quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Um espectáculo, as campanhas eleitorais!

             «Espectáculo» no sentido etimológico do termo, da palavra latina «spectaculum», derivada, por sua vez, do verbo «spectare», ‘contemplar’, ‘observar atentamente’. Tudo saído, concretamente, do horizonte das artes da representação.
 
             Espectáculo-festa, espectáculo-animação. Espectáculo-fantasia.
         Nunca me canso de folhear o livro «Psicologia das Multidões», de Gustave le Bom. A escalpelização arguta, já em 1895, dos truques de que – qual prestidigitador – o candidato se deve servir para iludir os eleitores. Promete-lhes a Lua! Não vais poder dá-la? Não há problema – quando se souberem os resultados da eleição, já tal promessa se desvaneceu!...
            Esta crónica, gizada em plena campanha para as autárquicas, sai quando os resultados são conhecidos e todos os partidos proclamaram, à uma, as suas vitórias (grandes ou pequenas) e os seus arautos recuperam das longas jornadas país afora. Não há nisso mal algum.
Ainda que, normalmente, os dirigentes partidários hajam aprendido as frases-chave a aplicar em todo o sítio, certo é que, assim, algo fica e se regista a possibilidade de – mesmo que superficialmente – se conheçam umas nesgas do interior do País. Sim, já lá vai o tempo em que aquele Senhor (com letra grande) se informava miudamente, antes de ir a uma terra, quem eram os vizinhos influentes e quais as necessidades reais da localidade. As necessidades reais. Outros tempos!...
            Há, porém, de vez em quando, aspectos que me agradam, pelo seu carácter inesperado. Para já, os letreiros dos cartazes. Epigrafista que se preza, tem de lhes dar atenção! Assim, aplaudi o apelo ao voto dos viseenses, postado em lisboeta lugar de destaque. Um achado! E toda a gente falou – era o pretendido.
            Em Altura, aquela magnífica praia algarvia onde passei uns dias (água morninha, a tentação das conquilhas e a descoberta de camaleões na duna…), o cartaz rezava que eram aqueles os candidatos à altura. Bom trocadilho!
            Também apreciei a polémica da maternidade em Coimbra. Mais uma maternidade – precisa-se! Aí pensei que não nasci numa maternidade, nasci em casa; meu irmão também. Meus filhos, sim, mas os meus netos não, já nasceram em hospitais.
Cascais teve maternidade a  partir de 1938, no Monte Estoril, em casa de Maria Amélia Azancot; veio depois a da Misericórdia e regressou ao Monte Estoril, à Villa Emma, até 1973. Tempo houve em que a quase totalidade dos cascalenses nasceu na Alfredo da Costa, em Lisboa.
Para mim, a questão fundamental não é ter maternidades. É ter bebés a nascer! Construir um edifício e até mantê-lo pode não ser complicado. Complicado é dar ao Povo condições para procriar em liberdade. E isso os candidatos não prometem!

                                                           José d’Encarnação

Publicado em Costa do Sol Jornal (Cascais), nº 337, 2021-09-29, p. 6.

 

 

1 comentário:

  1. De facto, os candidatos prometem muito e cumprem pouco, ou quase nada. Também gosto especialmente desse livro de Gustave Le Bon. A união faz a força, ideia quase sempre usada no bom sentido, pode funcionar para o lado errado do apoio que um candidato, por exemplo, sente pelo facto de pertencer a um grupo, partido. Aqui a questão é saber se os objectivos do grupo são honestos, bem intencionados, ou apenas ânsia de poder a qualquer preço. Que bom que nos faz pensar com os seus textos, Sr. Prof. Doutor José d´Encarnação!

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