quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Malandrices infantis

            Em relação às crianças, requinta-se o algarvio neste seu jeito de brincar, de usar amiúde uma terminologia brejeira que ninguém leva a mal, porque visa educar sorrindo, sem maldade mas com inocente malícia.
            Não é bem esse o caso da palavra ‘estrebuchar’. Se, para um adulto, assume dominantemente um sentido de trejeito doloroso, quer aplicado às pessoas quer ao animal em sofrimento, no mundo infantil «que é que estás praí a estrebuchar?» constitui, de um modo geral, pergunta irónica, a trazer implícita a ideia de que a criança está a dar voltas e mais voltas a um brinquedo ou um objecto, vira-o e revira-o e não encontra saída airosa para o concertar ou… desconcertar.
            Sugere-se nalguns dicionários que a palavra veio do francês «trébucher», que significa ‘vacilar’, ‘hesitar’. É possível, mormente se o enquadrarmos não nesse aspecto de «mexer violentamente pernas e braços», mas de preferência nesse estrebuchar da criança em… não saber como há-de resolver uma situação concreta. E, à primeira vista, ligá-la também ao termo ‘bucho’ até nem parecerá despropositado de todo, se pensarmos que, muitas vezes, nos sentimos incomodados quando, por exemplo, a comida nos dá a volta ao estômago e não sabemos bem o que se lhe há-de fazer. Estrebuchamos!...
            Mas… voltando à malícia inocente: quem não se lembra de, em pequenino, alguém se voltar para nós e dizer, num sorriso malandro: «Com que então a vender vinagre, hein!»? Esquecêramo-nos, simplesmente, de apertar alguns botões em sítio onde esse esquecimento poderia vir a ser… fatal!

Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel] nº 181, Fevereiro de 2014, p. 10.

 

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