (o chão está cheio delas); firma-a; senta-se no banco improvisado (um toro com pedaço de tábua velha pregado, coberta por farrapo de cotim ou pelo papel grosso do saco de cimento); mede de novo (é um metro amarelo, articulado, de madeira, com centímetros e polegadas); confronta o esboço que o patrão lhe entregou… Então, vamos lá começar!
De maceta em punho, desbasta-a nas arestas com o escacilhador (ou escacilhador), um escopro grosso. O desbaste na superfície é feito a ponteiro (esponteirar). O escopro alisará depois e chegará quase às medidas prefixadas. Amiúde, entra de seguida o bujardão, de 16 dentes (boca de 4 x 4), e logo a bujarda, com boca de 7 ou de 9, conforme se pretenda o ‘picado’, grosso ou fino. Nos seus 49 dentes, a bujarda empresta aquele toque rugoso que se preconiza para os elementos arquitectónicos. E o metro sempre por perto, porque as medidas se querem rigorosas.
No peitoril, o badame (escopro fino) vai servir para rasgar a ranhura de encosto do batente; a goiva arredondar-lhe-á o corte; o ferro de romã (assim chamado devido ao feitio da sua superfície de corte) será fundamental para abrir o buraco central de escoamento das águas.
Junto às arestas, o escopro ou o ferro de dentes (gorjeta de dentes) alindarão o conjunto, uma espécie de nastro a sublinhar obra de arte…

Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel], nº 149 (Junho 2011), p. 10.

Ilustração
Instantâneo - em 9 de Novembro de 2006 - de dois canteiros em pedreira já semi-abandonada na Pampilheira (Cascais), que fazem cascões, essas lajes toscas que servem para pavimentar jardins ou aplicar em muretes rústicos.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Andarilhanças 4

Mário de Menezes (24.12.1932 – 30-05-2011)
Faleceu, no passado dia 30, o Arqº Mário Braz António Santana de Menezes, natural de Goa, que exerceu, durante praticamente toda a sua vida (1960-2002), funções de técnico na Câmara Municipal de Cascais.
Dotado de um grande espírito de serviço (obteve, por exemplo, o mais alto galardão do Lionismo Internacional, a placa «Melvin Jones 5 diamantes»), apoiou e até esteve na origem de muitas colectividades e associações de benemerência do concelho de Cascais.
A sua biografia consta do livro Personalidades da Costa de Estoril, I vol., Cascais, 1995, p. 411-420, onde se realçam a sua «inteligência, modéstia e timidez» e se escreve, a propósito da sua larga acção benemerente:
«Esta acção, muito pouco conhecida, pela forma discreta como é praticada, revela uma intensa sensibilidade e a preocupação permanente com os problemas do seu semelhante».
Além da sua ampla actividade camarária – era, seguramente, um dos técnicos que melhor conhecia os meandros urbanísticos do concelho – não esqueceu o facto de ter vivido também em Moçambique, tendo-se empenhado em prol da paz entre as partes em conflito.

A 5 de Outubro de 1992, teve do Papa João Paulo II, por quem foi recebido, uma bênção particular, por ocasião da assinatura do tratado de paz, em Roma, referente a Moçambique.
Amigo do seu amigo, capaz de despir a camisa para a dar a quem dela precisasse, Mário de Menezes nunca se pôs em bicos de pés... Também por isso, a nossa homenagem e uma prece pelo seu eterno descanso. E um abraço de sentidos pêsames à família.

Faça-se o desenho!
Costuma dizer-se que com um ‘boneco’ se aprende melhor. Sempre me habituei a ir escrevinhando no quadro quando leccionava...


Aí vai, pois, o boneco, que é como quem diz a tal placa a indicar que a Trav. Fernão Lopes, na Pampilheira, frente à Clínica CUF Cascais, é um beco sem saída. Não é. Pode entrar-se nela pelo Bairro Operário – e sair também, quando se vem da rua com o mesmo nome. Agora, até alcatroaram tudo!...

