sábado, 25 de janeiro de 2014

A comunicação autárquica foi, em Oeiras, um caso de sucesso?

            Está prevista para o próximo dia 1 de Fevereiro (sábado), pelas 16.30h, no auditório do Centro Social das Forças Armadas (CASO) [Rua D. Duarte nº 2, em Oeiras] a apresentação, pelo Dr. José Miguel Júdice, do livro Sobre Oeiras – Comunicação e caso de sucesso?, da autoria de Luís Macedo e Sousa.
A obra, que se apresenta como «um contributo para a história do concelho através de um testemunho singular e vivido, dos anos de apogeu da Câmara Municipal de Oeiras», sê-lo-á, sem dúvida, se atendermos a que esteve Macedo e Sousa durante vários anos à frente do departamento que tinha a seu cargo, na Câmara, as relações públicas e a comunicação. Aliás, a sua actividade neste domínio revelou-se da maior eficácia, ainda se tendo ensaiado modelos que viriam a constituir exemplos paradigmáticos neste domínio fulcral da boa gestão camarária.
Não é este o primeiro – nem será, certamente, o último – livro que Luís Macedo e Sousa dedica à actividade autárquica. Recorde-se que, a 22 de Maio do ano passado, António Capucho apresentou outro livro seu: Liderar na Comunicação Autárquica – Pensar & Agir.
Temos, pois, a certeza de que alcançará o maior êxito – e é o que lhe auguramos.

Publicado em Cyberjornal, edição de 24-01-2014:

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

«E não é a política que os manda calar!»

            «Agora é um momento de crise em toda a parte. Mas, se – Deus quiser, hão-de surgir coisas boas, com certeza. Artistas há sempre! E não é a política que os manda calar!».
            Foi esta frase, de Olga Maria Nicolis di Robilant Álvares Pereira de Melo, Marquesa de Cadaval, que diante de nós ficou projectada durante todo o concerto com que Olga Prats, sua afilhada, nos presenteou.
            Foi na noite de sexta-feira, 17 de Janeiro, no Centro Cultural Olga Cadaval, em Sintra, no âmbito da comemoração do nascimento da Marquesa de Cadaval (17.01.1900 – 21.12.1996).
            Assistimos primeiro à projecção, em antestreia, do documentário, realizado por João Santa-Clara, intitulado «Marquesa de Cadaval – Vida de Cultura». Mário João Machado, também ele responsável pela produção do filme, deu as boas-vindas aos convidados e salientou a enorme importância que Olga Cadaval deteve não apenas para a vila de Sintra e no âmbito meramente musical (esteve intrinsecamente ligada, como se sabe, aos festivais de música de Sintra) mas também para a Cultura em geral, no nosso País. Revemos na Senhora Marquesa a «genuína cidadã europeia, cuja vida foi síntese feliz da riquíssima herança dos saberes recebidos e da prodigalização de atitudes culturais em que deixou marcas do mais sofisticado gosto e sensibilidade».
            Deliciou-nos o documentário, porque – tal como é apresentado no programa – nele ouvimos «figuras da cultura portuguesa e internacional, de familiares e amigos que, em conversa informal, […] testemunham como o seu contacto com Dona Olga foi importante não só para elas próprias como para tantos artistas, músicos do mais alto gabarito, a nível mundial, que beneficiaram do seu apoio e de um mecenato exemplarmente desinteressado».
            Uma senhora que privou com literatos como Gabriele d’Annunzio ou Marinetti (o homem do futurismo); com Eugénio Pacelli (o futuro Papa Pio XII); com músicos como Cole Porter, Ravel, Stravinski, Rubinstein; com cientistas, como Marconi; com pré-historiadores, como Henri Breuil…
            Fascina-nos, de facto, esta «grande senhora que soube enriquecer a cultura do tempo que lhe coube», «uma personalidade que importa conhecer cada vez melhor e mais profundamente».
            E o serão culminou com o virtuosismo de Olga Prats – que da Marquesa teve nome, porque seu pai «dedicou mais de 40 anos da sua vida a um dos mais aristocráticos e tradicionais nomes da nobreza portuguesa», escreveu no programa. E as peças que executou foram todas elas precedidas de uma explicação, pois estavam umbilicalmente ligadas a momentos da vida das duas Olgas, a pianista e a sua benemérita ‘madrinha’, que inclusive comparticipou na compra do seu piano de estimação. Começou (e viria a terminar) com o tema «Dolor», da autoria de António Donosti, interpretando, de seguida, «Gavotta 1 e 2» de Bach, «Zamba» do sevilhano Joaquín Turina e «Jeunes Filles au Jardin» do compositor catalão Frederico Mompou (o pai de Olga Prats era de origem catalã e a pianista passou larga temporada em Barcelona, com uma bolsa).
            Permita-se-me uma breve nota pessoal. O Centro Cultural Olga Cadaval lembra-me sempre o ‘vizinho’ Cine-Teatro Carlos Manuel, onde tive o privilégio de assistir – vindo da Quinta do Vinagre, onde passei férias, por exemplo, no Verão de 1962 – a vários concertos do Festival de Sintra, que dava então os primeiros passos, justamente com o apoio da Senhora Marquesa, guindando-se, já então, ao primeiro plano das iniciativas musicais do nosso País. Foi, sem dúvida, o eco desses tempos idos que a mim me envolveu e que, nessa noite de 17 de Janeiro, acabou também por envolver a grande maioria dos assistentes, pois, de uma forma ou doutra, terão sentido bem vivo o carisma enorme de uma personalidade ímpar e forte, que, na verdade, importa não esquecer!

