Dependemos
de Lisboa; ou seja, dependemos do rio Tejo. E as notícias que vieram a lume nos
princípios deste mês de Agosto acerca
do substancial aumento de poluição
das águas desse rio são de molde a trazer-nos preocupados. Bastará a água da
barragem do Castelo de Bode deixar de ter qualidade para que renasçam os
problemas de há 50 anos…
Não
estamos, felizmente, no Alentejo, onde a seca afecta gravemente a agricultura
e, sobretudo, a pecuária; nem no Centro do País onde os criminosos incêndios
fazem gastar milhões de metros cúbicos de água.
Lembro-me,
porém, de que, quando Guilherme Cardoso e eu fizemos o livro «Para uma História
da Água no Concelho de Cascais» (SMAS, 1995), transcrevemos (p. 45-46) o texto que
o Visconde de Atouguia publicara, em Julho de 1917, no jornal A Nossa Terra, onde dava miúda conta dos
sítios do concelho onde os caçadores
podiam dar água aos cães. Um relato do maior alcance histórico, uma vez que localizava
nascentes, fontes, poços…
Solos permeáveis precisam-se!
Passei
a meninice em Birre de Baixo. Aí
havia, na década 50, as ruínas dos tanques para lavar e passar roupa e, sobretudo,
o poço público, com o bebedouro para os animais, poço que o Município, sem mais
nem menos, alienou a um privado – e ‘así se hacen las cosas!’, diria o nosso cáustico
Gil Vicente. De Inverno, eu ia a uma nascente próxima, de chinguiço aos ombros,
um balde de cada lado, acarear água que por ali brotava límpida.
Razões
desta ‘conversa’?
Duas:
a primeira, para evitar que esses factos caiam no esquecimento; a segunda, para
dizer que a Ribeira dos Mochos era para nós um «rio», porque, em tempo de boa invernia,
inundava tudo quanto eram terras de cultivo e pomares desde Birre ao vale da
Barraca de Pau. E donde vinha o rio? Do Mato Romão! Isto é, daquela zona entre
Birre e Aldeia de Juso por cuja manutenção
como mato nós continuamos a pugnar, porque é a sua permeabilidade às águas que
poderá alimentar os caudais subterrâneos e evitar enxurradas que ponham em
perigo as aldeias e a própria vila.
Para
que conste.
Como,
por exemplo, agora que tanto se fala de limpeza de matas, talvez não seja despropositado
lembrar que Champalimaud, dono da Marinha, permitia às gentes das povoações
vizinhas que, uma vez por semana, lá fossem apanhar lenha, maravalha, pinhas… O
povo utilizava na cozinha, na cama dos animais, na cobertura dos pátios…
A necessária independência de Lisboa
Os
trabalhos de captação de águas para abastecimento
de Cascais «na serra da Malveira» começaram em 1887. Construiu-se, mais tarde,
a albufeira do Rio da Mula, sucessivamente aumentada, de modo que, em 2002, o
muro de sustentação passou a ter 11 metros de altura e a
capaci dade de retenção de água subiu para 400 000 metros
cúbicos !
Assim
se dava cumprimento a um voto repetidamente exarado nos relatórios dos Serviços
Municipalizados de Água e Saneamento:
«Necessário se torna prosseguir nos esforços
de aumentar as possibilidades de captação
das águas do concelho para que este não fique na inteira dependência da conduta
de Cascais que transporta a água fornecida pela Companhia das Águas de Lisboa».
Esse,
porventura, um voto difícil de cumprir hoje, em que a preocupação maior parece ser a de autorizar novas urbanizações,
permitir mais prédios em altura, proporcionar substancial aumento de
habitantes, situação passível de vir
a ser incomportável em termos logísticos, mormente se não se puser pôr cobro
urgente às «roturas escondidas»; se não pensar de novo nas captações da Serra
de Sintra e não se der a maior atenção
à albufeira do Rio da Mula.
José d’Encarnação
Albufeira do Rio da Mula, vista do paredão, longe do seu máximo de capacidade |
Paredão da barragem do Rio da Mula, na Serra de Sintra |
Grato por mais esta divulgação, sempre útil e inspiradora, caro Professor. Aproveito para referir que nas Palestras de Verão da EMACO que estão a decorrer e subordinadas ao tema da água, tenho amiúde colhido referências, de vários dos palestrantes, àquela sua obra em co-autoria e que cita - «Para uma História da Água no Concelho de Cascais». Julgo ser sempre muito confortável apurarmos que, por entre tantas «distracções» a que assistimos, obra feita não cai em saco roto... Grande abraço.
ResponderEliminarLuisa Pinheiro 26/8 às 0:43
ResponderEliminarÉ verdade: cheguei a ir buscar água à Fonte Nuno.
Luisa Pinheiro 26/8 às 0:43
ResponderEliminarÉ verdade: cheguei a ir buscar água à Fonte Nuno.
João Pinto 26/8 às 23:55
ResponderEliminarÉ bom levar em conta que grande parte da água se perde, devido às inúmeras roturas, uma vez que a maioria da canalização ainda é de lusalite, facilmente quebrada pela cedência dos solos. Ainda não foi devidamente equacionada a questão de esta tubagem ter na sua estrutura o AMIANTO, cuja presença nas chapas de cobertura tem levado à substituição das mesmas.
João Pinto 26/8 às 23:55
ResponderEliminarÉ bom levar em conta que grande parte da água se perde, devido às inúmeras roturas, uma vez que a maioria da canalização ainda é de lusalite, facilmente quebrada pela cedência dos solos. Ainda não foi devidamente equacionada a questão de esta tubagem ter na sua estrutura o AMIANTO, cuja presença nas chapas de cobertura tem levado à substituição das mesmas.
Bem hajas pelo teu comentário, Amigo Cornélio! Se ainda se pode curar o doente? Tenho as minhas dúvidas, porque há demasiados interesses em jogo. Mas que importava apostar na barragem do Rio da Mula, isso não tenho dúvida nenhuma! Abraço!
EliminarMário Cornélio 9-10
ResponderEliminarZé, creio que se deveria aproveitar todas as Bacias Hidrográficas bem como os Mananciais subterrâneos mas... isso não interessa! Aqui em Melgaço as Águas do Noroeste querem aplicar os Preços de Viana do Castelo, a tal teoria de os Preços serem iguais em todo o País, só que muita gente e Povoações inteiras recusaram tal coisa pois a Água vem de Nascentes próprias e locais. Resultado... quando se fez a rede de Saneamento Básico ficaram sem ele, mas querem que eles paguem o Serviço!!! Isto está bonito...
Tem o Povo toda a razão. E os interesses económicos da empresa deviam ter em conta as características de cada região. A uniformização não leva a sítio nenhum!
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