Não,
não quero brandir de novo o gume de minha espada contra a ignóbil obrigatoriedade
de se ter de redigir em insípido inglês, fazendo enorme ginástica a tentar
verter em língua estranha as noções que só a sua riquíssima língua portuguesa
contempla. Nessa batalha estou, mas declaro tréguas agora. Falo mesmo do busílis
que é escrever em português.
O
texto em si cada qual que se amanhe para comunicar e defender a tese longamente
amadurecida. Refiro-me é às referências bibliográficas. Que quebra-cabeças!
Quase custa mais adequar-se às restritas regras que cada publicação impõe do que redigir dez páginas! O tempo que se
perde! Leva ponto ou querem vírgula? Põe-se a editora ou não? Querem também o
ISSN e o ISBN? E as páginas vêm precedidas de p. ou de pp. ou sem nada? Espera
aí que já me esqueci como é que querem!...
Horas
infinitas passa o autor a ajustar-se às norma s
implacáveis – que, se as não segues, corres o risco de ver o texto devolvido ou
mesmo recusado e tu que gostavas tanto de o publicar!...
– Errado está, amigo! – replicar-me-á alguém. – Em Portugal, foi estabelecida
uma norma que dá pelo nome de Norma
Portuguesa de 1994 (NP 405-1); e, no caso de correspondência e documentos
electrónicos, devem seguir-se, respectivamente, a Norma Portuguesa de 2000 (NP
405-3) e a Norma Portuguesa de 2002 (NP 405-4). Só há que segui-las e pronto!
– Sim, respondo eu, norma
é, mas não temos obrigação de a
seguir, nomeadamente se pensarmos que, de tão reflectida que foi, os seus
autores nem sequer sabem a diferença entre as funções do hífen e as do
travessão! Têm, pois, autoridade para a imporem?
Um martírio, este, o das norma s
de redacção , que se tornou
necessário fundamentalmente porque alguns autores parece que foram esquecendo
aos poucos a função da citação bibliográfica. Nesse aspecto, o pessoal das
Ciências ditas «exactas» não está com meias-medidas: põe (Albuquerque 2013) e
já está! Já está? Significa que a obra desse tal Albuquerque, em 2013, é toda
sobre o tema que o autor está a tratar? Ou será apenas um dos capítulos ou,
até, duas ou três páginas? Compreende-se bem que há diferença em escrever
(Albuquerque 2013 42-45) ou, simplesmente, (Albuquerque 2013) – e há que ter consciência
disso! Compreende-se que, nesse tal domínio das Ciências ditas «exactas», amiúde
se não indique a paginação , porque
se trata de textos pequenos, quase monográficos, ainda que resultem de muitos
meses e até de anos de investigação !
Recordo sempre o que nos dizia o nosso saudoso Mestre D. Fernando de Almeida,
que trabalhara com Egas Moniz, Prémio Nobel: «O artigo que mais notoriedade me
deu tinha apenas cinco páginas!». Não fixei qual deles foi, mas, se se
consultarem as páginas 112-116 do nº 3 (2005) da revista Eburobriga, verificar-se-á que os seus textos de natureza médica
eram, em geral, bem sucintos…
Não interessa, a meu ver, a extensão, mas a profundidade, a inovação , a clareza e a lógica na exposição – isso é o que interessa e a forma como se cita
a bibliografia constitui excelente sintoma de uma mente bem formada.
E, volto, por isso, à questão inicial: para que servem as referências bibliográficas?
Para que o leitor possa, sem grande esforço, ir à fonte que o autor cita e verificar
o contexto e aceitar – ou não – a interpretação
que lhe foi dada! E para ser «sem grande esforço», o que é preciso? Acho eu que
a resposta à pergunta deve ser dada por cada autor e em cada momento:
fornecendo todos os elementos indispensáveis!
Partilho, pois, veementemente, da liberdade de expressão também neste domínio:
cada qual deve citar a bibliografia como mais lhe convém e está habituado. Carece
é de seguir sempre a mesma regra do princípio até ao fim do texto; mas obrigar
o autor a pôr ponto ou vírgula, p. ou pp. ou só os números das páginas, desde ele
use um critério uniforme e claro, acho que é uma prepotência nos tempos que
correm, em que, à distância de um simples clique, encontramos num livro a
expressão que queremos, lemos um artigo, sabemos logo qual é a editora e como o
podemos comprar, o ISBN, onde é que a revista se publica e qual a entidade…
Permitam-se-me ainda três notas:
1. Nem sempre o nosso computador percebe a diferença entre o hífen e o
travessão (é por isso que a tal NP 405-1 tem hífenes onde se postulariam
travessões…); devemos, consequentemente, estar atentos, uma vez que as suas
funções são mui diferentes.
