terça-feira, 20 de setembro de 2011

José Inês Louro (1905-1969)

Certamente a poucos este nome dirá alguma coisa: «Há figuras de indiscutível mérito que, vá lá saber-se porquê, são postergadas, proscritas, votadas ao ostracismo em vida e liminarmente esquecidas após a morte», escreve José Manuel Azevedo e Silva, nas ‘notas preambulares’ à biografia de José Inês Louro a que decidiu lançar mãos. Acrescenta, porém, que coube a Filipe Mendes a missão de «resgatar a memória desse grande gramático, dicionarista, cultor das línguas clássicas (grego e latim) e da língua portuguesa». Por isso, essa biografia, em boa hora editada pela Câmara Municipal de Gouveia, em 2010 [ISBN: 978-989-96785-0-7], detém como subtítulo «A vida, a obra e a memória do médico-filólogo».
138 páginas, a que sugestivamente se seguem três em branco para «Notas do leitor», distribuídas precisamente por esses três tópicos: a vida; a obra, como dicionarista, gramático, filólogo, «historiador da palavra e operário da língua portuguesa» (classificações bem sintomáticas e a despertarem, desde logo, enorme curiosidade) e polemista; e a memória após o falecimento, nas comemorações do 1º centenário do seu nascimento [2005] e depois, a que se acrescentam seis testemunhos de personalidades que com o biografado ou a sua obra tiveram mais chegado contacto. Por fim, a sua bibliografia: 5 livros, 72 artigos e 6 recensões.
Teve vida buliçosa o biografado, natural de Arcozelo da Serra, concelho de Gouveia. E esses altos e baixos historia com minúcia o Doutor Azevedo e Silva, baseando-se em testemunhos orais, em notícias colhidas na imprensa local e regional –uma narrativa que se lê com imenso agrado.
De notar, porém, um pormenor, que detém, nos nossos dias, uma importância capital e que urge salientar, para que outros casos idênticos não aconteçam. Pormenor que – diga-se – está na base de eu ter tido acesso agora a esta obra, na sequência do comentário do autor à nota que eu fizera a propósito da necessidade de se preservar a memória (vide http://notascomentarios.blogspot.com/2011/09/o-escravo-que-era-diligente.html):
«Durante o processo de elaboração do livro, a certa altura pretendi consultar o acervo da sua biblioteca particular e eventuais documentos e papéis pessoais. Fui informado que, no acto das obras de restauração da sua casa do Arcozelo para ser (como foi) transformada em unidade de turismo rural, a sua biblioteca foi junta com o entulho. Uma senhora da aldeia conseguiu salvar 8 livros e o seu precioso caderno de apontamentos de estudante do ensino liceal nocturno.»
E assim se logrou salvaguardar boa parte da vida de um filólogo que prestou relevantes serviços à Cultura Portuguesa, nomeadamente no domínio da língua (foi, por exemplo, um dos dedicados colaboradores do Dicionário da Academia).
Bem andou, por conseguinte, a Câmara Municipal de Gouveia em ter patrocinado a edição, em que, mais uma vez, se documenta como a história geral de um País não pode prescindir dos retalhos da história local e dos seus artífices.

2 comentários:

  1. A senhora da aldeia que salvou o caderno de apontamentos do Dr. Inês Louro fui eu, que depois fui entregar ao professor Filipe Mendes, pois achei que eram preciosos para estarem naquele entulho aquando das obras de restauração da casa que foi deste ilustre senhor.

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    1. E fez a menina muito bem! Dessa forma se salvaguardam memórias que, doutra forma, ficariam irremediavelmente perdidas. Bem haja, pois, pelo seu pronto discernimento!

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