Publicado em Cyberjornal, 24-01-2014:

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Na prateleira - 15

Agenda cultural digital
            Ficámos a saber, por informação que gentilmente recebemos da Senhora Vereadora, que a Agenda Cultural de Cascais (de há uns tempos para cá também já não designada de Cultural) irá passar a ser «apresentada de uma forma mais interactiva, deixando de ser produzida a tradicional versão impressa». Quem quiser recebê-la no seu computador (se mantiver posses para o ter, claro!), deverá inscrever-se na página do Município. Acrescentou a Senhora Vereadora que, assim, vai «chegar mais longe, utilizando menos recursos». Economizar recursos, na presunção de que, dessa forma, vai chegar mais longe. E promete oferecer-nos também mais uma… newsletter!
            Obviamente, já escrevi à Senhora Vereadora, a manifestar, primeiro, a minha surpresa por verificar que também a Câmara de Cascais, tão portuguesinha que se preza, vai passar a utilizar terminologia estrangeira, atirando às urtigas a língua portuguesa. Mas… moda é moda e não há que reclamar!
            Também manifestei a minha inteira discordância em relação à opção! Primeiro, porque é utopia (generalizada pelos governos economicistas europeus, que, no entanto, já começaram a sentir que deram com os burrinhos na água…) pensar que toda a gente tem acesso à Internet, nomeadamente agora que a classe média já é praticamente inexistente; depois, e este é para mim o aspecto mais importante, porque, tal como foi concebida, a Agenda Cultural de Cascais tem rubricas do maior interesse! Não se limita a ser uma agenda! Dá conhecimento de monumentos, de património, da história… Dir-me-á, escrevi eu à Senhora Vereadora, que isso continuará. Acredito! Mas… onde se guardará? Como se fará para consultar depois? Tenho-me batido insistentemente para que o Município de Cascais volte a editar o Arquivo de Cascais, pensado como repositório de uma série de estudos sobre os mais diversos aspectos da vida cascalense. Meus apelos têm caído em saco roto. Salvava-se, porém, a Agenda, cujos responsáveis cedo compreenderam a importância de manter a memória de facto e não apenas nas bonitas palavras e em murais.
            E dei o exemplo doutros concelhos, em que, de um modo geral, a opção foi a seguinte: apesar de a agenda cultural estar inteirinha na página da Câmara, em versão digital, manteve-se a edição em papel para todos aqueles munícipes que fizeram questão em a coleccionar.
            Eu coleccionei até agora a de Cascais e tenho-a mostrado, orgulhoso, aos meus estudantes do Mestrado em Política Cultural Autárquica.

