sexta-feira, 1 de março de 2013

Os tiros nos pés

             Era uma desonra! Caçador que levasse arma carregada e, distraído, puxasse o gatilho e desse um tiro nos pés! Pior do que sair-lhe o tiro pela culatra! Ficava irradiado do grupo de amigos e só depois de bem consistentes desculpas é que lograria voltar a calcorrear com eles montes e vales em busca de lebre ou de perdiz.
            Pois tiros nos pés são, agora, especialidade dos que «governam» a Europa e, por arrasto, Portugal. «Vistos e ouvistos», escusam, agora, de vir com paninhos quentes: essa ideia, mesmo que seja antiguinha, lá do governo do senhor Guterres mas que nunca foi posta em uso porque se deve ter compreendido logo que era argolada das grandes, essa ideia de pôr o Povo a fiscalizar o Povo – «Pediste factura? E compraste o chupa-chupa sem factura? Não pode ser!»… – é tiro no pé!
            Claro, os técnicos vieram logo explicar:
            «Mesmo que esteja sentado num café e veja um cliente a recusar uma factura, não posso agir sem uma ordem de serviço», explicou Paulo Ralha, presidente do Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, acrescentando que estes profissionais só podem «agir numa situação de flagrante delito e nunca a posteriori».
            Então não se passa a mesma coisa com os ladrões? Só em flagrante delito! Apanhado com a boca na botija!...
            Portanto, todo esse alarido… um tiro no pé!
            O pior é que, concomitantemente, neste caso também ocorreu a outra façanha: vai o tiro sair pela culatra! Ou seja, como é bem de ver, quanto mais querem apertar a malha, pela repressão, mais o Zé-povinho descobre os buracos na rede e… lá vai ele!
            E tudo isso porquê? Por falta de motivação! Por não se ver direito que vale a pena fazer sacrifícios, nós, os pobres, que já tantos fazemos no dia-a-dia, roubados por quem não é nunca apanhado em flagrante delito!
            Mas… eu falei em «motivação»? Bolas, saiu-me! Isso é palavra da Pedagogia e da Didáctica e disso é que eles, «vistos e ouvistos», não percebem mesmo nada!
 
Publicado no quinzenário Renascimento (Mangualde), nº 611, 01-03-2013, p. 11.

Sem comentários:

Enviar um comentário