Que poderá incluir-se
numa crónica a que se dê o título de Alfarroba?
Sei que o nome
já foi adoptado para designação de estabelecimentos comerciais. Acerca da genuína
e antiga utilização do fruto para alimentação dos animais domésticos – o porco,
o burro, a mula, o cavalo… – nada poderá acrescentar-se, a não ser garantir que
isso foi outrora e, nos nossos dias, à alfarroba se reservam outras
especialidades mais gostosas e de maior rendimento, que as bestas se alimentam agora
com rações artificiais, genericamente alteradas. Estamos conversados.
Consegui
que, num dos recantos ajardinados do meu bairro suburbano, se preservasse a
alfarrobeira que por lá espontaneamente crescera, ao pé duns carrascos. Também
no Casal Saloio de Outeiro de Polima, o Centro de Interpretação do Espaço Rural
de Cascais, se implantou no pátio interior uma oliveira e uma alfarrobeira,
árvores simbólicas, na intenção de lembrar que, nessa região saloia, muito sangue
algarvio ainda corre. A do Casal não vi bem como é; a do meu bairro é brava,
não dá alfarroba de jeito, não floresce como deve ser para atrair abelha.
O
que, de facto, mais me encanta na alfarrobeira é precisamente esse cheirinho
acre, bem activo, das suas flores e as abelhas a não resistiram ao convite dos
suculentos estames. A do meu bairro não tem.
Comi
alfarrobas em criança, quase por brincadeira (confesso). Um sabor áspero,
farinhento… Dispomos agora de licor de alfarroba, de biscoitos de alfarroba, de
creme de alfarroba, tabletes... E pugnamos para que a ladroagem se não atreva a
varejar árvores alheias…
Diligenciei,
com êxito, para que a palavra ‘folharasca’ entrasse no Dicionário Digital das Língua
Portuguesa em permanente actualização pela Academia das Ciências de Lisboa. Foi
acolhido, como regionalismo algarvio, no sentido de «conjunto das folhas secas
da alfarrobeira caídas». Aí se justifica a inserção com a seguinte passagem d’O
Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge: «Macário caiu de joelhos às abas de uma
alfarrobeira submersa em folharasca» (1995, p. 195).
Rezam
os outros dicionários que – como se suspeitava – a palavra vem do árabe: al-carroba,
alkharrub. Por isso não estranhamos em ver escrito num rótulo CAROB – qual tentação
mediterrânica! E que tentação, senhores!
José d’Encarnação
Publicado em Notícias de S. Braz [S. Brás de Alportel], nº 331, 20-06-2024, p. 13.
Viva Prof. Um mês ausente... A falta que nos fez. Abraço
ResponderEliminarMaria Helena
Adorei ler. Saboreei, ainda Há pouco, uma fatia de uma deliciosa tarte de alfarroba que me disseram ter origem em fabrico particular de S. Brás de Alportel. Registei o termo "folharasca".
ResponderEliminarOlá, Maria Helena! Sim, estive ausente daqui, do blogue, porque houve uma pausa na publicação do jornal «Renascimento». Mas sabe que pode sempre encontrar-me em duaslinhas.pt, onde estou muito mais assíduo. Gostei de saber de si!
ResponderEliminar