Panorâmica do Parque Canino, sorry, of the Dog Park |
Logicamente,
como estamos em Cascais, não se lhe chama exactamente um «parque canino», mas, de preferência, um dog park, porque, como é bem sabido, a
maior parte da população de S. Pedro
fala inglês fluentemente no seu dia-a-dia e era chato dizer, no sábado à tarde:
«Fiel, queres ir ao Parque Canino?». O Fiel eriçava-se todo, arreganhava a
dentuça e até era capaz de ameaçar o dono com mordidela feroz. Agora, se tu lhe
falas: «Fiel, do you want to walk with me to the Dog Park?» – aí, o Fiel pula
de contente e até puxa o dono, vam’lá
depressa, já!
Nada
tenho contra o dog park e – agora que
uma das minhas filhas, ida para Inglaterra, me legou um labrador – até tenho mais
propostas para dog parks no concelho.
Se algum dos candidatos me falasse nisso, eu explicaria tudinho muito claro.
O
que não se me afigura lá muito claro é o texto que, nesse Espaço Canino,
apresenta as «regras de utilização »,
assim uma espécie de «Dez Mandamentos», que podem ser lidos na imagem que
colhi. Não quero poupar o leitor a tentar descobrir todas as patacoadas que o
texto encerra, redigido, certamente, por quem não fez a antiga Instrução Primária; vou limitar-me a algumas delas, que se
me afiguram mais ‘interessantes’.
As regras de utilização do Espaço Canino, em S. Pedro do Estoril |
Assim:
a)
Escreve-se: «A utilização do ESPAÇO CANINO será por sua conta e risco do
dono do cão». «Por sua conta»? E quem é o ESPAÇO
CANINO para ter essa respons abilidade? Evidentemente, o «sua» está a mais.
b)
«Cães com comportamentos agressivos [...] deverão-lhes ser presos à trela». Além
de que, se a frase estivesse correcta, seria «dever-lhes-ão», o certo é que seria
de ler-se algo como: «Cães com comportamentos agressivos [...] deverão ser presos
à trela», embora eu preferisse outra expressão mais consentânea com a realidade:
«deverão ser levados à trela».
c)
«As necessidades do seu cão deverão higienizadas de imediato». A frase, mesmo que
se complete com o verbo «ser», que falta, não tem sentido, porque o cão não tem
necessidades que devam ser… «higienizadas»! O cão precisa é de brincar, correr,
ter um dono compreensivo, familiarizar-se com os outros e para isso é que foi
criado o parque! Essas são as suas ‘necessidades’! Claro, aqui quer fazer-se
alusão aos dejectos caninos e esses, confesso, não precisam de ser higienizados,
mas sim apanhados de imediato pelo dono, com os saquinhos que a Cascais
Ambiente dispensa um pouco por toda a parte e que certamente não faltarão nesse
espaço.
d)
Escreve-se que é PRIOBIDO (claro, houve
dislexia do escriba: é PROIBIDO) o acesso
a alimentos humanos ou caninos e a objectos de vidro. E eu estou a ver os
alimentos e os objectos de vidro a reivindicarem: «Eu quero entrar! Eu quero
entrar!»… Não é, seguramente, a palavra «acesso» a indicada, porque acesso
implica ‘movimento’, próprio de pessoas ou de animais. «Entrada» também não,
que tem o mesmo sentido. O que se quer proibir é que os donos tragam alimentos
para eles ou para os cães e evitem introduzir no recinto objectos de vidro,
pelo perigo que eles representam.
Enfim,
a meu ver, trata-se de um decálogo cuja redacção deixa muito mal vista… a elite canina da Costa do
Estoril!
José d’Encarnação
Entretanto, informaram-me
gentilmente da Cascais Ambiente que «a placa em questão já foi
retirada e será recolocada assim que o texto for revisto», confirmando-me também a
informação supra: «A placa não é do Dog Park de São Pedro do Estoril, mas
sim do parque canino do Jardim das Oliveiras, recentemente inaugurado».
Chorei a rir com a dissecação da escrita canina... E pela foto dá para ver que se deram ao trabalho de gravar o texto numa placa de madeira!
ResponderEliminarCaro prof.
ResponderEliminarExcelente texto.
Ainda assim, permita que lhe diga que o Fiel não pularia de contente ao ouvir Fiel. Isso é Português do mais puro. Pularia de contente, isso sim, com Loyal ou Faithful seguido, então, de let´s go to the dog park for a ride, ou qualquer outro qualquer juízo equivalente no idioma de William Shakespear, isto é, de Guilherme Abanapera. Grande abraço.
Concordo com a ideia de haver rigor na escrita da nossa língua especialmente se é produzida por entidade oficial - também eu gostava de escrever melhor e por isso, com algum cuidado, uso um corrector de texto - viva o esforço de escrevermos e falarmos sempre melhor!
ResponderEliminarTens toda a razão, Zé Soares! Os donos não ousaram dar nome estrangeiro ao canídeo e optaram pelo portuguesíssimo Fiel. Já o labrador da minha filha se dá pelo nome de Spike! :) Quanto ao rigor da frase inglesa, peço desculpa por não ser versado - como, aliás, a maioria dos que ora são obrigados a escrever na língua de Shakespeare - no purismo do idioma inglês. Esse «let's go» está o máximo! Eu ainda dava alguma liberdade ao canídeo de escolher, se queria ou não ir até ao parque; o let's go é mais inglês, mandamos: «Toca a andar pró parque, Faithful, e pouca conversa, tá?!». Mais à portuguesa, claro! Posso acrescentar que fiquei encantado quando os meus netos havia pouco tempo que estavam em Londres e já diziam, no final da refeição «May I leave the table, please?». É outra educação! Para os meninos e para os canitos. Bem hajas, pois, pela lição, Zé!
ResponderEliminarCaro Professor, lê-lo é sempre um prazer! Já a proliferação de «títalos», os mais desvairados, em inglês, é de uma parolice atroz. E, claro, quanto mais «inglesam» o vocabulário, menos à vontade estão no Português. No entanto, sempre lhe digo que, não vá o Diabo tecê-las, baptizei a minha gata com o moderníssimo nome de «Ai, pede!», assim mesmo redigido... até porque ela passa a vida a pedinchar tudo e mais alguma coisa. Quem nos ouve chamá-la - dos tais cultores da parolice, claro - encantam-se com a denominação «inglesa», os pobres...
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