Rejubilei.
Não
apenas porque perfilho a sua opinião, mas também porque esse fora o mote
principal da cerimónia a que, no dia anterior, eu assistira no Casino Estoril.
A cerimónia em que se entregaram os prémios literários de 2018: a Carlos Vale
Ferraz, autor de «A Última Viúva de África» (Prémio Fernando Namora); a Judite
Canha Fernandes, que escreveu «Um passo para Sul» (Prémio Revelação Agustina Bessa-Luís); a Maria do Céu Guerra,
Prémio Vasco Graça Moura – Cidadania Cultural.
Longo
e denso foi, por exemplo, o discurso de Carlos Ferraz. Dizia-me ele no fim,
quando o cumprimentei, que se lembrara das palavras daquele galardoado: «Eu sei
que tenho apenas 30 segundos para falar. Mas já que estou aqui pela primeira
vez e é bem possível que seja a última, acontece que tenho algumas ideias para expor e não vou gastar apenas os 30
segundos!». Ele também não gastou só esses e foi longamente aplaudido, pela
estrénua defesa que fez dos agentes culturais, tão vilipendiados pelas
super-estruturas nacionais. Respigo algumas das suas palavras:
–
Repudio os «anátemas populistas contra os intelectuais»;
–
«Para mim, o romance é uma história; quero deixar a minha visão do mundo no
tempo em que me foi dado viver»;
–
Eu «escrevo como sinto, enfrentando o mundo», porque cabe aos artistas
confrontar os seus concidadãos contra as realidades cruéis, cumpre-lhes «lutar
contra a anestesia do provincianismo», «desmascarar os falsos profetas».
–
«Que o belo não nos iluda e não nos prive da realidade!».
Para
Judite Fernandes, importa não perder a relação
com a História e é através da literatura que repetidamente se visita a vida.
Age-se, sublinhou, como se «a palavra de ordem fosse competir»…
No
mesmo sentido se pronunciou Maria do Céu Guerra: importa chamar a atenção para a realidade que se vive e para a
necessidade de o Teatro – como se disse da Literatura – ser dela um eco permanente.
«A
Barraca», a companhia que criou e a que com sacrifício continua a dar vida, muitas
vezes «ao arrepio das entidades do Estado», é, em seu entender, um
Teatro-Cidadão. Um teatro que se bate pela liberdade – sempre! Que se bate por
abrir perspectivas, mormente para os jovens. Que faz escola. Que assume a
responsabilidade de defender a nossa língua, capaz de espalhar mensagens de
luz. Teatro «para ser visto por muitas pessoas». Um teatro que tem casa e que luta
para a manter, contra o constante sobressalto do desemprego. Um teatro-cidadão
que trabalha horas sem fim. Que chama a atenção
para o facto de ser o Homem «o único animal que dá cabo do local onde foi
posto». Que adopta a «rejeição activa
da indiferença!».
Em
dois dias e em lugares diferentes, de norte a sul, o mesmo veredicto: clamar! E, ao verificar assim de supetão
tamanha unanimidade, não pude eu próprio deixar de me fazer eco, ainda que em
palavras pobres, o que outrem soube tão bem proclamar. Felizes de nós por
termos quem assim nos abana, como quem diz: «Acorda, acorda!»…
José d’Encarnação
Publicado em Costa do Sol Jornal (Cascais), nº 307, 2019-11-27, p. 6.
Judite Fernandes e Guilherme d'Oliveira Martins |
Maria do Céu Guerra e Mário Assis Ferreira |
A foto da praxe com os premiados |
À conversa com Carlos Ferraz |
Se todos os premiados estavam de acordo, é porque, de facto, é preciso enfrentar a situação dessas formas de Cultura pausadamente: a História, a Literatura, o Teatro, interrogam a vida, estão em constante diálogo com ela, e é através dessa interacção que ajudam a resolver os problemas reais. Mas precisam de espaço e de meios para o fazer. Muito obrigada por mais este belo texto, ou forma de te fazeres eco das opiniões desses personalidades.
ResponderEliminarUm bom resumo do que muitos de nós pensamos e talvez se possa dizer que não vamos desistir de ao nível de cada um sermos mediadores culturais amadores ou profissionais e também creio ser adquirido que os poderes (?) evoluem no bom sentido... mas lentamente! Se não recuarem já é bom!
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