Olhámos uns para os outros,
desconfiados, e o comandante Estácio dos Reis não hesitou:
– Desculpe: porque é que precisa de
saber?
– Questões logísticas.
Compreendemos depois, perfeitamente,
ao abeirar-nos, nessa já bem longínqua manhã de 15 de Maio de 1989, na pista do
aeroporto de Miami, do pequenino avião que nos levaria a Great Ábaco, nas
Baamas: éramos os seis os únicos passageiros, mais o piloto, e cada uma das
bagagens foi estrategicamente colocada nos espaços disponíveis do aparelho,
para que o peso ficasse bem equilibrado e o voo decorresse sem problemas.
Lembrei-me de imediato dessa cena,
quando vi o vídeo a mostrar como, no passado dia 30 de Abril, um Boeing
B747-400 cargo da companhia aérea norte-americana National Airlines se
despenhara, no momento em que levantava voo da base aérea de Bagram, no
Afeganistão. O aparelho, que transportava veículos automóveis e outras cargas,
«rodou no ar e despenhou-se junto a uma estrada que circunda a base aérea» e,
embora a notícia inicial fale de «razões ainda não averiguadas», é mais do que
evidente de que se tratou de um erro crasso do pessoal de terra, que não soube
acondicionar convenientemente a carga.
É por isso que, na linguagem
popular, se fala de «albarda-se o burro à vontade do dono», quando o homem que
percebe de albardas quer fazer de uma mane ira
e o dono insista em que se faça doutra – e, nesse caso, é do dono a
responsabilidade se a albarda der de si e caírem por terra os alforges e a
pessoa que lá for escarranchada.
Vêm estas histórias a propósito do
grande receio que diariamente me invade ao assistir à crescente falta de
profissionalismo, derivada, na sua maior parte, porque os governos da Europa,
obedientes cegos ao paradigma reinante, insistem em «mandar para a reforma», a
todo o custo, o maior número de pessoas. E quem vai? Com frequência, os mais
capazes, e, dado tudo ser feito a trouxe-mouxe, de um momento para o outro (é tudo
para ontem!...), não houve tempo sequer de ‘passar o testemunho’. E, por outro
lado, há muito quem queira de imediato ‘assentar praça em general’ e nem lhe
passa pela cabeça auscultar quem detém «saber de experiência feito».
Quando o revisor passou, eu
disse-lhe:
– Deste lado da carruagem não há
corrente e aquela porta lá ao fundo não abre.
Já sabia, já anotara; deu-me quase a
entender que a situação estava assim
há já alguns dias e, como o comboio chegava e partia de imediato, não havia
equipa para resolver a anomalia.
Esta não foi uma situação de há anos atrás; passou-se no dia 19 de Abril
num alfa Faro – Porto.
Já não há equipas, já não há quem
pense, já não há quem pese as questões. Visão pessimista? Quiçá. E aceito que
me provem o contrário. Perguntarei:
– Pensaram os técnicos que
elaboraram o caderno de encargos das obras que estão a fazer-se na estrada
Cobre – Murches, nas estradas que servem Bicesse ou na entrada sul de
Alcabideche, no prazo máximo a que deveriam obrigar os empreiteiros a executar
os trabalhos? Pensaram os senhores vereadores (se é que o assunto foi a sessão
de Câmara, explicado) no enorme transtorno (de tempo e de dinheiro) que dá aos
munícipes que os elegeram (e a eles próprios…) terem de andar às voltinhas,
semanas a fio, e a verem que, nessas obras, há pouca gente a trabalhar e com
tranquilidade plena? Pensou-se, ao elaborar o caderno de encargos, nas
alternativas menos penosas? Estipulou-se, por exemplo, uma multa para o
empreiteiro que deixasse eternizar a placa «desvio» quando já não é preciso
fazer desvio nenhum? Fiscaliza-se devidamente o modo como a empreitada está a
ser executada? Quem há aí que assuma os gastos adicionais de combustível – que
não são de pouca monta… – que os moradores de Bicesse, por exemplo, têm suportado
nos últimos meses? Eu escrevi «meses», sim, porque, infelizmente, é de meses
que se trata.
Prepara-se a campanha eleitoral.
Este era um dos assuntos que eu gostaria de ver bem escalpelizado, porque o
sentimos na pele todos os dias. Todos os dias. E nem sequer já há aquela placa
simpática que de pouco servia, é certo, mas nos dava a sensação de que se pensava em nós, nas pessoas:
«Desculpe o incómodo. Procuraremos
ser breves!».
Não são.
Publicado em Jornal de Cascais, nº 338, 22.05.2013, p. 6.
Alice Alves: Daqui a pouco vou à vila de autocarro e vou mais uma vez em Alcabideche fazer o "roteiro turístico"... Bem haja por chamar a atenção para as obras sempre muito demoradas......
ResponderEliminar23/5 às 15:39
Maria Mattyes: A DANÇA CONTINUA !!!!!!!!!!!! É um VÍCIO QUE SE INSTALOU NA NOSSA SOCIEDADE E NOS MANDANTES QUE "MANDAMOS" QUE NOS MANDEM. Por essas, e por muitas outras, é que já ninguém me convence em termos políticos -IMPREPARAÇÃO PARA OS CARGOS, FALTA DE INTELIGÊNCIA, só esperteza suficiente que leva esta gente a descobrir a maneira de arrecadar dinheiro que deveria ser MUITO BEM GERIDO. TOU FARTA!!!!!!!!!!!!!!!!!!
ResponderEliminar23/5 às 18:56
ResponderEliminarVítor Encarnação: Infelizmente é assim neste país!
Sexta-feira às 18:40
Herculano Minga: É Portugal no seu melhor. O Chico esperto continua a fazer das suas por este Portugal à beira-mar plantado.
ResponderEliminarSábado às 17:33