O Senhor Agente
            Dia 8 de Janeiro de 2014. Fui à dependência bancária (onde, por enquanto, ainda me depositam a pensão), a fim de desejar bom ano à minha gestora de conta dedicada. À saída, verifiquei que o dia começara com sorte e com azar. Com sorte para o agente da polícia que, ao passar, viu um carro estacionado em cima do passeio com os quatro piscas ligados. Claro: parou a viatura, sacou dos bloqueadores, sacou da fita que enrolou em torno do carrito que, choramingando, continuava a piscar. Teve sorte o Senhor Agente em ter passado ali àquela hora. Cinco minutinhos depois, já não teria hipótese de apresentar serviço na esquadra e juntar mais uma multa ao seu rol. Teve grande azar o condutor. E eu imaginei, até, que o azar pudesse ter sido duplo: largou o carro ali, numa pressa, para ir à farmácia em frente buscar medicamento urgente para a doente que, em casa, dele precisava; achou que, não estando a viatura a estorvar ninguém, sinalizando-a com os quatro piscas como que a dizer «Senhor Agente, eu volto já, tenha paciência e compaixão!», o possível agente teria paciência, teria compaixão... Não teve! O Estado paga-lhe para ele arrecadar o máximo de dinheiro que puder e ele… tem de cumprir! Tive pena: do agente e do condutor. Se calhar, ainda mais do agente, porque poderia ter optado por uma atitude de pedagogia, esperar um bocadinho, tentar ver quem era o condutor, repreendê-lo, saber o que se passava… Mas, coitado, isso de pedagogia, embora apregoada por todas as entidades, não chega aos que, no dia-a-dia, só sabem agir. Autómatos! Tive pena do condutor, porque, se estava com urgência, agora tinha de telefonar para a esquadra, tinha que esperar que houvesse disponibilidade de uma viatura vir até ao local – e isso de ‘disponibilidade’ é sempre muito complexo, eu sei, quando tento chamar alguma para vir aqui perto de casa onde estacionam a trouxe-mouxe e há engarrafamentos-monstros… os tais que incomodam mesmo!...
            Dei uma volta pelo paredão, a ver os estragos da invernia; mas a imagem do Senhor Agente só me saiu da cabeça, quando, já perto da hora do almoço, dei demorado abraço a uma amiga querida, que me informou: «Sabes? Vou ser submetida à sexta operação cirúrgica!». E disse-mo com um sorriso de esperança. Valeu!

Publicado em Costa do Sol – Jornal Regional dos Concelhos de Oeiras e Cascais, nº 29, 22-01-2014, p. 6.

 

 

Imagens captadas no passado dia 20, às 10.17 h, no entroncamento da movimentada R. Eça de Queirós, na Pampilheira, com a R. Fernão Lopes, que dá acesso à Clínica CUF Cascais e a uma série de oficinas de automóveis.É ocorrência assaz frequente no local: os veículos estacionados em infracção impedem as manobras das muitas viaturas longas (mormente a dos CTT).
Desta feita, a polícia veio dez minutos depois de ter sido informada.
                

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Palavras do quotidiano

             Sei que é fenómeno assaz estudado pelos especialistas: a partir de certa idade, vêm ao de cima as recordações de infância. E não só as recordações, também as palavras que eram, então, do quotidiano, e ora estão substituídas por novas, designadamente importadas de vocabulários estranhos.
            Aqui tenho arramalhetado eu algumas, mensalmente, às mijinhas. Perdoe-se-me o plebeísmo, não me dêem por isso nenhuma trolitada que me almareie e lá vou eu de reboleta, quiçá com forte pontada nas costas!...
            Algo, porém, que não pode acontecer aos velhos é deixarem-se amodorrar por isso, como se nada mais houvesse a fazer na vida que ficar para aí encafurnado ou encafuado em casa, num cafofo, a ver os segundos digitalmente a passar ou a ouvir o compassado tiquetaque daquele relógio de cavalinho que os filhos ainda lhes deixaram ficar sobre a cómoda…
            Ná! Isso é que não pode ser! Que velho tem sabedoria para esbanjar e as suas são «rugas de sabedoria»! Como eu gostei de saber que foi esse – «rugas de sabedoria» – o tema do XXI Encontro de Idosos da Zona Sul do Distrito de Setúbal, realizado em Santiago do Cacém, a 9 de Outubro do ano passado!
 
Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel] nº 180, Janeiro de 2014, p. 10.

sábado, 18 de janeiro de 2014

A casa comum

            Recorda-se, de quando em vez, que teve S. Brás palácio episcopal, residência de férias do bispo do Algarve. E dá a impressão de que seria esse o único edifício digno de conservação, caso tivesse havido tal cuidado.
            Hoje, porém, a noção de património edificado vai mais além dos palácios, dos templos ou das fortalezas. A própria casa de habitação – o que poderíamos chamar a «casa comum» – está a merecer a atenção devida Há-as, de resto, com alguma monumentalidade, herdeiras quase do monte alentejano – e por isso amiúde se lhes chama ‘monte’ também. É a casa de família, onde conviviam três gerações: os pais, os filhos e os netos. E onde havia a despensa, a grande cozinha (duas, por vezes), os quartos, a sala-de-jantar… E, para as actividades agropecuárias, a adega, o celeiro, o palheiro, a pocilga dos porcos, o galinheiro e a coelheira, o estábulo para os cavalos, os machos, os burros e, até, a cabrinha ou as duas ou três ovelhas...
            Na chaminé ou no lintel da porta principal se gravavam as iniciais do primeiro proprietário e a data da construção.
            Típicas, caiadinhas, essas nossas casas são-brasenses, quer as dos «montes», quer as da vila, onde o orgulho dos proprietários se revelava no apurado trabalho das cantarias, em que sempre fomos mestres.
            É por tudo isso que consta do programa das comemorações do nosso centenário a elaboração do inventário dessas casas comuns, motivo, também elas, do nosso orgulho são-brasense!

Publicado em Notícias de S. Braz, nº 206, 20-01-2014, p. 21.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

«Fui tratada como lixo»

             Penso que, aos poucos, ainda que não primem pela inteligência, os que, de um momento para o outro, se viram com poder nas mãos, sem para tal estarem preparados na universidade da vida, irão aprendendo o significado de algumas das expressões que os mais experientes repetem, repetem, repetem...
            Uma delas é a motivação, tantas vezes falada. Algo que aprendi logo no início da minha carreira como docente, já lá vão mais de 50 anos, quando nos explicavam que de nada valia dar uma linda lição se os estudantes não estivessem motivados para a escutar.
            Assim hoje com os trabalhadores. Está evidente aos olhos de todos – os que têm olhos para ver! Trabalhador que não se sente bem na sua pele não rende, não é feliz e a economia não cresce!
            Bem conhecida é a espécie de parábola que Gorbachev contou no seu livro Perestroika. Os dois operários faziam o mesmo serviço: acarretar pedra cá de baixo até ao cimo da obra. Um, de semblante sempre carregado, respondeu quando lhe perguntaram o que fazia: «Não vês? Carrego pedra o dia inteiro, escada abaixo escada acima, dói-me o corpo todo, à noite nem consigo dormir!». «E tu?» – perguntaram ao outro. Sorridente, respondeu: «Eu? Eu estou a construir uma catedral!».
            Aumento de horas de serviço, corte de salários, abolição de feriados, encurtamento de férias, contratos precários só fazem doer o corpo, não ajudam a construir a catedral!
            E fiquei ainda mais triste, outro dia, ao saber que tinham mandado embora a diligente funcionária da minha repartição. Enviei-lhe mensagem de agradecimento por tudo quanto fizera por nós. A resposta ainda mais me atiçou a revolta contra o paradigma em que, para sua desgraça, o mundo anda embarcado:
            «Obrigado pelo carinho. É assim a vida! Não tem que agradecer. Fiz sempre o meu trabalho o melhor que podia, muitas vezes cheguei a comprar produtos e sacos para o lixo, para minimizar um pouco as faltas! Vinte e um anos de serviço e, no final, fui tratada como lixo, deixada à porta da rua, sem qualquer explicação!!! Mas, deixando a ingratidão de parte, existem boas amizades que ficaram, e essas, sim, recordarei para sempre com muito carinho!».
            Doeu-me! Doeu-me muito!