O final da A5
De vez em quando, voltamos a malhar em ferro frio e perguntamos se os políticos não têm vergonha por não conseguirem dar a forma definitiva ao final da A5. Silêncio é a resposta que se recebe. Os utentes vociferam todos os dias; há quem já fizesse feitiço para que os responsáveis sejam inexoravelmente atacados de bexigas loucas. O feitiço… falhou!

Auto-estrada
Já agora, que estamos em maré de auto-estrada (e é, de facto, um consolo e um privilégio, por exemplo, apanhar duas auto-estradas para ir de Cascais ocidental para o Cascaishopping!...), informe-se que há um erro amiúde cometido: apanham-se, de facto, duas auto-estradas e não dois auto-estradas. A concordância em género faz-se com o segundo elemento.

Publicado em Jornal de Cascais, nº 270, 08-06-2011, p. 6.

Andarilhanças 3

Parque no Bairro dos Pescadores
A partir do momento em que o hospital se transferiu para o Cabreiro, deixou de ter rendibilidade mínima de funcionamento o parque de estacionamento do Bairro dos Pescadores. Encerrou.
Aliás, tal aproveitamento daquele espaço de 3500 m2 constituiu uma forma de a empresa, ligada ao Hotel Baía, obter daí algum rendimento, enquanto as ‘burocracias’ camarárias se não empenhassem a estudar a sério a melhor forma de, a benefício de todos, o terreno com oliveiras e não passível de ser agricultado, outro uso pudesse ter. O projecto existe, mas… não passa da cepa torta!
Dava-nos imenso jeito aquele parque, a preços convidativos e com localização excelente para quem, vindo da zona norte, detestasse meter-se na emaranhada confusão do centro da vila. Compreende-se, porém, que só para os dias de praça… não dá!

Forno crematório
Ganha cada vez mais adeptos a opção da cremação - na sequência, aliás, de prática bem divulgada entre os Romanos e outras civilizações - mormente a partir do momento em que deixar de haver para tal objecções de teor religioso.
Mas também nisto Cascais parece querer ir na cauda do pelotão. Sintra tem forno crematório, em Rio de Mouro; Oeiras já anunciou para muito breve o início da construção do seu. Propôs-se, há já alguns anos, um para Alcabideche; mas embrulharam-se os políticos e ficou tudo em águas de bacalhau. Pelos vistos, nem para nós somos capazes de ser bons!

Promessas eleitorais
Acho imensa piada ao livro Psicologia das Multidões, de Gustave Le Bon (editado entre nós por Publicações Europa-América na Colecção Livros de Bolso, nº 365, em 1983, com tradução de Isabel Braga.
Transcrevo uma passagem do capítulo sobre as multidões eleitorais (publicado, atente-se!...) em… 1895!
«O eleitor gosta que os seus anseios e vaidades sejam lisonjeados; o candidato deve bajulá-lo e fazer-lhe as promessas mais fantásticas. Se fala para operários, as injúrias aos patrões nunca são de mais. Quanto ao candidato contrário, há que esmagá-lo, decretando pela afirmação, repetição e contágio ele é o maior dos malandros e que ninguém ignora que cometeu vários crimes. Se o adversário conhece mal a psicologia das multidões, tentará justificar-se utilizando argumentos, em vez de responder às afirmações caluniosas com outras afirmações igualmente caluniosas; a partir desse momento, não terá qualquer hipótese de triunfar» (p. 108-109).

Antigos Alunos Salesianos
Vai celebrar-se, na Casa D. Bosco, na Amoreira, o 59º Dia Nacional dos Antigos Alunos Salesianos. A 18 de Junho, com um programa que inclui, além da apresentação das actividades, o almoço de confraternização e um passeio pela orla marítima.
Cascais é, como se sabe, pelo número de antigos alunos que tem, um dos concelhos mais ‘salesianos’ de Portugal.
Contactos: tel. 214 662 270; e-mail: geral@aaase.pt

Publicado em Jornal de Cascais, nº 269, 01-06-2011, p. 6.

domingo, 5 de junho de 2011

Penhas do Marmeleiro - Um sítio de excelência com página no Facebook

Criada, há um ano, por Luís Filipe, antigo aluno salesiano do Estoril, essa página – http://www.facebook.com/home.php#!/group.php?gid=112985108738014 – tem hoje 631 membros e visa incitar a população cascalense – e não só! – a que vá «descobrir este Paraíso perdido em Cascais»!
Parece, porém, que este «aproveitamento ideal do espaço», nascido para «recuperar a área degradada em zona limite do Parque Natural de Sintra-Cascais (PNSC)» necessita de alguma atenção mais!