2.
Para mim, algo que se torna importante de bem salvaguardar é a diferença entre
um artigo e um livro, quer este seja de um autor quer, tratando-se de uma obra
de conjunto, haver a referência clara aos que se encarregaram de preparar ou de
coordenar a edição , pois é pelos
seus nomes que essas obras ora se citam.
3.
Um reparo: a sequência mais comum é a dos apelidos dos autores. E, neste
âmbito, Portugal deve vincar o seu lugar: cita-se pelo último apelido! Sei que
há já quem deseje imitar os espanhóis, que citam pelo penúltimo, porque esse é que
é o nome do pai; mas, se quiser perseverar nessa pretensão de «ser castelhano»,
o estratagema é muito simples: opte pela utilização
de um hífen e, assim, em vez de GONÇALVES
(Antero da Cunha), passará a ser citado CUNHA-GONÇALVES
(Antero da). Uma opção legítima,
claro! Ainda que, no exemplo citado, esse Antero se arrisque a ver o seu nome
identificado, em França, por exemplo, como DA
CUNHA GONÇALVES (A.) – e quem é que o vai descobrir assim? Por outro
lado, A. é Antero, Antónia, Américo ou… Antonieta?
4.
Também me causa algum engulho (problema meu, eu sei!) a questão de se insistir
em abreviar et alii, expressão latina
que significa «e outros» e que deve ser utilizada sempre que haja mais do que
três autores. Para já, deverá vir em itálico; depois, porquê abreviar uma
expressão tão pequenina?
Apelo,
pois, veementemente (repito) a que se deixem da mão as regras rígidas que tanto
tempo ocupam aos investigadores e que constituem, a maior parte das vezes, bicudo
quebra-cabeças!
José d’Encarnação
Publicado
em Al-madan Online, II série. # 21
(tomo 1), Julho de 2016, p. 9-10.
Jaime Siles, 25 de Julho de 2016 11:22
ResponderEliminarPor completo de acuerdo con lo que dices.
Cinzia Vismara, 25 de Julho de 2016 11:41
ResponderEliminarTi ringrazio dell'articolo che mi leggerò con calma (è in portoghese!) e che mi interessa moltissimo. Devi sapere che ho introdotto in Antiquités Africaines delle norme un po' più moderne (Cognome e data in nota etc) con l'accordo del comitato di lettura e la segretaria di redazione si è dimessa perché non era d'accordo; anche uno degli autori che sta pubblicando nel fascicolo in corso non è d'accordo e ci aveva addirittura chiesto di lasciare il suo articolo come ce lo aveva mandato (eppure è nato nel 1934 e ha pubblicato moltissimo!!!). Poi si è convertito, dato che gli ho scritto che di solito gli articoli delle riviste sono omogenei per queste cose, ma la cosa non è ancora finita...
Die unendliche Geschichte!
Mi diceva un amico medico che anche da loro le riviste hanno convenzioni diverse, ma che c'è un sito dove metti la bibliografia dell'articolo che hai scritto e la rivista dove lo pubblicherai, e la tua bibliografia viene convertita automaticamente per adeguarla alla rivista. Pensa che nell'ultimo articolo che ho scritto e che è in stampa, hanno voluto - seguendo i Mél. della Casa de Velazquez - il nome di battesimo degli autori PER INTERO!!!
António Campar, 25 de Julho de 2016 11:50
ResponderEliminarEstou plenamente de acordo consigo sobre a quebra-cabeças que é a variedade de normas de escrita e citação que são seguidas pelas revistas (e nem sequer é necessário ir para o estrangeiro, basta cá em Portugal).
No entanto, pelo que me explicaram colegas das Clássicas, visto eu não saber latim, o uso do et al. talvez esteja dependente de se poder referir a três situações de género diferenciadas: se for "e outros" masculino será et alii, se for feminino será et aliae se for neutro será et alia. Assim a abreviatura usada serve para todos. Dir-me-á, se indicarmos por extenso ficaremos a saber se são outras ou outros autores, o que é uma informação mais completa, e aí terei de concordar consigo.