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 631, 15-01-2014, p. 12.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Proeminências…

             – Olha, Maria, apareceu-me aqui um durão! Que achas que isto é? Se calhar, o melhor é ir ao médico, não te parece?
            Um durão: proeminência inusitada no corpo, intumescimento natural motivado por pancada (um ‘alto’ ou um ‘galo’, quando é na cabeça, à semelhança da crista do galináceo…) ou inesperada excrescência vinda de dentro resultante de inflamação.
            Não, não vêm ao caso as eminências, sobretudo não as «pardas» (que tantas há por aí!...). Essas carecem doutro tratamento, para que desçam ao nível donde nunca deviam ter saído e melhor entenderem os demais. Falemos, sim, de algo mais comezinho, do dia-a-dia.
            Assim, quando se ia à mercearia e se comprava uma rasa de milho:
            – Ó vizinho, ponha-me isso bem acagulado, a fazer camoiço!
            Pois era: mais uns grãozinhos poderiam vir pelo mesmo preço, se o merceeiro não apertasse a rasa (ou rasoira) para desfazer o cogulo…
            Claro, a palavra correcta é acogulado e, curiosamente, cogulo vem do latim: cucullus, que tem o significado de capa, capuz. Era o cogulo assim a modos daquilo que cobria, a parte de cima e, como ficava acumulado, mais pareceria um capuz.
            Já camoiço (também usado já como apelido) é, seguramente, uma corruptela popular de camouco, «crosta», «amontoado».
            De camoiços e cogulos gostamos quando nos beneficiam; já as eminências, se calhar, habitualmente dispensamo-las bem…
 
            Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel] nº 179, Dezembro de 2013, p. 10.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Os números deram-lhes a volta ao miolo!

             Deve ter sido. «Cérebros» bem adestrados em promissor brainstorming. Tem de escrever-se em inglês, para dar a ideia de enorme caldeirada de ideias, em reboliço – que storming significa isso mesmo: «assalto». E vem de storm, «temporal, tempestade, borrasca»! E brain é cérebro mesmo!
            E os tais «cérebros» interrogaram-se: que vai ser da investigação em Portugal e na Europa nos próximos anos? Que vai ser? Que dinheiro poderá cabimentar-se? Não se sabe? Pergunta-se!
            E, vai daí, os cérebros apresentaram o projecto. Sim, tinha que ser um «projecto»! Não podia ser «proposta», que isso soava a plenário de trabalhadores. Projecto é que era! E foi aprovado!
            E os senhores investigadores europeus, que são, afinal, uma catrefada deles, foram, pois, intimados a preencher um quadro, apresentado na língua de Sua Majestade Britânica, onde tiveram de assinalar o número de livros que pensavam escrever em cada ano, de 2015 a 2020 (!!!); o número de artigos em revistas nacionais ou internacionais, sobretudo se com referees… O referee é assim a modos de um fiscal que ajuíza se aquilo tem jeito ou não, se vai ao encontro do que ele pensa ou se preconiza ideias subversivas (onde é que eu já ouvi isto?...). E, sem conceituado painel de referees, a revista não tem cotação no mercado, pronto!... Ah! E o número de congressos, com ou sem comunicação; o número de capítulos de livros; o número de conferências (no País e no estrangeiro), etc. Tudo bem escarrapachadinho, senhores! De 2015 a 2020, entenderam? Se não, não há dinheirinho!...
            «Daqui a sete anos!», disse para os meus botões. E lembrei-me de súbitos tornados; de cheias imprevisíveis; dos jogadores que assinam contratos por três épocas e caem por junto, de colapso fulminante; do carácter provisório em que, dia a dia, cada vez mais se nos vai a vida… Que faço daqui a sete anos? Sei lá eu o que me será possível fazer amanhã!
            E a alta individualidade, quando lhe apresentaram estes comentários, retorquiu: «Já viu quantos doutoramentos há em Ciências Sociais e Humanas? Já viu que os Checos escrevem todos os artigos em inglês?». E o seu interlocutor limitou-se a dizer-lhe que, se calhar, sem Ciências Sociais e Humanas não haveria comunidade lusófona e nem atenção se daria ao Homem como Pessoa. E quanto aos Checos escreverem em inglês e nós estarmos a pugnar pela Língua Portuguesa, porque é que ele, com a autoridade de que estava revestido, não incitava os Checos a escreverem na língua deles também?