A razão do nome
Chama-se de «penhas», porque, na verdade, a vista se alarga e se demora no caprichoso recorte e alinhamento das formações calcárias que vigiam do alto das quebradas o Rio Marmeleiro, lá ao fundo, nome que tem, ali, o curso de água que, mais abaixo, se designará Ribeira das Vinhas.
«Do Marmeleiro», porque, decerto, essa era a árvore mais comum nas margens da ribeira. Mais uma vez, erraram os técnicos camarários ou os projectistas, ao chamar-lhe «de Marmeleira», porque não souberam colher informação onde deviam. Acontecera o mesmo com o Centro de Interpretação Ambiental da Pedra do Sal, a que primeiro chamaram de ‘Ponta do Sal’ e foi precisa uma duradoura luta do Núcleo de Amigos de S. Pedro do Estoril para que emendassem a mão. Aconteceu o mesmo no Parque Urbano do Rio dos Mochos, a que chamaram de «Ribeira dos Mochos», quando a designação popular (ainda que tecnicamente incorrecta, mas em questões de toponímia – como noutras… – o Povo tem sempre razão!) é Rio dos Mochos e esperamos que venha a ser corrigido.
De facto, uma leitura atenta do livro Monografia de Cascais, de Ferreira de Andrade (CMC, 1969), teria sido útil, pois que, na pág. 273, se transcrevem as respostas dadas pelo prior de Alcabideche, Fortunato Lopes de Oliveira, ao inquérito lançado pelo Marquês de Pombal, onde se fala do ribeiro e da povoação:
«Marmeleiro é um ribeiro, que consta de quatro azenhas de trigo e um lagar de azeite. Seca-se de Verão. Vem de outro ribeiro, a que chamam de Porto Covo […]. Tem homens oito e sete mulheres».

O que é o parque
Na página do FB se dão logo algumas luzes aliciantes para uma visita.
Inaugurado oficialmente a 5 de Setembro de 2009, por iniciativa da Câmara Municipal com o apoio da SANEST, situa-se em Murches, na sua ponta mais oriental. Não tem nada que enganar: é entrar em Murches e, depois da capelinha de Santa Iria, seguir em direcção ao nascer do Sol até à encosta sobranceira às colinas que dali se estendem para os lados do Zambujeiro, do Pisão, do Cabreiro, de Carrascal de Alvide…
Adregará dar-nos as boas-vindas o galo do vizinho, a introduzir-nos num outro mundo! Deste anfiteatro natural, um panorama deslumbrante, com o Cabo Espichel ao fundo e, mais perto, o variegado manto rasteiro da vegetação, pleno de colorido nesta época de Primavera.
Saúdam-nos à entrada (deviam saudar-nos…) seis bicas, quatro a correr para o espelho de água norte e duas para o meridional. Um toque de frescura inicial.
Depois, um pavilhão aberto, de estruturas metálicas (agora oxidadas) com quatro ilustrados painéis explicativos. Trata o 1º do que é o Parque Natural (História, Património Arquitectónico). O 2º destruíram-no e ainda não voltou recuperado da maldade. Refere-se o 3º ao Património Natural de que se pode usufruir a partir dali: os habitats, os animais – os anfíbios, a raposa, a bufo-real, o musaranho-de-dentes-vermelhos, o tritão-de-ventre-laranja… – a flora e o seu valor. Apontam-se, no 4º, as sugestões de actividades de natureza a praticar, desde os passeios pedestres à observação de aves.
Resultou este Centro Interpretativo da colaboração entre o PNSC, a CMC, o Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, a Cascais Natura e a Sanest.
Uma encosta artificial plantada de rosmaninho, alecrim, medronheiros… abriga a escadaria que dá acesso à plataforma inferior, do parque infantil com os habituais aparelhos de balancé e um recinto em jeito de forte apache, com escadas, passadiço, amuradas, postigos…
Para norte, ajustado trajecto de escadarias de madeira convida a um percurso em íntima comunhão com o mato, na observação cuidada e pormenorizada daquela vegetação misto de mediterrânica e atlântica, um verdadeiro hino à biodiversidade, tantas são as variedades de pequenas plantas e inesperadas flores que por ali vamos encontrar… A riqueza do carrascal casada com o cinzento dos afloramentos calcários, salpicada pela magnificência amarela das umbrelas dos funchos, subtilmente ornada pelo morrião-azul ou pela discreta brancura do sargaço… Maravilha!

