Ouvi-o
atentamente. Apercebi-me do balbucio hesitante dos meninos, de uma que outra frase
feita apreendida nas sessões da cat equese
e dei comigo a pensar:
‒ É deveras sugestiva essa parábola dos evangelhos,
plasmada, inclusive, na designação
de «pastor » que o ministro do culto
tem em parte das confissões cristãs. Mas quem é que a compreende realmente
agora, vivendo (como essas crianças vivem) num ambiente urbano, sem rebanhos
nem ovelhas nem pastor es de verdade?
Um mundo que desapareceu, de facto, do nosso quotidiano habitual e que, por
isso, procura ser revivido, por exemplo, nas chamadas «quintas pedagógicas» e
até nos jardins zoológicos onde também estão a entrar os animais que eram outrora
do nosso dia-a-dia e que, hoje, deixaram definitivamente de o ser.
Recordo
como meus neto s se admiram quando o
vizinho – que tem curral junto à ribeira próxima – adrega trazer as cabrinhas
para pastarem naquele lote do bairro ainda sem construção .
Recordo a admiração dos meus
estudantes quando, pela villa romana
de Freiria, no interior do concelho
de Cascais, passava o último e resistente rebanho das redondezas e se deliciavam
a ver os cordeirinhos.
E quando ouvi cantar o salmo 22 – «O Senhor é o meu pastor , nada me falta. Em verdes prados me faz
recostar. Conduz-me junto das águas refrescantes para repousar» – recordei,
claro, essa frase pintada nos pára-choques dos camiões das grandes rodovias
brasileiras, mas não pude deixar de me perguntar:
– É a parábola do Evangelho que deve ser actualizada ou,
ao invés, será preferível que regressemos já a essoutro modo de vida, muito
mais sereno e saudável, mesmo que, a determinado momento, posso tocar o
telemóvel e as ovelhas olhem, admiradas, para o pastor
e ele lhes diga, todo contente e de olhos a sorrir: «É pra mim!...».
José d’Encarnação
Publicado em Renascimento (Mangualde). nº 662, 15-05-2015, p.
12.
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