Muitos de nós terão histórias para contar acerca destas presenças reais exiladas em Cascais e nos Estoris. Recordo o Rei Umberto II de Itália, que era uma simpatia e se dava com toda a gente; recordo como a população vibrou, em 1955, com a pompa do casamento, no Estoril, de sua filha, a princesa Maria Pia de Sabóia.
Não foi por causa da II Grande Guerra e das revoluções subsequentes que os Condes de Barcelona vieram para Portugal, como se sabe, mas em consequência da guerra civil espanhola. Fixaram-se numa vivenda no Alto do Estoril, a Vila Giralda, que tive o privilégio de visitar, em companhia de José Antonio Gurriarán, quando este andava a preparar o livro «Um Rei no Estoril», que viria a ser publicado, em 2001, pela Câmara de Cascais e pela D. Quixote.
Antes de contar dois casos, um que vem no livro e outro não, devo acrescentar que das minhas recordações uma das imagens mais fortes é a de toda a família dos Condes a assistir, nos primeiros anos da década de 60, a todas as cerimónias da Semana Santa, na igreja de Santo António do Estoril. Aliás, lembro-me que colegas meus que frequentaram a Escola Salesiana (então Asilo de Santo António) me dizerem que tinham jogado à bola com o Juanito, no oratório salesiano. Toni Muchaxo fala sempre do Juanito; e o Conde achava sempre muita piada quando – muitos anos mais tarde – ainda o tratavam assim, porque o nome lhe fazia recordar belos tempos.
Manteve-se em Portugal, após o regresso da realeza a Espanha, a irmã de Juan Carlos, Margarida de Espanha, Duquesa de Sória, cega de nascença, que era até há uns anos (agora não sei) presença habitual na piscina do Tamariz.
Vamos então às histórias.
Primeiro, a duma reacção à publicação do livro de Gurriarán. Um dos leitores do Jornal da Região, o médico veterinário Rui de Jesus Ribeiro achou por bem repor a verdade: é que, antes de a Família real, vinda da Suíça, se ter instalado no Alto Estoril, viveu na «Casa da Rocha», que Rui de Jesus Ribeiro – em carta à redacção do jornal, publicada a 22 de Maio de 2002 – informa ser «uma casa com fama por ter sido construída por Tertuliano Lacerda Marques para o Prof. Augusto de Vasconcelos e dada por concluída em 1924». E o que é que sucedeu? A senhora Condessa tinha um caniche castanho fulvo, o Rusti, que foi tratado durante algum tempo na clínica do Dr. Ribeiro; mais tarde, o Rusti desapareceu e foi o pranto que se imagina! Mas, recordando quão bem fora tratado, tendo sido eventualmente atropelado e com uma pata partida, o Rusti foi ter ao portão do quintal da clínica e, quando o Dr. Ribeiro, reconhecendo-o, lhe abriu o portão, ele logo correu, de pata no ar, para o local dos tratamentos!
Fica
a história do Rusti, a completar o que Gurriarán conta, nas p. 267-269, acerca da estada da família na «Casa da Rocha», junto ao mar.
O livro de José Antonio Gurriarán foi elaborado à base de muita conversa com pessoas que haviam privado com o Rei. Uma delas foi António de Sousa Lara, cuja casa de família fica perto de Vila Giralda. Contou-lhe seu avô que os meninos jogavam à bola na rua e amiúde a bola lhe ia para o jardim e lhe estragava as roseiras. Tendo-se queixado ao Conde, este autorizou-o a dar-lhes uns bons açoites se tal voltasse a acontecer. Aconteceu! E os açoites fizeram-se sentir! E o mais curioso é que, reencontrando-se num restaurante em Madrid, já o avô de Sousa Lara tinha mais de 80 anos, el-rei assim o apresentou aos amigos:
«Sabem quem está aqui? O único homem vivo que pode orgulhar-se de ter dado uns açoites ao Rei de Espanha!» (p. 59-60).
E mais se não comenta agora, está bem de ver!...
José d’Encarnação
Publicado em Duas Linhas, a 10-08-2020: https://duaslinhas.pt/2020/08/ele-deu-uns-acoites-ao-rei/
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