O necessário ressurgir
Visitei de novo Penhas do Marmeleiro no passado dia 5 de Maio. E fiquei triste com o que vi.
Ainda que a encosta recém-roçada de ervas incómodas me desse sinal de que por ali passara alguém responsável pela manutenção, o certo é que queimaram o forte apache e um letreiro assinado com os logótipos da CMC e da EMAC informa que está «proibida a entrada», pois o conjunto se encontra “em requalificação»; agradece-se a «compreenção» [sic] e acrescenta-se promessa de «ser breves». Pelo estado em que a tabuleta se apresenta, já lá se encontrará há bastante tempo.
Para além disso – e apesar de eu ter chamado a atenção da EMAC para o assunto no passado Outono – ainda se não logrou pôr mãos à tarefa de conseguir a drenagem das águas pluviais, pelo que o campo do Parque Infantil está inoperacional, encharcado, e os aparelhos metidos em poças de água.
Se os bebedouros ainda funcionam mais ou menos, os espelhos de água da entrada não são seguramente um bom cartão de visita no estado em que ora se encontram, com três das bicas inactivas e os focos de iluminação estragados.

Uma visita… impõe-se!
As Penhas do Marmeleiro merecem, pois, uma visita. De todos e, de modo especial, da população escolar em jeito de visita de estudo.
Com um arranjo de arquitectura paisagístico deveras original – aqui e além moroiços de lioz de tonalidades várias com tufos de flores pelo meio, chão de gravilha junto ao Centro Interpretativo, o serpentear das escadarias… – é convite a um saborear de ar puro em plena intimidade com o que a Natureza ainda nos pode dar de mais bonito, numa larga extensão sem casario irritante…
Chega-nos o eco dum ladrado distante. Um melro assobia alegre, algures num pinheiro próximo. Um bando de pardais brinca em algazarra num telhado mais além. Até o viaduto da A5, os carros passam a espaços, não incomoda; e o mar, ao fundo, é convidativo também a mais meditação.

Publicado na revista Sekreta (Cascais), Abril 2011, p. 14 e 15 – ver em seguida a reprodução.


Ir à praça - um ritual que vai reviver

Ir à praça a Cascais, nas décadas de 60 e 70, era um dos rituais semanais a que os vizinhos não faltavam. Ia-se comprar legumes, peixe e até carne; à quinta (nessa altura, era à quinta), tinha-se a feira onde se comprava de tudo. Todavia, a ida não era apenas por questões de mercancia: a praça era ponto de encontro, onde se sabiam as novidades, num mundo – apesar de tudo – ainda muito pequeno, em que quase todos se conheciam.

