O
principal contributo da obra reside no facto de nela se terem procurado
registar exaustivamente todos os ‘monumentos’ (usando a palavra no seu sentido
mais lato) que existem, ou existiram até há pouco, no território da freguesia:
casas com memória, chafarizes, fortalezas, grutas, monumentos, museus, placas-testemunhos,
templos e… «o que já não existe».
Um trabalho meticuloso
Trata-se de um
trabalho sério, meticuloso, corajosamente levado a cabo por quem, ainda que sem
formação histórica específica, tudo
procura registar, aduzindo documentação
adequada, amiúde esquecida.
Claro que, por isso mesmo, se torna alicia nte, transformando-se como que num guia para
quem deseje passear-se pelo termo da freguesia cascalense e será tentado depois
a querer saber mais, recorrendo, então, a outros livros, com outro tipo de documentação . Alguns são indicados na mui reduzida bibliografia
final, que uma visita à bibliotec a
municipal ou mesmo às edições camarárias (patrocinadas algumas, inclusive, pela
própria Junta de Freguesia) logrará facilmente complementar.
Admira-me, por exemplo, que – certamente por modéstia
– os autores não tenham querido citar os livros que já fizeram e que viriam a
propósito; ou que hajam omitido não apenas livros que tratam especificamente
dos monumentos ou até das placas que referem, designadamente uma obra que se me
afigura de grande interesse neste domínio: «Povoamento
e Arquitec tura Popular na Freguesia
de Cascais», edição da Junta de
Freguesia de Cascais, em 2004, de João Cabral e Guilherme Cardoso; ou, ainda, o
magnífico cat álogo da exposição «Patrimónios de Cascais» editado pela Câmara (2003), devido também a João Cabral e à sua
equipa do Gabinete de Arqueologia camarário.
Placas com letras e esculturas
Tudo é,
porém, passado a pente e, como epigrafista, não posso deixar de me congratular
com a importância dada às placas comemorativas, designadamente aquelas que,
numa louvável iniciativa da Câmara, foram sendo afixadas em casas onde viveram
pessoas ilustres do nosso País. E também as placas evocat ivas
de acontec imentos marc antes para a história local. Não lhes escapou,
por exemplo, a placa que marc ou a
inauguração do Bairro Operário, a 12
de Março de 1933 (por lapso, vem indicado o mês de Maio, na p. 205); nem, no que se refere ao abastec imento
de água na freguesia, o que foi durante muito tempo designado «o depósito de
água», no Alto da Pampilheira, cuja placa de mármore (p. 158) dá conta de que a
deliberação de o construir foi
tomada na sessão camarária de 6 de Julho de 1898, sendo presidente da Câmara
Jaime Artur da Costa Pinto.
Um dos
aspectos com que também mais me regozijo é o rol das esculturas plantadas em
meio das nossas rotundas, incluído no capítulo «Monumentos». Há anos que pugno
para que se faça tal roteiro. Agora se fez, ainda que de boa parte se desconheça
o significado ou o nome; mas sempre ficamos com uma ideia de quando foi
colocada e quem é o seu autor. Parabéns!
Algumas achegas
E se, como
epigrafista, fico consolado, como arqueólogo gostaria que – além da gruta do
Poço Velho e da placa que assinala, no chão, o troço de muro de contenção da Ribeira das Vinhas identificado aquando, em
2008, ali se fizeram escavações para implantação
dos contentores subterrâneos – também houvesse sido incluída entre o património
histórico da freguesia a «villa» romana dos Casais Velhos, classificada como
imóvel de interesse público pelo decreto-lei nº 29/84, de 25 de Junho. Creio
que também poderá ter escapado uma notável epígrafe sita nas traseiras da cerca da Casa das Histórias Paula Rego, inicialmente
incorporada num chafariz hoje desaparecido, não mencionado. Reza o seguinte:
«Sendo rei dos três Reinos Unidos de Portugal, Brasil
e Algarves, o muito alto, poderoso e fidelíssimo Senhor D. João VI, se fez esta
parada, em que trabalharam os soldados do Regimento nº 19, sendo coronel
Francisco José da Costa do Amaral, o qual mandou colocar este padrão no ano de
1818».
Tivemos ocasião de a recentemente
analisar («Cascais – Paisagem com Pessoas dentro», Cascais, 2011, p. 50-52), chamando a atenção
para o elevado interesse do seu conteúdo e da sua consequente preservação .
Outro aspecto com que vivamente me
regozijo é o de se haver retomado o que se fizera em 1995, no livro, que assinei com Guilherme Cardoso, «Para uma
História da Água no Concelho de Cascais»: a importância dada aos chafarizes.
Por sinal, não se indicou que ao chafariz estão habitualmente ligados os
tanques de lavar roupa, como acontec e
na Charneca, na Areia e, ainda, no Cobre. São, de facto, ‘monumentos’; aliás,
amiúde, o único monumento existente no lugar. Recordo, por exemplo, a pompa e circunstância
de que se revestiu, em meados da década de 50, a inauguração , com a presença do Sr. Governador Civil, do
modesto chafariz da então chamada Barraca de Pau, que vinha satisfazer as
necessidades de abastec imento do
«Bairro da Felecidade», assim designado em homenagem à mulher do seu
construtor, Zé Martins, aglomerado populacional então relativamente importante,
dada a grande comunidade de algarvios aí residentes, vindos para o trabalho nas
pedreiras.
Enfim,
mais um relevante testemunho dá este livro de Manuel Eugénio e Ricardo Fialho
para a história da freguesia de Cascais. Retrato minucioso e cuidado do que
hoje por aí se vê – num convite, afinal, à descoberta de um rincão onde é bem agradável
viver, porque… respira história por todos os poros!
Publicado
em Jornal
de Cascais, nº 329, 16.01.2013, p. 6.
Rui Costa Pinto, em e-mail datado de hoje, 22, teve a gentileza de me enviar o comentário q a seguir se transcreve e que visa esclarecer uma passagem do livro em análise. Considero que as redes sociais constituem, cada vez mais, espaços de esclarecimentos e troca de impressões; por isso me congratulo e agradeço.
ResponderEliminarAqui vai:
«Na página 104 é referido a dada altura que Gago Coutinho e Sacadura Cabral tripulavam “um bimotor, o Lusitânia” o que sextante foi ”inventado pelo piloto Gago Coutinho”
1 - O Lusitânia era um monomotor e não um bimotor;
2 - O sextante não foi inventado mas sim adaptado e o Gago Coutinho era o navegador e não o piloto.
Abraço
Rui Pinto».