Manuel Ramírez Sánchez, 25 de Julho de 2016 12:54
ResponderEliminarTe felicito por tus atinadas palabras, como siempre. Tu ya estás aposentado y puedes ver los toros desde el tendido de sombra, pero los que estamos todavía sujetos a la tiranía de la evaluación permanente (por aquello de seguir progresando en el cursus honorum), no nos queda más remedio que seguir adaptando nuestro modus publicandi.
Una de las últimas novedades que está cobrando mucho peso últimamente, al menos en España, es contar con un perfil en ORCID: http://orcid.org
¡Y por supuesto, escrito en inglés!
Claudia Beltrão, 25 de Julho de 2016 13:56
ResponderEliminarUma ótima e bem-humorada reflexão, como de hábito, com a simplicidade de quem é muito experiente.
Juan Zozaya, 25 de Julho de 2016 14:58
ResponderEliminarSiempre estamos a cuesta con la dichosa metodología, que en la Europa Latina, no sé por qué razón, es tan difícil de entender. ME imagino el caos de las metodologías de trabajo de los universitarios trasladada al mundo de lo pilotos de línea aérea. Tendríamos más accidentes que en África, el continente más inseguro para volar En Latinoamérica antes había indisciplina con la metodología de trabajo, y había gran cantidad de muertes por accidente. Cuando las metodologías se aplicaban estrictamente las cosas funcionaban.
En el mundo anglo sajón cuando alguien rompe la disciplina de trabajo se crea el caos. Te adjunto las normas del Boletín de Arqueología Medieval. Se confecciona de manera artesanal y, prácticamente, personal. Por ello se trata de que la gente pre-prepare la publicación con cuidado a cosas elementales: caja de la publicación, visualizad de las fotos, definición de imágenes. La gente usa fotografía informatizada, pero no sabe que puede cambiar los valores de la foto para que se vea, no tiene ni idea de normas de publicación de planos del siglo XIX que están aún vigentes (El norte debe ir para la parte superior de la imagen o a la derecha), &c.
Cuando estudiaba, sólo había un sistema de citas: el del Cuerpo de Archiveros y Bibliotecarios del Estado, que era común a toda Europa. Después introduje el sistema Harvard, y algunos "modernos" creyeron que lo entendieron. Pero nadie sabe los sistemas de patronímicos que debe citar, y alguno, en vez de Gomes es Varela. Ahora hay un sistema nuevo, mala mezcla de los dos anteriores, el Chicago, de uso en los sistemas de revistas de impacto, en donde nadie sabe cómo usarlo, y que, por lo malo y confuso, debiera estar prohibido.... Así que eso genera la proliferación de sistemas. Ahora el caos está legitimado. En fin, diversión tenemos, querido amigo. Un abrazo, Juan Zozaya
Fábio Liborio, 25 de Julho de 2016 18:50
ResponderEliminarBem verdade o que pensas, Dr. Encarnação.
Norma Musco, 25 de Julho de 2016 22:24
ResponderEliminarPois não é que o amigo tem toda a razão?!... Cada revista ou livro tem uma norma. É um inferno!!!
Acho que, como Norma que sou, determinarei uma norma!!!!
Leonor Zozaya Montes, 25 de Julho de 2016 23:06
ResponderEliminarBravo, cuánta razón!
E agora, em alguns artigos, que pedem o DOI de cada artigo que citas... para tornarse maluca!
Alicia Canto, 26 de Julho de 2016 06:37
ResponderEliminarMe gustó lo que dices en él. Tantas normas editoriales hacen perder mucho tiempo, cuando lo más importante es el contenido...
Xaverio Ballester, 26 de Julho de 2016 10:38
ResponderEliminarParabens por tu articulo tan inteligente y sensato como divertido "o quebra-cabeças...". Por eso precisamente en "liburna" no tenemos reglas de edicion para autores.
Nicolò Brancato, 26 de Julho de 2016 11:33
ResponderEliminarCondivido totalmente le tue perplessità sui vari metodi di citazione bibliografica, spesso contraddittori e comunque non agevoli.
Perché non ritornare alla vecchia tradizione, ai suoi tempi unica per tutti (Iniziale del nome + cognome in maiuscoletto, titolo dell'opera o dell'articolo in corsivo, luogo e data edizione per i libri ed eventuali pagine, nome della rivista tra virgolette seguita da numero (in numeri romani, anno e pagine)?