Era o mercado saloio. A freguesia de Cascais não conhecera o surto urbanístico que viria a ocupar os muitos terrenos de cultivo, nomeadamente hortas nos vales irrigados, por exemplo, pelo Rio dos Mochos. Couves, nabos, cenouras, árvores de fruto e flores, muitas rosas… faziam parte integrante de uma paisagem, em que o rio, transbordando no Inverno, generosamente a fecundava.
Aos saloios de Birre, Torre, Areia e Cobre se juntavam, naturalmente, os da Malveira da Serra e de Almoçageme, numa época (explicite-se) em que essa era a única praça existente.
Acompanhei minha mãe muitas vezes. Cheguei mesmo a ir com ela ao que funcionou no local onde mais tarde se fez o Pavilhão do Dramático e os feirantes se aninhavam junto ao muro da Parada… Mas aquele de que mais me lembro é o da Ribeira das Vinhas.
E aí encontrava minha mãe as amigas. Iam e vinham nas mesmas camionetes (como se dizia) – e os responsáveis da Palhinha sabiam bem que, nesses dias, haviam de fazer desdobramentos quer de manhã cedo quer a partir das onze horas. Comprava as batatas sempre à mesma senhora, creio de Almoçageme, conhecida de longa data; a carne no talho de sempre (o dono já sabia bem de que é que ela gostava); os alhos num vendedor, as laranjas noutro… Enfim, dava a volta à praça toda e perguntava pelos preços (não estavam nunca marcados, não havia esse hábito) e regateava, naquele jeito de algarvia com costela de moira, sempre pronta a não ficar na mó de baixo…
Um mar de gente – o rico e o pobre, a senhora e a criada, o forasteiro e o cascalense…

O peixe
O peixe merece lugar à parte.
Era sobretudo ao sábado que mais se pensava nele. E também na ‘praça do peixe’ havia varinas preferidas: para o berbigão, a caldeirada, o patarroxa (para a sopa de cação), a sardinha, a sarda…
Dizia-se, há pouco, da Palhinha. Nessa altura, as varinas que, durante a semana, demandavam os lugares rurais serviam-se da carreira para lá levarem a canastra. Era a «menina Sara» que fazia o giro da Torre e Birre; a Carolina que depois passou a ir para a Malveira (salvo o erro)... Carreiras havia a da Torre, uma das primeiras que se criou para os arredores da vila, após a construção do «bairro», que, na década de 60, trouxe para ali muita gente e a abertura do prolongamento da Rua Joaquim Nunes Ereira desde o vale do Rio dos Mochos até à Torre, porque, antes, nós íamos por atalhos matos fora. E havia a do Guincho, mais rara, mas a única que servia Birre e Areia.
Peixe tinha-se sempre de comprar na praça e a garantia de ser fresquinho sabia-se, porque a lota no-la dava. (Hoje, as vendedeiras queixam-se, porque o projectista se esqueceu de… ir ver como era e calculou mal a altura das bancadas… Acontece – a quem cria em gabinete fechado!...).

As cheias
Foi o mercado novo, nesta sua configuração circular, inaugurado em 1952.
Não havia, nessa altura, a forte consciência que hoje se tem da preservação do meio ambiente, da necessidade de não ocupar o leito de cheia, porque… não se ocupava, pronto! Não era preciso e as pessoas ainda ouviam a voz da razão e a dos antepassados. Vozes que se reergueram contra a localização numa baixa, nomeadamente por se ter encanado ainda mais a Ribeira das Vinhas. Na verdade, não haveria grande problema se se mantivessem permeáveis os solos a montante…
Tal não viria a acontecer e as cheias de Novembro de 1983 mostraram que a opção não fora, de facto, a melhor.

