Será
que espera alguém: pastor , poeta,
monge?...
Estou
a chegar a Pinhal Novo. Arenoso é o solo, pelo que consigo ver da janela do
comboio; a vegetação , rasteira: carrascos,
troviscos, zimbros sonham – ou temem? – azinheiras, sobros ou mesmo singelo
pinhal?… Que, se essas árvores vierem – ou, ainda pior, os eucaliptos! –, deixarão
de ser acarinhadas por felosas, piscos, fuinhos, toutinegras, melros…
Será difícil
voltarem a ver ninhos, no chilrear nervoso das crias sempre à espera do cibato
guloso. Fugirão dali as lagartixas, as cobras e os lagartos…
Uma ameaça a cadeira?
Sim, claro, se for antecipação
doutros entulhos. Mas se, ao invés, ali deixada em final de tarde sereno, for
convite à meditação fecunda, à
comunhão fraterna em franciscano jeito… abençoada será, mesmo sendo de plástico,
mesmo estando solitária naquela matizada vastidão de verdes!... Acolherá
pensador, poeta, um eremita quiçá, com sede de reflexão!...
Não se poderá,
todavia, ficar indiferente à imagem de uma cadeira assim, pespegada em solidão.
Ali, pese embora o que atrás se imaginou, o que resulta evidente é o desaforo
do abandono, quando os municípios se esforçaram por criar competente e eficaz serviço
de recolha de «monstros». Atirar uma cadeira para o meio do mato!... Depressa
outros «monstros» lhe virão, decerto, fazer companhia E mais outros. E o mato, sufocado, não
tardará a morrer; os verdes lagartos fugirão de vez e os pássaros terão de procurar
novo abrigo para nidificar em segurança.
Fez-me pena.
Como, de resto,
me cortou a alma ver pela linha adiante os edifícios de estações e apeadeiros votados
ao mais completo abandono. E o comboio que é – continua a ser! – meio de transporte
rápido, eficaz, seguro e… barato!
Duas faces de
uma mesma e errada estratégia económica: a cadeira e as estações perdidas!...
Publicado em Renascimento
(Mangualde), nº 628, 15-12-2013,
p. 19.
É mesmo assim, Amigo ! Temos um Portugal cheio de discrepâncias ! A natureza há-de um dia pedir contas aos homens,por tanta burrice !...Um Portugal que governado por gente inteligente,sensível e previdente,poderia ser um oásis - paisagem gentes,história..enfim ! um beijo clara p.
ResponderEliminarJoaquim Isqueiro escreveu: "Belo texto, amigo, isso é que é escrever. Lê-se como se, em viagem, olhássemos pela janela do comboio. Podia ser alegre, divertido, prazenteiro; mas é triste. No entanto, tem o romantismo duma tranquila viagem de comboio e encontrei nele algo de premonitório. Não será aquela a "Cadeira do Poder", que foi arrojada por força da natureza ofendida, para o campo que o dito desprezou??? É que a imagem da "cadeira" que se solta e foge ao "Poder", faz lembrar uma outra, de onde o "Poder" caiu...Um grande abraço e obrigado por tão belo texto, ilustre amigo J. d'E...!"
ResponderEliminarEu é que devo agradecer o teu comentário, meu caro Joaquim! E fico lisonjeado com a apreciação!
Leonor Casaleiro:
ResponderEliminarBelíssimo texto que, com palavras tão simples, revela a solidão de tanta gente, sem esperança de uma Esperança.
- Bem haja, Leonor!
Joaquim Isqueiro:
ResponderEliminarGrande e bela produção de palavras com sentido, amigo José d' Encarnação...! Que nunca te doa a caneta... ou teclado...! Grande abraço e BOAS FESTAS...!!!
Bem hajas, amigo Isqueiro! Votos retribuídos, com Amizade!
Aurora Martins Madaleno escreveu: "Obrigada, Senhor Professor. Nunca é demais falar daquilo que seria melhor para o interior do País. A linha da Beira Baixa também deve ser melhorada e ir até à Guarda, como era antigamente. O Sabugal merece mais atenção, pois vemos a estação do Barracão com saudade."
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