Publicado em Cyberjornal, 06-01-2014:

Moda, Arte e Cultura - numa revista de eleição

           Aí está, em papel, o nº 108 (Dezembro de 2013), da revista (agora) semestral Moda & Moda, da responsabilidade teimosa da sua directora, Marionela Gusmão.
           E importa explicar, desde já, a razão de ser do adjectivo «teimosa»: é que Marionela Gusmão tem levado por diante este projecto (hoje tem de falar-se de «projecto»!…), graças a uma insuperável tenacidade, contra ventos tempestuosos e bem adversas marés.
            Sempre a revista deu conta do que de mais relevante havia a referir no mundo da criação estilística; aliás, Marionela Gusmão tem tido ensejo de privar com os mais conceituados estilistas e de sentir, por isso, quanto a moda não é apenas uma profissão mais ou menos rendível, mas um mundo em que outros valores – como a Beleza, o Bem-Estar, a Cultura… – ocupam também lugar proeminente.
            Não é, pois, casual o facto de, a par com a apresentação de esbeltos modelos – esbeltos no vestir, esbeltos na… moldura! –, Moda & Moda venha, em cada número, prenhe de noticiário acerca de exposições, recheada de temas históricos e de reportagens sobre como é que determinado adereço se usou ao longo dos séculos. E, aqui, realce é de dar à sagacidade da investigação e à oportunidade ímpar das mais insuspeitadas ilustrações.
            Na capa do número ora em apreço sugerem-se os mais relevantes temas tratados:
            – a arte bizantina;
            – o Renascimento e o sonho: uma espreitadela a Jerónimo Bosch (Fig. 1), Veronese, El Greco e tantos outros, na mostra que ainda pode ver-se, até dia 26, no Museu do Luxemburgo, em Paris);
            – os têxteis em grande plano, a propósito da «fabulosa exposição Folie TextileMode et décoration sous le Seconde Empire, organizada no Palácio nacional de Compiègne (França);
            – a pormenorizada e bem elucidativa entrevista a Isabel Silveira Godinho, eloquente balanço do que foi, a partir de 1983, a incessante actividade da «grande Dama do Palácio da Ajuda», balanço que termina com o apelo a que se pense em trasladar para Portugal os restos mortais de D. Maria Pia, «a única rainha que continua com o lugar vago no Panteão de S. Vicente de Fora»...;
            – os instantâneos sublimes captados pelo fotografo Raymond Depardon, expostos, até 10 de Fevereiro, no Grand Palais, em Paris;
            – uma nota breve, mas do maior interesse, sobre a Biblioteca de Estudos Humanísticos, mais de 7000 volumes (entre eles uma «preciosa colecção de cerca de 30 manuscritos dos séculos XVI a XVIII – Fig. 2), um «património bibliográfico e cultural» que o Banco Espírito Santo adquiriu, em 2008, à família do professor Pina Martins;
            – a trilogia «Arte, História e Moda», na sugestão de virem a ser, como tem de ser, «pináculos de um tempo novo»…
            Mas fala-se também de pérolas, de perfumes e… de Natal!
            Notável, como sempre, o editorial, em que Marionela Gusmão dá asas à sua enorme capacidade de comunicação e aponta, em espírito crítico, com um saber de experiências feito (passe o aparente lugar-comum), os rumos que importa seguir, esperança e fé:
            «Os sinais de esperança têm que andar por aí, qual ave por céus inacabados, à espera que o vento retorne à calmaria e o Sol o enxugue. Acredito que nas searas cada espiga de trigo vai ter mais de 20 sementes e haverá mais abundância. Já plantei as “searinhas” com que enfeitarei a cómoda onde vai ficar, até 6 de Janeiro, a imagem do Menino Jesus. […] Vou com fé, a correr até à encruzilhada da esperança. Vou mesmo!».
             Essa é a frase final; contudo, pelo meio, há todo o natural verberar contra a situação «de instabilidade vergonhosa» em que se vive. Em que um empresário não pode «fazer previsões», porque «um dia conta com um imposto e, além de ter uma rubrica para os hipotéticos incobráveis, ainda tem que acrescentar as dúvidas com que o Ministro das Finanças nos assusta»…
            Vale, por conseguinte, a pena saborear essas 162 páginas, de muito bom papel couché, profusamente ilustradas a cores, um regalo para a vista, como, por exemplo, na moda bizantina, qual forma de «bordar a História», vestidos de encantar (Fig. 3)! E a anunciada viagem pelo mundo da pérolas? Só visto!
Legendas das ilustrações
Fig. 1 – Escola de Jerónimo Bosch. A visão de Tondal. 1520-1530. Óleo sobre madeira: 54 x 72 cm. Madrid, Fundação Lázaro Galdiano. © Museo Lázaro Galdiano, Madrid.
Fig. 2 – Manuscrito encadernado com fólio de pergaminho de um antifonário, 1555. Exemplo do recurso aos manuscritos dos mosteiros para encadernar outros manuscritos e livros.
Fig. 3 – Que mais admirar? A beleza dos adereços ou a magnífica imitação de mosaicos, no mais perfeito estilo bizantino? Uma criação de Dolce & Gabanna.
Publicado em Cyberjornal, 05-01-2014:

 

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Aplausos para um lutador

             Sempre me habituei a ver no Prof. Jorge Paiva, investigador do Instituto Botânico da Universidade de Coimbra, um lutador nato.
            Ouvi-o em inúmeras conferências; eu próprio lhe solicitei que proferisse algumas para as mais diversas plateias, porque o seu entusiasmo e o seu profundo saber cativam e ajudam-nos a sermos melhores.
            E porquê?
            Porque o Prof. Jorge Paiva escolheu para seu lema uma vida sadia em íntima comunhão com a Natureza! E, em relação a esta, tem um objectivo a atingir: mostrar a toda a gente, mormente aos que estão em órgãos de decisão, que a biodiversidade é o caminho para uma vida mais saudável neste planeta, onde tantos são os atentados mortais que contra ele diariamente se cometem, com a anuência das mais altas entidades.
            E a sua missão cumpre-se, de modo especial, na quadra natalícia, mediante o envio de centenas de postais de boas-festas (bilingues) a amigos que seleccionou, entre os quais tenho a honra de figurar. Sempre com um tema diferente e sempre deveras acutilante e oportuno.
            Para este ano optou pelo tema «Biodiversidade e endemismos», para se enquadrar na «Década da Biodiversidade» proposta, nos finais de 2011, pelo Secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon. As imagens: um pássaro («Anabathmis newtonii», de seu nome científico) e uma planta, a «Impatiens buccinalis», ambos endemismos – ou seja, exclusivos – da Ilha de S. Tomé. E explica, para exemplificar o significado da biodiversidade, a interdependência de uns seres em relação aos outros (e nós, homens, somos dos mais dependentes!...):
            «A ave ‘Anabathmis newtonii’ (selelê) […] depende do néctar das flores que poliniza. Se colhesse o néctar apenas da ‘Impatiens buccinalis’ (camarões)» que é, como ela, «endémica da floresta tropical autóctone (obô) da Ilha de S. Tomé», seria enorme o seu risco de sobrevivência, porque bastava que a ‘Impatiens buccinalis’ desaparecesse para que ela viesse a desaparecer também.
            Elucidativo exemplo a reter, mormente se pensarmos que temos no nosso corpo «milhões de seres vivos microscópicos», sem os quais não conseguiríamos digerir os alimentos e defender-nos de muitas doenças…
            Afinal, «somos todos espécies endémicas de uma ilha universal, a Terra. Assim, se muitas das espécies de que nós dependemos desaparecessem, nós também nos extinguiríamos», conclui o professor.

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 630, 01-01-2014, p. 12.