A nova face do mercado

Em Dezembro de 2005, atendendo a que importava renovar estruturas, a Câmara lança, para esse efeito, um concurso público de ideias, a nível internacional, com vista a obter propostas para a requalificação do mercado e sua zona envolvente, de forma a se proceder, assim, «à sua valorização e animação, numa perspectiva turística e cultural».
Refere-se – e muito bem – a «perspectiva turística», porque, na verdade, em todos os desdobráveis da assassinada Junta de Turismo da Costa do Estoril o mercado saloio era apresentado como um dos ex-libris da vila.
A 28 de Junho de 2006, dava a Câmara a conhecer os resultados desse concurso, destinado (repetia-se) a revitalizar «uma área nobre do centro histórico da vila, cuja reconversão tem um forte potencial». Declarando que «os critérios de avaliação dos projectos assentaram em factores como a qualidade, a complementaridade face aos objectivos indicados e a exequibilidade da proposta», o resultado do concurso, homologado em 30 de Maio de 2006, colocou em 1º lugar Marco Neri; em 2º, a empresa Arkibyo – Arquitectura e Urbanismo, Lda; e, em 3º, Bernardo Almeida Lopes. Em Setembro, fez-se no edifício do antigo quartel dos bombeiros a exposição do projecto ganhador – e aí se fala também em «Parque Urbano da Ribeira das Vinhas»!…
Em finais de Abril de 2009, já o mercado se apresenta «de cara lavada» – para usarmos a expressão de um dos periódicos locais – com nova pintura, novo pavimento e, sobretudo, embelezado com grande painel de azulejos encomendado à Cerâmica de Bicesse.
São esses azulejos – concebidos por Teresa Posser de Andrade, que os pintou juntamente com Susana Bretes e Carlos Ramiro – que hoje podem constituir também um dos motivos de superior encanto do mercado, ainda que, na verdade, se nos afigure que poderiam ser mais publicitados.
Há, na sua concepção, um misto de ingenuidade e de cor local, pois não se objectivou ser rigoroso do ponto de vista histórico ao conceber as cenas e os edifícios aí representados: por exemplo, o vendedor de castanhas está numa esquina do edifício dos Paços do Concelho, mas vêem-se, do lado esquerdo (e devia ser por detrás), os edifícios sobranceiros à ‘muralha’ da Praia dos Pescadores. Mas há cor local: o palácio dos Condes de Castro Guimarães; o farol de Santa Marta e a Casa de Santa Maria; a Praça 5 de Outubro; uma panorâmica idealizada da vila, porventura a partir da Rua Marques Leal Pancada. E a leiteira, o vendedor de perus, o saloio da Malveira e o seu burrico e os moinhos de vento de velas enfunadas nas colinas…
Se o ritual da ida à praça vai reviver? Claro que vai! Os tempos que correm suscitam cada vez mais esse retorno à compra e venda directamente ao produtor. E as hortas vão renascer!

Publicado na revista Sekreta (Cascais), Janeiro 2011, p. 8-9 [ver reprodução a seguir]


quarta-feira, 1 de junho de 2011

Escrever nos cacos, antes de o serem!...

Até não há muito tempo, numa escavação, os arqueólogos recolhiam apenas os cacos mais significativos, nomeadamente aqueles que, pelo seu recorte, ainda poderiam – mediante cuidada reconstituição – vir a dar uma ideia da forma original. Analisava-se essa forma, que meticulosamente se comparava com outras conhecidas; fazia-se um exame da pasta, com vista a determinar possível origem quer da oficina quer do barreiro donde a matéria-prima proviera. Estranha actividade, esta, de facto, que se preocupa com os cacos que sobraram do vasilhame partido há já milénios atrás!...
É que esses cacos permitem observações de vida quotidiana; dão azo, inclusive, a razoáveis conjecturas sobre correntes comerciais…
Assim, na asa de uma ânfora, no fundo de um pratinho ou de uma lucerna… vê-se, por vezes, cartela resultante de impressão com uma espécie de sinete. Exacto: é a marca do oleiro! Não em cerâmica comum, de todos os dias, que essa não trazia dividendos sociais ou económicos e não carecia, pois, de publicidade veiculada por meio de assinatura; mas a cerâmica mais fina, de ir à mesa só de quando em vez, porque não?
Tal como hoje, em dia de particular relevância na família, decidimos ir ao armário da sala e fazer uso do ‘serviço’, aquele que já vem de nossos pais ou avós ou foi oferta de casamento, também em tempo de Romanos havia loiça especial para dias especiais!
E com essas marcas se deliciam os arqueólogos, na sua decifração, na comparação com outras achadas aqui e além! Geralmente rectangulares, podem ostentar a fórmula EX OF, que significa EX OF(icina), «da oficina», seguida do nome do proprietário em siglas ou pelo nome com que era habitualmente identificado.
Outras vezes, essa primeira parte subentende-se e fica apenas a identificação, nem sempre passível de uma interpretação única, porque… estamos fora do contexto e, sem contexto, torna-se difícil saber ao certo o nome que ali se pretendeu perpetuar.

Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 571, 01-06-2011, p. 13.